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Obras evitam "bolivianização" do Peru

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postado em 20/09/2008 12:25
O governo do Peru injetará US$ 2,4 bilhões em obras no sul do país nos próximos quatro anos. O maior investimento já feito na zona andina deve chegar no momento em que a rejeição ao presidente Alan García atinge 96% no sul e surgem discursos autonomistas no antigo reduto do grupo armado Sendero Luminoso, que aterrorizou o país nos anos 80. Alheios aos riscos, a Petrobrás e as três maiores construtoras brasileiras - Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa - entraram na corrida milionária pelos contratos nas áreas de infra-estrutura e energia. Apesar da instabilidade da região, elas dizem não acreditar na "bolivianização" do Peru. Na quinta-feira (18/09), em visita oficial a São Paulo, García negou que o magro apoio ao seu governo seja motivo de preocupação. Apenas 4% dos peruanos do sul aprovavam seu governo em setembro. O índice nacional é de 19%. Ele garantiu, entretanto, não se preocupar com isso. "Não somos mais candidatos", disse ao Estado. Mas em junho, quando o presidente visitou a região de Puno, terra dos indígenas aimarás, no sul do país, foi recebido com manifestações tão violentas que não conseguiu sair do aeroporto de Juliaca. Dias antes, na região vizinha de Maquegua, o chefe da polícia local e outros 60 militares foram feitos reféns por manifestantes que sacudiram a cidade, com destruição de prédios públicos e bloqueio de rodovias. O motivo do "maqueguazo": disputa pelo dinheiro da exploração de minérios. Desta vez, o governo iniciará as obras já prevendo uma generosa distribuição de 50% dos impostos com os governos regionais, o que deve desarmar possíveis ataques da oposição. Já com o gás de Camisera, que chegará ao Porto de Ilo serpenteando as cordilheiras do sul do Peru, o governo não terá tanta boa vontade. "O gás só sai do tubo onde se pode pagar", explica Javier Galindo, gerente de Relações Corporativas da Petroperu, a Petrobrás peruana. "As pessoas continuarão se perguntando: ;se tenho um imenso tubo de gás passando na porta da minha casa, por que tenho de continuar cozinhando à lenha?;" Para muitos indígenas peruanos - tanto aimarás quanto quíchuas -, Lima já teve poder demais. A chegada de novos recursos indica para alguns a oportunidade de virar a mesa. Um dos maiores defensores da autonomia nestas zonas é o presidente regional de Puno, Hernán Fuentes, admirador de Evo Morales, Hugo Chávez e Fidel Castro. Em sua página na internet, Fuentes declara-se "partidário de mudanças". Sobre as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) diz: "Eu respeito seus pontos de vista." O presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, anfitrião do presidente García ao Brasil, não se preocupa com o peso dos indígenas do sul na política peruana. "Isso é bom para o Brasil, caso contrário, não estaríamos fazendo negócio", disse. BOM NEGÓCIO Em palestra a empresários, na quinta-feira (18/09), na Fiesp, García deixou claro que o Peru é mesmo um bom negócio. O país atingiu o ambicionado grau de investimento internacional em abril, um mês antes do Brasil. Além disso, o Produto Interno Bruto (PIB) peruano cresceu 8,9% em 2007 e a soma do comércio entre os dois países foi de US$ 1,53 bilhão só nos três primeiros meses deste ano. "A riqueza tem de ser distribuída com o sul", avisa o antropólogo e historiador peruano Juan Ossio Acuña, da Universidade Católica do Peru. "Isso reduziria absolutamente as divisões com esses grupos e desarmaria o risco de que as tensões se agravem." Para a americana Chyntia Sanborn, chefe do Departamento de Ciências Políticas e Sociais da Universidade do Pacífico, "García não está preocupado com sua popularidade, ele quer aumentar as relações comerciais e há um grande conflito em torno disso". Ela acredita que "não há nenhum lugar sem conflito para obras grandes como essa, mas entre todos os países, o Brasil é o de mais baixa rejeição. O mesmo não aconteceria com EUA, a China ou o Chile por aqui".

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