Trabalho e Formacao

Sem"responsa"?

Mais conhecidas como geração nem nem, quase 20% das pessoas de 15 a 29 anos não estudam nem trabalham. No Distrito Federal, elas são 120 mil. Programa Projovem Trabalhador foi criado para inseri-las no mercado

postado em 01/09/2014 10:04
Um exemplo da geração %u201Cnem nem%u201D, Matheus abandonou a faculdade. Por outro lado, muitas jovens deixam de trabalhar ou estudar por causa da maternidade, como Raíssa (abaixo) (Gustavo Moreno/CB/D.A Press  )
Um exemplo da geração nem nem, Matheus abandonou a faculdade. Por outro lado, muitas jovens deixam de trabalhar ou estudar por causa da maternidade, como Raíssa (abaixo)

 (Oswaldo Reis/Esp. CB/D.A Press)

Um diploma na mão deixou de ser sinônimo de emprego garantido há décadas, e quem precisa trabalhar para contribuir com o orçamento de casa nem sempre consegue conciliar a profissão com os estudos. Fugindo das duas situações, há mais de 120 mil jovens desocupados no DF. Conhecidos como geração ;nem nem; ; por nem trabalharem nem estudarem;, eles são 9,6 milhões em todo o país, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

São jovens como Daniel da Silva, 17 anos. Ele nunca trabalhou e desistiu dos estudos ainda no ensino fundamental. ;Moro com meu pai, meu avô e minha avó. Eu nunca pensei em trabalhar, acho que eu não preciso agora. Eu só fico aqui na rua com os moleques, a gente joga alguma coisa ou eu fico mexendo no celular.; Morador do Gama, ele parou de estudar há três anos. ;Eu fiz só até a 5; série mesmo, já estava atrasado. Parei de ir porque não gostava mesmo, não me interessava.;

A pesquisadora Joana Monteiro, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), chama a atenção sobre os mais de 55% dos ;nem nem; que não concluíram o ensino médio. ;A política pública principal para reduzir o número de jovens que não trabalham nem estudam é fazer com que eles permaneçam mais tempo na escola, reduzindo a evasão;, diz. ;Do ponto de vista do mercado de trabalho, há políticas de inserção, como os programas de jovem aprendiz, que ajudam;, diz.

Mães precoces
As maiores representantes do grupo ;nem nem; talvez façam parte dele por motivo de força maior: adolescentes que tiveram filhos cedo. De cada 10 pessoas de 15 a 29 anos que se encontram nessa situação, sete são mulheres. Entre elas, 58,4% têm um ou mais filhos. Raíssa Ribeiro, 22 anos, deixou de trabalhar por causa da maternidade. Ela atuou durante três anos em uma empresa de administração de condomínios. Chegou a trabalhar durante um mês após a licença-maternidade, mas recebeu a notícia de que seria transferida de uma unidade em Vicente Pires, onde mora, para o Gama.

Sem poder arcar com uma creche, Raíssa decidiu abrir mão do emprego para cuidar do filho. ;No começo, fiquei preocupada com meu sustento, mas eu e meu marido estamos conseguindo pagar as contas;, diz ela, que mora com os sogros e o marido, que tem 23 anos e é vendedor. Raíssa só pensa em retornar ao mercado de trabalho quando Cauã estiver crescido.

De acordo com o pesquisador Adalberto Cardoso, diretor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Uerj), o casamento e a maternidade são fatores importantes no afastamento das mulheres dos estudos e do trabalho. ;É importante investir na educação sexual dos jovens. A iniciação sexual precoce não é um problema em si, mas as pessoas devem se conscientizar a respeito das consequências. Às vezes, existem tabus dentro da família, e sexo não é algo discutido;, explica o professor, que conduziu pesquisa comparativa entre a condição dos jovens ;nem nem; de 2000 a 2010.

Também são fatores importantes nessa estatística a baixa escolaridade e a renda (veja quadro). De acordo com Cardoso, ações afirmativas têm papel importante na redução do número de pessoas nessa condição. ;As políticas de cotas servem como estímulo para que os jovens permaneçam na escola, pois eles têm consciência de que podem entrar na faculdade. No entanto, é preciso investir na educação básica e nas escolas públicas para que eles recebam formação melhor a longo prazo;, afirma. O pesquisador ressalta, no entanto, que a questão não é exclusivamente brasileira. ;Esse é um problema mundial, até menos grave no Brasil do que em países europeus, como Espanha e Portugal;, explica.

Novas oportunidades
A fim de aumentar as chances de inserção profissional de jovens de baixa renda que cursaram até o ensino médio, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) criou o programa Projovem Trabalhador. No Distrito Federal, a Secretaria de Estado de Trabalho (Setrab) promove cursos com duração de seis meses nas áreas de administração, saúde e construção e reparos. No ano passado, sobraram 800 das 4,2 mil vagas oferecidas. As mulheres são 70% dos participantes do Projovem Trabalhador.

Para participar, o interessado deve ter entre 18 e 29 anos, renda de até um salário mínimo por pessoa da família, estar desempregado e cursar ou ter concluído o ensino fundamental ou médio. Os selecionados recebem bolsa-auxílio de R$ 100 por mês, além de lanche, auxílio-transporte, material didático, kit estudantil e seguro contra acidentes pessoais.

De acordo com o subsecretário de Atendimento ao Trabalhador e ao Empregador da Setrab, José Eduardo Corrêa, a secretaria pretende investir em outros programas de formação gratuitos. ;Além do Projovem e do Qualificopa, a secretaria está em fase de desenvolvimento de iniciativas de capacitação para grandes eventos, como as olimpíadas universitárias;, disse o subsecretário em relação à Universíade, que será realizada em Brasília em 2019.

;Os primeiros formandos terminaram o curso no início deste ano, e cerca de 30% deles estão empregados;, conta. Na opinião do pesquisador Adalberto Cardoso, iniciativas como essa são positivas, mas exigem acompanhamento. ;Mais importante do que saber quantos foram empregados, é saber quantos permanecem empregados;, opina.

Pausa para pensar
O desejo de mudar de carreira pode fazer com que alguns jovens entrem para o grupo dos ;nem nem; antes de decidirem tomar novos rumos. Esse é o caso de Matheus Carvalho, 18 anos. O adolescente cursou três semestres de engenharia na Universidade de Brasília (UnB), mas largou o curso há um semestre. ;Acho que entrei muito cedo na faculdade, acabei escolhendo a área porque há engenheiros na minha família. Sair da UnB foi um pouco chocante, mas assim tive mais tempo para pensar no futuro;, diz. Agora, estuda por conta própria para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para entrar em outro curso superior. ;Penso em estudar direito na UnB ou engenharia nuclear na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).; Matheus também tem um grupo de rap. ;Sonho em viver de música, mas sei que é difícil;, reconhece.

Lorena Pereira, 22 anos, está em situação semelhante há cerca de um ano, desde que trancou a faculdade. ;Na época do ensino médio, eu tinha dúvidas sobre qual curso fazer. Decidi cursar gestão ambiental porque era fácil de passar e perto da minha casa, em Planaltina. Fiz seis semestres do curso, mas o currículo não tinha nada a ver comigo. Eu continuava, principalmente, porque minha família dizia para não desistir;, relembra. A jovem pretende cursar jornalismo ou psicologia, mas admite que não teve boas notas no último vestibular.

Para a empresária Dominique Magalhães, autora do livro O que falta para você ser feliz?, a chave para para sair dessa situação é refletir sobre o que realmente motiva você. ;Ninguém pode decidir o que é melhor para nós, o que nos motiva ou faz feliz. Para nos conhecermos, é preciso nos libertarmos dos papéis que assumimos ao longo da vida e que não nos motivam;, explica. ;Errar faz parte do crescimento. Cabe aos pais ou aos responsáveis estimularem e demonstrar que sempre estarão por perto, apoiando;, completa.

Falta preparação
Segundo pesquisa, quase metade dos jovens acredita que não está preparada para ingressar no mercado. Na busca por uma vaga como estagiário ou trainee, 43% das pessoas de 18 a 24 anos acreditam que têm um nível de experiência incompatível com a exigência do mercado ou que as vagas disponíveis exigem perfis mais qualificados. A pesquisa, conduzida pela empresa de recrutamento Page Talent, consultou 460 jovens em julho.

Mais conhecidas como geração nem nem, quase 20% das pessoas de 15 a 29 anos não estudam nem trabalham. No Distrito Federal, elas são 120 mil. Programa Projovem Trabalhador foi criado para inseri-las no mercado

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