Economia

Fazer planejamento é essencial para se organizar financeiramente em 2018

Especialistas alertam para o perigo das armadilhas e dos ciclo de dívidas que o mercado oferece. Organização e controle são as palavras de ordem para quem quer tirar, de vez, a corda do pescoço

Anna Russi*
postado em 01/01/2018 07:00
Planejamento financeiro Cartão ou dinheiro, débito ou crédito, parcelado ou à vista, pagamento online, cheque, transferência ou boleto. Hoje em dia, a variedade de opções para pagar uma compra é tanta que pode levar o consumidor a cair em armadilhas e entrar em um ciclo de dívidas. Pesquisa realizada pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) mostra que quase 60 milhões de brasileiros estão com contas em atraso ou com o CPF restrito, o que impede empréstimos ou compras parceladas.

Para Alexandre Fragoso, educador financeiro do Instituto Eu Defino, não basta quitar as dívidas para escapar desse círculo vicioso. É preciso mudar o comportamento. ;Sem fazer isso, a pessoa sai de uma dívida, mas, em seguida, já assume outra. É necessário priorizar os gastos;, diz.

Para o especialista, o autoconhecimento é o primeiro passo para ter uma vida financeira equilibrada. ;Se não me conheço financeiramente, não consigo adotar uma estratégia para me organizar. Um modo simples de fazer isso, é anotar todos os gastos do mês e agregá-los em grupos ou categorias para ter noção de qual parte da rotina diária está custando mais ; e se o valor empregado é realmente necessário;, sugere.

Definir objetivos é o segundo passo indicado por Fragoso. ;É o mais difícil, mas é importante saber o que você quer alcançar por meio do dinheiro. Isso o ajudará a evitar gastos desnecessários e a traçar o melhor caminho para sua vida financeira;, pontuou. O terceiro passo é elaborar um orçamento que equilibre os fluxos de gastos e de renda. ;Isso permite que a pessoa estabeleça um limite. Ela deve saber primeiro a quantia que entra na conta bancária. Depois, calcular quanto custarão as realizações pessoais e o prazo que tem para alcançá-las. A partir daí, ela pode definir quanto precisa guardar mensalmente para comprar o que deseja;, ensina o educador.

Fragoso chama esse método de ARO (Autoconhecimento, Realizações e Orçamento) e o compara com o ato de andar de bicicleta. ;No primeiro momento, é difícil pedalar. Depois, você ganha velocidade e faz menos esforço. Se parar de pedalar, a bicicleta roda sozinha por um tempo, mas vai cair em algum momento, assim como o consumidor cai nas dívidas;, compara.

Para Rogério Olegário, diretor executivo da Libratta Finanças Pessoais, não existe uma regra básica para economizar, pois o que é importante para uma pessoa pode não ser para outra. ;Na verdade, economizar é uma palavra que lembra restrição, e ninguém gosta disso, parece algo dolorido. O ser humano busca sempre o prazer e o conforto;, comenta. Por isso, Olegário sugere que as pessoas pensem em termos de realização de objetivos, pois é mais fácil guardar dinheiro tendo em mente as coisas boas e positivas que quer obter. Outra orientação é não esperar sobrar dinheiro para, depois, investir. ;Tem de calcular antes e já deixar separado quanto vai investir, no em e para que;, afirmou.

A saída que Olegário indica para manter o equilíbrio financeiro é planejar as despesas para que elas caibam no orçamento. ;As pessoas ficam apertadas porque gastam acima da capacidade e, normalmente, desconsideram despesas do dia a dia, mesmo sabendo que são indispensáveis. Quando algum evento inesperado acontece, elas têm de contrair dívidas e pagam juros;, observa. ;É preciso ter um plano de voo, disciplina e compromisso consigo mesmo.;

Desejos


Myrian Lund, planejadora financeira e professora da Fundação Getulio Vargas (FGV), observa que, ao fazer uma planilha financeira, sempre é possível descobrir como reduzir gastos. ;A mudança de hábito tem que tirar o consumidor do cheque especial. Juntar o dinheiro para liquidar uma dívida é um passo importante dessa transformação;, ressalta. Outra recomendação é ter cuidado com os desejos imediatos. ;O grande segredo para ter um ano diferente é agir devagar;, diz Myrian Lund, observando que decisões tomadas por impulso são armadilhas para o consumidor e que aprender com os erros passados é essencial.

A professora da FGV alerta ainda que é preciso ter cuidado com as promoções. ;Quando se vê diante de uma oferta vantajosa, o consumidor tende a comprar mais do que o normal e, consequentemente, gasta mais. Muitas vezes, porém, ele nem precisa do produto, que leva somente por estar barato. É necessário usar a razão para não estourar o orçamento;, completa Lund.

Rentabilidade com segurança


O mercado de investimentos pode parecer um ;bicho de sete cabeças; para quem não está acostumado, mas existem investimentos simples e de menos riscos, indicados para investidores iniciantes. O tesouro direto é considerado uma das aplicações mais seguras para investimento em renda fixa e, muitas vezes, com uma rentabilidade superior à da caderneta de poupança. ;Existem aplicações mais atrativas, mas é um bom começo para quem vai ingressar nesse mundo, posso indicar mesmo sem conhecer o cliente, porque é uma questão de render para ganhar poder de compra;, afirmou Matheus Portella, analista da Rise Investimentos.

Investir no tesouro direto nada mais é do que aplicar em títulos públicos, emitidos pelo governo para captar recursos. Ou seja, ao investir nesses papéis, a pessoa realiza um empréstimo ao país e esse é um dos motivos pelo qual esse título é considerado de baixo risco. No resgate, o governo paga o valor emprestado em uma determinada data acrescido de algum índice ao qual é atrelado, como inflação, taxa básica de juros (Selic).

Silvio Campos, economista-sênior da Tendências Consultoria, ressalta que o tesouro direto é um facilitador para que a população possa economizar. ;É um mecanismo seguro para guardar dinheiro, mas é preciso levar em conta objetivos e prazos na hora de investir. Cada pessoa sabe o que pretende ao guardar dinheiro. O tesouro direto é uma alternativa que oferece várias possibilidades;, disse.

O investidor pode comprar títulos públicos diretamente no site do Tesouro Direto (http://www.tesouro.fazenda.gov.br/tesouro-direto), para isso basta ter CPF e uma conta com algum banco ou corretora habilitados, chamados agentes de custódia. A quantidade mínima de compra é a fração de 0,01 título, ou seja, 1% do valor de um título, respeitando o valor mínimo de R$ 30. Não há limite financeiro para venda, o investidor pode comprar 0,01 título, 0,02 título, 0,03 título e assim por diante. O valor máximo para aplicação é R$ 1 milhão por mês.

Rendimento


O pré-fixado atrelado à Selic rende 100% da taxa, tida como justa para remunerar sem risco o investimento. Hoje a taxa atual justa é de 7%, um valor baixo quando comparado aos anos de 2010 e 2012, 10% e 12% respectivamente. Por já possuir uma definição prévia, não tem oscilação. Em 2017 ; até 28 de dezembro ;, o rendimento dos papéis atrelados à taxa básica estava em 9,8%.

O advogado Fernando Albuquerque, 32 anos, começou a aplicar em títulos públicos no fim de 2014, início de 2015, quando a Selic estava mais alta do que agora. ;O préfixado estava em um bom patamar e a inflação, não tão alta. Eu estabeleci alguns objetivos e sonhos e, para realizar, tinha que atingir determinado valor. Na época, o tesouro direto tinha as melhores taxas e dava um bom retorno;, contou.

Ele e a mulher avaliaram que a economia daria uma guinada e decidiram se organizar financeiramente de forma a fazerem o dinheiro render. ;Queríamos um carro e até um apartamento, procuramos uma assessoria para pegar dicas. Eu não sou do mercado e não tenho o hábito de acompanhar diariamente o que está acontecendo, qual o rendimento desta ou daquela aplicação, então a presença de um profissional foi importante;, explicou.

Hoje, ele tem alguns papéis préfixados, equivalentes a 30% da carteira inicial, que vencem neste mês, e por isso não valeu a pena resgatar. Os outros 70% ele remanejou para outros investimentos. ;Acho que em qualquer investimento, inclusive o tesouro direto, é preciso entender o objetivo e o sonho que você pretende realizar com o dinheiro. Dessa forma, adequamos o investimento ao que pretendemos;, finalizou.

Demetrius Lucindo, analista da DMBL Investimentos, alerta que o principal risco do investimento no tesouro direto é que, apesar de o resgate poder ser feito a qualquer momento, a rentabilidade acompanha o mercado e, se a pessoa tiver que retirar o dinheiro antes do prazo de vencimento, corre o risco de perder dinheiro. ;As pessoas se assustam com isso porque os prazos de vencimento podem ser longos, mas se o investidor tiver a garantia de que poderá esperar o período contratado para o resgate, não terá problemas. A pessoa não tem que se preocupar com a baixa do título no mercado antes do vencimento se não for retirá-lo;, explica.

Os títulos do tesouro direto podem ser pré ou pós-fixados, com pagamento de juros semestrais ou no vencimento e de acordo com o índice sobre o qual será feita a remuneração. Na hora que o investidor vai realizar a compra, tem à disposição uma série de vencimentos para cada tipo de título, basta aplicar no que mais se adequa aos seus objetivos.


Facilidade para aplicar

O economista-sênior da Tendências Consultoria, Silvio Campos, aconselha a aplicação no título pós-fixado atrelado à Selic aos investidores que desejem resgate em prazos mais curtos. Na opinião dele, entretanto, o investimento de longo prazo é a melhor forma para se proteger da inflação.

A consultora de imagem e estilo Bárbara Vieira Aguiar Souza, 25 anos, começou a investir em títulos públicos há seis meses, após ver alguns vídeos sobre a parte financeira. Por meio de uma youtuber específica, que fez um passo a passo do funcionamento do tesouro direto, ela se interessou pela aplicação. ;Antes disso, eu achava que era algo muito distante, não entendia nada, e que era só para gente que tinha muito dinheiro. Da forma como ela explicou no vídeo, eu me senti segura. Comprei 0,01 depois aumentei para 0,02, depois 0,03 e cada vez mais fui entendendo como funciona;, afirma.

Com a decisão de poupar tomada, ela viu nos títulos públicos uma forma de fazer o dinheiro render mais. ;Já que vou deixar aplicado por um tempo, prefiro que seja em um local com bom rendimento;, disse. Bárbara destaca que sentiu falta de uma explicação mais didática no site do Tesouro. ;Seria do interesse deles que as pessoas entendessem melhor. É um assunto que ainda precisa ser explorado com a população;, observa.

O analista Demetrius Lucindo,da DMBL Investimentos, orienta os investidores a prestarem atenção às possíveis mudanças na economia, antes de decidirem sobre qual título é melhor para seus objetivos: o pré ou o pós-fixados. ;As pessoas não sabem e aplicam mal. O que acontece é que, normalmente, os bancos cobram taxas administrativas altas, então, o tesouro direto, a longo prazo, é melhor. Além de só cobrar uma taxa de custódia, você pode investir um valor pequeno a longo prazo;, observa.

Bárbara começou a estudar sobre investimentos, ler livros, não só sobre o tesouro direto, para se familiarizar. ;Eu descobri que não é tão difícil quanto eu achava. Tenho interesse de investir em outras modalidades futuramente, porque acho que ainda preciso estudar mais. É um passo maior, os riscos são maiores;, observa.

Praticidade


A médica Adriana Cocimell de Lima Moura, 53, investe nos papéis do Tesouro há cerca de um ano e meio, quando decidiu migrar da poupança. ;Meu marido é economista e sugeriu que eu colocasse no tesouro direto, já que o valor era baixo. Eu pesquisei, ouvi falarem muito bem e decidi;, explica.

Ela conta que precisou fazer algumas retiradas e que o processo não foi complexo. ;Para colocar dinheiro também é prático. ;Para colocar eu faço do computador e, na vez que retirei, no mesmo dia já caiu na conta;, disse. Agora ela deixa uma parte na poupança para gasto do dia a dia e alguma emergência, mesmo sabendo que o rendimento é mais baixo.

Na opinião de Demetrius Lucindo, as pessoas do Brasil são mal-informadas e há uma escassez de cultura financeira. ;Não só as pessoas de renda mais baixa, para quem tem um valor mais alto na conta também falta uma boa orientação e cultura sobre isso. É necessário ter conhecimento dos riscos para conseguir realizar um bom investimento;, afirmou.

*Estagiária sob supervisão de Odail Figueiredo

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