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Conselho veta trampolim para acesso à universidade

A partir deste ano, os alunos que forem aprovados no vestibular sem terem concluído o ensino médio serão proibidos de ingressar na UnB ou em instituições particulares. Secretaria e sindicato das escolas privadas vão acatar a determinação do órgão que cria normas e diretrizes para a educação no DF

postado em 07/01/2013 11:34
Lucas de Carvalho ingressou na UnB no ano passado, em pleno 3º ano do ensino médio: A partir deste ano, o Conselho de Educação do Distrito Federal vetará a conclusão antecipada do ensino médio para fins de matrícula em universidades. Dessa forma, o aluno que estiver cursando o 3; ano do ensino médio e conseguir aprovação no segundo vestibular 2013 da Universidade de Brasília (UnB), que ocorrerá no meio do ano letivo, ficará impossibilitado de assumir a vaga. A norma, descrita no artigo 161, parágrafo único, e publicada em outubro do ano passado, prevê exceção apenas para os estudantes superdotados. A Secretaria de Educação, a UnB e o Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino (Sinepe-DF) informaram que vão acatar a determinação do conselho. O órgão, por sua vez, ainda definirá punições às instituições de ensino que desrespeitarem a nova norma. As sanções terão como base a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB).

A medida divide a opinião de especialistas. O doutor em educação da Universidade Católica de Brasília (UCB) Afonso Celso Galvão acredita que a legislação não surtirá efeito prático se não houver uma mudança no currículo do ensino médio. ;A norma não vai valer nada se o governo não mudar a didática dessas séries. Hoje, o ensino médio é como um curso preparatório para o vestibular, e não uma etapa de formação cognitiva, afetiva e intelectual dos alunos;, afirma o especialista.

Para o professor da faculdade de educação da UnB Remi Castioni, a legislação distrital vai corroborar com a decisão das instituições de ensino, que não permitem a liberação antecipada dos estudantes, e que são consultadas pelo Poder Judiciário nos casos em que os pais dos alunos buscam a Justiça para garantir o ingresso na universidade. ;A medida contribuirá para uma nova interpretação dos juízes que concedem as autorizações. A norma dificultará a liberação desses estudantes;, acredita Castioni.

Desde 2011, mais de 900 processos com pedido de antecipação da conclusão do ensino médio para ingressar na UnB passaram a tramitar no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Cerca de 600 casos foram favoráveis ao pedido dos estudantes que pleiteavam uma vaga na universidade. A Associação dos Familiares e Alunos Concluintes do Ensino Médio (AFA-UnB), que luta pela antecipação do diploma, representou 200 pedidos no
Judiciário local. A advogada que representa a AFA, Ana Esperança da Maia Pinheiro, não foi localizada pela reportagem para falar sobre a decisão do conselho.

A discussão sobre a aprovação ou não dos estudantes que conseguem uma vaga no ensino superior começou em 2010, quando o Conselho de Educação determinou, também por meio de resolução, que os alunos deveriam cursar 75% do 3; ano do ensino médio para ingressar na faculdade. ;A norma que vai vigorar este ano pretende dar fim à exceção que virou regra. É inadmissível que um estudante deixe de cursar o ensino médio em sua totalidade para ingressar mais cedo na universidade;, afirma o presidente do conselho, Nilton Alves Ferreira.

A estudante Marina Caricatti Rodrigues, 17 anos, conseguiu liminar para fazer um supletivo e ter o diploma de conclusão do ensino médio. Ela foi aprovada no segundo vestibular de 2012 da UnB para o curso de comunicação social. ;Eu conheço algumas pessoas que correram o risco de esperar completar os 75%, mas acho que valeu a pena ter conseguido a liminar. Logo quando saiu a aprovação, ninguém tinha certeza se a greve ia demorar tanto para acabar. Meu processo também não foi tão caro como um semestre de mensalidade na escola;, afirma. ;Consegui um advogado com um preço bem acessível, diferentemente de alguns que estavam cobrando cerca de R$ 5 mil.;

O reitor da UnB, Ivan Camargo, classifica a nova norma como um passo importante para evitar que mais estudantes ingressem no ensino superior sem condições cognitivas necessárias para a etapa de qualificação profissional. ;A antecipação prejudica o aluno, que muitas vezes não tem a maturidade necessária para cursar uma faculdade. Muitos desistem ou trocam de curso escolhido precocemente devido a esse problema. Por isso, somos favoráveis à decisão do conselho;, diz.

Mesmo a favor da nova norma, o reitor garante que a UnB continuará a cumprir as decisões judiciais favoráveis à entrada antecipada dos estudantes na universidade. ;Todos têm o direito de entrar na Justiça e pleitear o que é de direito. Vamos continuar a acatar as decisões do Judiciário, mas esperamos que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação seja levada em conta no momento da decisão judicial;, afirma Ivan Camargo. ;A legislação federal é clara ao determinar que o ingresso na faculdade se dê somente após o término integral das três séries do ensino médio;, ressalta.

Evasão
O estudante Lucas de Carvalho, 17 anos, fez parte da turma dos alunos que conseguiram antecipar a conclusão do ensino médio em 2012 para realizar matrícula na UnB. O jovem cursa psicologia, mas admite que já pensou em trocar de faculdade. ;Se no meio do caminho bater aquela vontade de mudar de profissão, vou fazer isso. Não tenho medo de encarar novamente o vestibular. Mas, no momento, é isso o que quero fazer. Passar no meio do ano foi um plano de vida que fiz;, diz Lucas. Para o estudante, no entanto, a nova norma do Conselho de Educação do DF não terá efeito prático. ;Acho que um direito já concedido não pode retroagir. Centenas de alunos já conseguiram liminar garantindo a vaga na UnB. Essa legislação local não deve mudar o que acontece atualmente;, opina.

Remi Castioni explica que nos últimos anos aumentou o número de estudantes universitários que abandonaram o curso superior. ;São alunos, em sua maioria, que entraram muito cedo na faculdade e não têm certeza da carreira que pretendem seguir. São escolhas profissionais feitas, muitas vezes, sob pressão da família ou do momento. O ensino médio cumpre o papel de orientar esse jovem na escolha da profissão;, diz o especialista em educação da UnB.

De acordo com a presidente do Sinepe-DF, Fátima de Mello Franco, as escolas particulares já estão cientes da nova norma educacional do DF. Ela garante que todas as instituições privadas vão cumprir a determinação. ;Os estabelecimentos reconhecem a necessidade dessa fase no desenvolvimento dos jovens. Elas orientam os pais em relação à importância do término dos estudos. Sabemos que a antecipação na entrada da universidade pode ser a causa da imaturidade da escolha profissional dos estudantes;, observa.

QI acima da média
Uma pessoa superdotada é aquela que apresenta capacidade mental acima da média de inteligência, ou seja, com QI (Quociente de Inteligência) acima de 127. Também são considerados superdotados os estudantes que apresentam notável desempenho e/ou elevada potencialidade em qualquer aspecto isolado ou combinado na sua capacidade intelectual e aptidão acadêmica específica. Essas e outras características podem ser constatadas por avaliações realizadas por profissionais da área de psicologia e de educação.


"A antecipação prejudica o aluno, que muitas vezes não tem a maturidade necessária para cursar uma faculdade. Muitos desistem ou trocam de curso escolhido precocemente devido a esse problema. Por isso, somos favoráveis à decisão do conselho;
Ivan Camargo, reitor da UnB

Entenda o caso

Polêmica na Justiça
No fim de 2010, o Conselho de Educação do Distrito Federal publicou uma resolução exigindo frequência mínima de 75% do total de horas letivas para a emissão do certificado de conclusão do ensino médio. Para conseguir ingressar na universidade, os alunos aprovados no vestibular do 2; semestre começaram a recorrer a supletivos, voltados para a educação de jovens e adultos. Porém, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) especifica que o ingresso no ensino médio do Ensino de Jovens e Adultos (EJA) deve ser feito somente após os 18 anos.

Em 2011, uma grande quantidade de mandados de segurança chegou à Justiça. Aprovados em universidades privadas ou na UnB, jovens entre 16 e 17 anos conseguiram liminares para fazerem uma prova e adquirirem o diploma antes do prazo de registro nas instituições de ensino superior. Os entendimentos sobre a questão são diversos. Os apoiadores citam a Constituição Federal, que assegura aos adolescentes acesso aos mais amplos níveis de estudo, só dependendo da capacidade do aluno. Quem reprova o ingresso prematuro considera a importância da conclusão de todos os níveis de ensino para o desenvolvimento intelectual e pessoal dos estudantes.

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