Economia

Inflação é menor para famílias que ganham até cinco salários mínimos

Enquanto indicador que mede custo de vida de famílias que recebem até cinco salários fecha o ano em 2,07%, o que avalia o das que embolsam até 40 fica em 2,95%

Simone Kafruni
postado em 12/01/2018 06:00

Aline Nunes, dona de casa:


Depois de um alívio em 2017, a inflação volta a preocupar nos primeiros dias de 2018. O Índice Geral de Preços ; Mercado (IGP-M), considerado uma prévia da carestia, teve alta de 0,75% na apuração referente ao primeiro decênio de janeiro. Apesar de ter chegado ao patamar mais baixo das últimas duas décadas no ano passado, o custo de vida afeta os consumidores de forma diferente, conforme a renda. A inflação foi menor em 2017 graças à queda de preços de produtos alimentícios, que têm peso maior no orçamento das famílias mais pobres. A alta de preços dos serviços, no entanto, ultrapassou o teto da meta de inflação do Banco Central, de 4,5%, com impacto maior para as classes média e alta. Essa fatia da população, que usa o carro como transporte, também se ressentiu com a disparada de 10,32% no valor da gasolina.


Não à toa, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) trabalha com dois índices, que apontaram carestia menor para os mais pobres em 2017. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) se refere às famílias com rendimento até 40 salários mínimos e fechou em 2,95% no ano passado. Já o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), que se refere a famílias com renda até cinco salários mínimos, subiu 2,07% em 2017.

O indicador de inflação do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de dezembro também mostra que os mais pobres tiveram uma variação de preços dos bens e serviços mais baixa, de 0,33%, ante 0,45% para as pessoas mais ricas da população. ;A desaceleração da inflação em 2017 ocorreu em todas as faixas de renda, mas com mais intensidade nas camadas mais pobres. No último mês do ano, o alívio inflacionário dos mais pobres veio, principalmente, do preço da energia elétrica, que teve variação negativa de 3,1%;, avaliou o Ipea, em relatório.

De acordo com o economista da Fundação Getulio Vargas (FGV) André Braz, apesar de o custo de vida ter subido menos para as classes desfavorecidas, foram os pobres que mais perderam empregos com a crise. ;Para quem está desempregado e sem renda, qualquer preço é alto, mesmo com inflação baixa;, explicou. ;A classe média alta tem uma cesta de consumo na qual o peso dos produtos alimentares não é muito grande. São pessoas que usam mais automóvel e serviços;, acrescentou.

A servidora pública Gábia Sales, 53 anos, sentiu no bolso a alta da gasolina em 2017. Aposentada há um mês, ela costumava gastar um tanque por semana para ir do Guará, onde mora, ao Setor de Autarquia Sul todos os dias, e a uma igreja que frequenta em Taguatinga. Um custo de cerca de R$ 800 por mês com combustível. Mesmo casada com um servidor público, que se aposentou há seis meses, e com uma renda familiar privilegiada, a avó de Isabela, 5, disse que foi necessário reduzir alguns serviços durante a crise. ;Baixamos pacotes de telefonia, internet e televisão a cabo;, contou. Gábia está preocupada porque, com as duas aposentadorias, a renda caiu para um terço. ;Vamos ter que equilibrar bem as contas agora;, lamentou.

Gábia Sales, servidora pública aposentada:

Por faixa

Segundo o indicador do Ipea por faixa de renda, depois de uma alta de 7,01% em 2016, a inflação das famílias pobres teve variação de 2,16% no ano passado. Por sua vez, os ricos tiveram uma queda menos expressiva, passando de 6,2% para 3,7% entre 2016 e 2017. ;Para as famílias mais carentes, a inflação menor em 2017 ocorreu, sobretudo, pela variação negativa dos preços de alimentos como arroz (-10,9%), feijão (-46,1%), frango (-8,7%) e leite (-8,4%);, informou o instituto.

Esse alívio no valor dos alimentos, no entanto, não deve se manter, disse André Braz, da FGV. A prévia da inflação apurada pela instituição, o IGP-M, mostra que os preços de muitas matérias-primas aceleraram. ;É o caso do milho, que contamina a inflação do consumidor no preço da carne porque serve de ração. O frango já está mais caro por conta disso;, afirmou. Braz alertou ainda que o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) teve variação de 1,03% em janeiro, sobretudo por conta da alta de 3,66% nos alimentos in natura. O tomate subiu 21% e a batata, 19%, no período de coleta dos dados, realizado entre 21 e 31 de dezembro de 2017. ;No ano passado, houve uma supersafra, o que não está previsto em 2018. Por isso, a redução no preço de itens de alimentação não deve se repetir este ano;, projetou.

Para o casal Wagner, 36, e Sônia Irene Cardoso, 35, que tem três filhos, Priscila, 14, Kennedy, 9, e Sara, 8, e que mora no Setor de Chácaras da Ceilândia, a queda no valor de produtos alimentícios nem sequer foi sentida no ano passado. ;Algumas coisas baixaram de preço, mas outras aumentaram muito, como o gás de cozinha, que disparou. O salário não acompanhou;, reclamou Wagner, que é motorista. ;O valor do tomate está um absurdo, estamos comprando cada vez menos. Carne eu troco por ovo ou por salada. Quem mais sente são as crianças, porque tivemos que reduzir o leite;, contou Sônia, que é monitora em ônibus escolar e aproveita as férias para comprar alimentos em feiras, onde os preços são mais em conta do que nos supermercados.

O custo de vida do Distrito Federal está expulsando a família da dona de casa Aline Nunes, 28, mãe de Álvaro, 10, e Julian, 3. O marido é técnico em enfermagem e decidiu estudar no Paraguai, onde a educação é mais barata. ;Vamos morar em Foz de Iguaçu porque aqui tudo é muito caro;, contou Aline. O casal aluga quitinetes por R$ 250 em Ceilândia, mas alguns inquilinos perderam o emprego. ;Mesmo com esse valor baixo, tem gente atrasada com o aluguel;, disse. A dona de casa afirmou que não percebeu a queda no preço dos alimentos e não houve alívio no orçamento da família. ;Tenho dificuldade para comprar roupa para as crianças. Eles não param de crescer e está tudo muito caro;, reclamou.

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