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A via-crúcis para contratar

Vagas congeladas e redução da produtividade nas empresas estão entre os principais impactos da falta de mão de obra qualificada. Algumas organizações importam trabalhadores

postado em 30/03/2014 11:42

Sildenir trabalha em uma confecção onde há 15 vagas abertas

A falta de profissionais qualificados é apontada por empresários de todos os setores da economia brasileira como um dos principais fatores que impedem o crescimento das organizações. Eles afirmam que o faturamento poderia aumentar se a produtividade fosse maior, o que não ocorre por causa da formação insatisfatória dos trabalhadores na indústria, no comércio ou no setor de serviços. Alguns deles optam por importar mão de obra de outros estados e até mesmo de fora do país.

Na confecção em que Sildenir da Silva Santos, 42 anos, trabalha, 15 vagas estão abertas e não se encontram profissionais para preenchê-las. Ela veio do Piauí para Brasília há 15 anos, com o objetivo de realizar o sonho de ser costureira. ;Quando cheguei aqui, não sabia quase nada, aprendi tudo. Comecei como costureira e agora estou no cargo de encarregada de produção;, relata.

[SAIBAMAIS]Histórias como a de Sildenir são comuns no setor, afirma Eleonora Cordeiro, uma das donas da Malharia Allegro, em Brasília. A maioria dos funcionários foi qualificada na empresa. Ela e o sócio recorrem constantemente ao Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), colocam anúncios na Agência do Trabalhador e nos jornais, mas não conseguem preencher o quadro. ;Gastamos pelo menos 90 dias qualificando e leva até seis meses para conseguir produtividade;, reclama. Eleonora diz que a fábrica já teve cerca de 60 funcionários e poderia aumentar a produção, pois a demanda pelo serviço é grande. ;Em Brasília, o fator que mais emperrou o crescimento das empresas (de confecção) foi a falta de mão de obra qualificada;, afirma.

Segundo Fernando Pimentel, diretor-superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), o problema afeta todo o país, principalmente os grandes centros de produção, e a falta de domínio da tecnologia contribui para agravar a situação. ;O nível de exigência tem aumentado. Hoje, é preciso saber lidar com máquinas mais modernas;, diz. Por isso, ele destaca a importância da formação de mão de obra pelo governo, em entidades privadas e nas próprias empresas.

O colombiano Diego foi chamado para suprir a carência de caminhoneiros no Paraná

Não muito distante
Também faltam profissionais preparados para dirigirem os caminhões que transportam boa parte da produção da indústria. Quase 86% dos empresários do setor de transportes têm dificuldade em contratar mão de obra qualificada, de acordo com pesquisa divulgada na última semana pela Confederação Nacional do Transporte (CNT). O diretor executivo da confederação, Bruno Batista, afirma que alguns fatores externos afetam a atração de trabalhadores. ;Como a infraestrutura é muito ruim, demora mais para fazer o transporte da mercadoria e é preciso mais caminhões e motoristas;, destaca. ;A viagem se torna mais lenta e o risco a que o motorista é exposto também aumenta;, completa.

A CNT pretende formar 50 mil motoristas por meio do Serviço Social do Transporte (Sest) e do Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Senat). As inscrições começaram em fevereiro, e 150 mil pessoas se cadastraram. A intenção é formar jovens de 18 a 25 anos em situação de vulnerabilidade social e arcar com os custos das carteiras de habilitação tipo B e, posteriormente, das de tipo C, D ou E, contanto que o trabalhador siga carreira na área.

Enquanto aguardam os resultados do esforço de qualificação de mão de obra promovido pelo governo ; por meio de cursos técnicos ; e pela CNT, as empresas do Paraná começaram a contratar motoristas na Colômbia. Quinze estrangeiros já estão trabalhando no estado e outros 250 enviaram currículos, de acordo com Gilberto Antônio Cantú, presidente do Sindicato das Empresas de Transportes de Cargas no Estado (Sectcepar). ;É um projeto-piloto, começou no fim do ano passado. É mais uma maneira de tentar amenizar a falta de mão de obra;, explica. Segundo ele, os motivos da carência são diversos: a falta de interesse dos jovens pela profissão, o aumento de venda de caminhões sem que houvesse uma reposição do quadro de profissionais e a necessidade de contratar mais pessoas após a regulamentação da profissão, que estipula jornada máxima de 10 horas diárias ; incluindo horas extras.

O motorista colombiano Diego Orozco, 31 anos, está no país há cinco meses, mas atua no ramo há 11 anos. ;Consigo dirigir caminhões de todo tipo;, garante. Ele afirma que veio para o Brasil em busca de uma remuneração melhor e acrescenta os benefícios de conhecer outro idioma e ganhar mais experiência a cada dia. Ao chegarem ao Brasil, esses profissionais tiram toda a documentação necessária e precisam passar por treinamento para conhecer a legislação de trânsito do país.

Marcos Battistella, diretor da empresa que contratou Diego, a BBM Transportes, explica que formar mão de obra para trabalhar na área é um processo lento, que leva de seis meses a um ano. ;Pegamos motoristas que trabalham com caminhões menores e os treinamos para dirigir veículos maiores. Isso gera um custo grande, porque a formação desse profissional demora e é preciso colocar um instrutor para acompanhá-lo nas primeiras viagens;, destaca. A firma já contratou quatro profissionais do país vizinho e está em andamento a contratação de outros três.

Retorno aguardado
Outra reclamação constante das empresas é a da falta de engenheiros. Raphael Falcão, diretor da empresa de recrutamento de executivos Hays, explica que os que se formaram durante a década de 1990 foram trabalhar em áreas mais burocráticas, uma vez que o crescimento da indústria era fraco. Anos mais tarde, no entanto, o quadro mudou. A economia cresceu e as áreas de energia hídrica, eólica, térmica, de óleo e gás e todas aquelas ligadas à infraestrutura do país ; impulsionadas em grande parte pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) ; precisaram contratar. ;Demandou-se profissionais não só formados, mas com determinada experiência. Isso pegou no nosso contrapé, porque temos trabalhadores formados, mas não com experiência técnica;, afirma Falcão. Ele diz ainda que os engenheiros começaram a voltar para as áreas de que o mercado mais precisa, mas que esse retorno não ocorre na mesma velocidade em que aparece a demanda.

Durante a abertura do 1; Fórum Nacional de Infraestrutura, que ocorreu no Senado Federal na última semana, o senador Fernando Collor (PTB-AL), sugeriu, inclusive, a criação de um programa para formar engenheiros, nos moldes do Mais Médicos. Para ele, isso reforçaria os projetos que precisam ser desenvolvidos para garantir a melhoria da infraestrutura, principalmente no âmbito municipal.

Com o início da exploração do pré-sal, o setor de óleo e gás passou a ser um dos que mais necessita de profissionais ; em todos os níveis de formação, e não apenas engenheiros. A Hays promoveu estudo que avaliou esse mercado em todo o mundo. No Brasil, o levantamento mostrou que a estimativa do governo é de que será necessário formar 250 mil novos profissionais na próxima década e que já tiveram início ações para atrair 200 mil. Mesmo assim, de acordo com a pesquisa, é provável que o país precise importar de 5 mil a 10 mil trabalhadores por ano. No entanto, essa é uma mão de obra mais cara. Os estrangeiros que trabalham no país recebem US$ 125,8 mil ao ano, enquanto os brasileiros ganham US$ 90,6 mil. ;Estamos na pré-operação do pré-sal. Quando começar a operação, será muito mais intensiva a necessidade de mão de obra;, lembra Raphael Falcão.

Gastamos pelo menos 90 dias qualificando e leva até seis meses para conseguir produtividade;
Eleonora Cordeiro,
empresária

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