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Quase metade termina ensino médio com atraso

Apenas 54,3% dos jovens brasileiros concluem a etapa até os 19 anos, considerada a idade ideal. Taxa cai assustadoramente entre estudantes pobres, negros e das regiões Norte e Nordeste, mostra levantamento com base nos dados da Pnad

postado em 08/12/2014 11:27
Aos 22 anos, Juan Dias concluiu a educação básica neste mês: agora disputará uma vaga na universidade  (Ed Alves/CB/D.A Press)
Aos 22 anos, Juan Dias concluiu a educação básica neste mês: agora disputará uma vaga na universidade

Juan Dias concluiu o 3; ano neste mês. Ele aguarda o resultado do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e deseja fazer faculdade de artes cênicas. A diferença entre Juan e os demais colegas de classe do Centro Educacional 1 do Cruzeiro é que ele tem 22 anos e acumula três reprovações no histórico escolar: duas no 1; ano do nível médio e uma na 7; série do ensino fundamental. Apesar de Juan ser uma exceção na escola em que estuda, essa é a realidade de quase metade dos jovens brasileiros, que não conseguem concluir a educação básica até os 19 anos, a idade ideal.

Levantamento que o movimento Todos Pela Educação (TPE) divulga hoje mostra, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2013, que apenas 54,3% dos estudantes brasileiros concluíram o ensino médio até os 19 anos. A proporção é inferior ao índice de 63,7%, estabelecido pela entidade como uma das metas a serem atingidas até 2022 em um esforço conjunto para garantir o direito à educação de crianças e jovens no país. Os dados para o ensino fundamental também não foram satisfatórios. Enquanto a meta sinaliza 84%, apenas 71,7% dos alunos conseguiram finalizar a etapa até os 16 anos. O monitoramento mostra que, entre 2007 e 2009, os indicadores almejados para o período foram atingidos, mas, desde então, têm se afastado do objetivo.

Alejandra Meraz Velasco, coordenadora-geral do TPE, explica que as metas iniciais previam um crescimento menor. ;O início é um período de adaptação, mas esperava-se que em 2009 esse crescimento se acelerasse.; Ela sinaliza melhora no ensino fundamental, mas em ritmo lento, que gera uma situação de estagnação no ensino médio. ;A expectativa era de que, conforme se corrigisse o atraso nos anos iniciais, mais crianças acabariam o ensino médio na idade adequada, mas isso não se verificou;, lamenta.

Presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), José Francisco Soares discorda sobre a estagnação. ;Quase todos os índices da educação brasileira estão crescendo. Não é o ideal, mas estamos avançando. É preciso reconhecer que o país não está parado, mas, como ele começou a se preocupar tarde com a educação, temos um caminho longo pela frente;, defende. Soares relembrou ainda que o governo se pauta pelo Plano Nacional de Educação (PNE), lei aprovada em junho de 2014, com 20 metas a serem alcançadas gradualmente até 2024.

Distorção
O estudante Juan Dias se sente prejudicado pelos anos que perdeu. ;Se eu tivesse terminado no tempo adequado, já estaria na metade da faculdade, bem mais à frente;, considera. Outro aspecto observado na pesquisa, a taxa de distorção de idade por série, aponta diferença maior entre a idade adequada e a idade real dos alunos nos anos finais do ciclo básico. Alejandra, do TPE, avalia que isso ocorre pelo desestímulo do estudante que reprova e tende a repetir outras vezes, como no caso de Juan. ;Uma criança que reprova, passa a frequentar um ano escolar errado e isso pode levar, a longo prazo, a outras reprovações e abandono. Isso aumenta de forma expressiva o número de alunos que saem da escola antes de concluir os estudos;, relaciona.

As consequências da reprovação são só um sintoma dos problemas encontrados na educação brasileira. ;Eu não gostava da escola, era muito bagunçada, entrava quem queria, saía quem queria e os professores não davam uma boa aula;, reclama Juan sobre as outras três escolas públicas em que estudou antes de ingressar no Centro Educacional 1 do Cruzeiro.

O aluno conta que sentia dificuldades com o conteúdo, mas que as escolas não ofereciam reforço escolar. Para Alejandra, essa mãozinha é muito importante. ;A reprovação não pode ser uma política pública, e a aprovação do aluno sem domínio das disciplinas vai levá-lo a não conseguir acompanhar as etapas seguintes, resultando no fracasso e no abandono escolar. A medida a ser tomada é o reforço no contraturno no decorrer do ano, de forma que a pessoa vá para o ano seguinte adequadamente.;

Desigualdade social
Outro aspecto revelado pela pesquisa é a desigualdade observada com relação aos aspectos socioeconômicos, raciais e regionais (veja quadro). Há uma diferença de aproximadamente 20 pontos percentuais entre jovens brancos e negros que concluíram os ciclos básicos da educação na idade adequada. Quanto à renda familiar, entre os 25% mais ricos, 83,3% dos alunos concluem o ensino médio até os 19 anos, enquanto entre os 25% mais pobres o índice cai para 32,4%. A situação é semelhante na educação fundamental. As regiões Norte e Nordeste apresentam taxa de conclusão inferior à média nacional, enquanto os melhores resultados estão no Sudeste.

Alejandra acredita que essas disparidades deveriam nortear as políticas públicas de educação. ;Deve-se destinar mais recursos financeiros e técnicos àquelas regiões e grupos sociais que apresentam indicadores mais baixos;, afirma. José Francisco Soares, do Inep, defende que o governo federal busca essas soluções por meio de cooperação com os estados. Ele aponta que os investimentos em educação estão aumentando sistematicamente. ;Hoje, são 6,4% do PIB (Produto Interno Bruto) destinados à educação, e o governo aprovou a alocação dos recursos do pré-sal para a mesma finalidade;, argumenta.

Alejandra conclui que os índices analisados sinalizam deficiências que devem ser corrigidas ao longo de todo o ensino. ;Não tem como corrigir a idade de conclusão no ensino médio se não se resolvem todos os problemas que a educação pública enfrenta desde a educação infantil. A gente precisa cuidar da qualidade do ensino desde os anos iniciais.;

Apenas 54,3% dos jovens brasileiros concluem a etapa até os 19 anos, considerada a idade ideal. Taxa cai assustadoramente entre estudantes pobres, negros e das regiões Norte e Nordeste, mostra levantamento com base nos dados da Pnad

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