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Blogueira e ativista cubana Yoani Sánchez fala sobre a visita de Dilma

postado em 25/01/2012 08:00
A seis dias da visita de Dilma Rousseff a Cuba, uma moradora da ilha faz de tudo para sensibilizar a líder brasileira, por meio da internet, de entrevistas e até de uma carta, enviada na sexta-feira à presidente. Yoani Sanchéz, jornalista dissidente do regime caribenho, quer que Dilma interceda junto ao governo cubano para que a deixem assistir à estreia, na Bahia, do documentário Conexão Cuba-Honduras, do qual participa. ;Dilma seria ouvida;, aposta. A blogueira também espera que a presidente aproveite o encontro com Raúl Castro para pressioná-lo a adotar mudanças no tema dos direitos humanos, caso contrário ;a visita será como qualquer outra;.

Yoani ainda aguarda uma resposta à carta enviada ao Palácio do Planalto. Segundo o Ministério das Relações Exteriores, a mensagem foi encaminhada à Presidência, que, por sua vez, não confirma seu recebimento. A jornalista compara sua trajetória à da presidente e se diz vítima de censores que não dão explicações e não mostram o rosto, em referência à famosa foto que mostra Dilma em um tribunal durante a ditadura militar brasileira. Ao Correio, a blogueira acusa o governo de Castro pela morte do ativista Wilmar Villar, que faleceu após 50 dias em greve de fome e denuncia a intimidação que sofrem os dissidentes na ilha ; na segunda-feira, seu marido, Reinaldo Escobar, ficou preso por algumas horas.

A senhora acha que a presidente Dilma vai atender seu pedido e interceder junto ao governo cubano?
Tenho imensas expectativas. Acho que Dilma é uma pessoa capaz de se sensibilizar com a causa dos ativistas cubanos que têm sido censurados, porque ela também viveu essa situação. Há pouco tempo, vi uma foto muito comovedora, com a presidente brasileira sentada no banco dos réus, rodeada por homens que a estavam julgando. O que mais me impressionou foi que os homens escondiam o rosto. De alguma maneira, o mesmo acontece comigo: as pessoas que não me permitem sair de Cuba não me dão explicação, não mostram o seu rosto publicamente para dizer porquê. Essa imagem de Dilma me faz acreditar que, sim, ela vai se identificar com a minha situação. Além disso, ela é uma pessoa que seria ouvida no palácio cubano. As relações diplomáticas entre Brasil e Cuba são magníficas. E os amigos estão aí para nos dizer coisas que não gostamos de ouvir.



Mas o governo brasileiro já deixou claro que não vai se intrometer em assuntos domésticos de outros países.

Sim, mas eu percebo uma certa mudança de atitude e uma evolução favorável em relação à cidadania cubana desde o início do mandato de Dilma Rousseff. Uma de suas primeiras declarações com relação a Cuba tratou dos direitos humanos. Talvez haja uma pequena mudança de posição, com maior aproximação das pessoas que vivem aqui, e esse é o momento de vivenciar essa experiência.

A senhora acredita que a visita da presidente Dilma pode contribuir em algo para a sua luta?
Creio que sim, mas isso vai depender da agenda. Se a visita se reduzir a saber como vai a reconstrução do Porto de Mariel, a fazer uma foto de família com Fidel e Raúl Castro, bem, essa visita será como qualquer outra. No entanto, se Dilma incluir na sua agenda temas relacionados à cidadania, aos direitos e à flexibilização no plano das liberdades cívicas, estou segura de que ela vai ganhar a gratidão infinita do povo cubano.

O seu marido foi preso pela polícia na última segunda-feira. O que aconteceu?

Meu esposo, Reinaldo Escobar, foi detido devido a uma investigação sobre o recém-falecido Wilmar Villar. A zona oriental do país, especificamente o pequeno povoado de Contramestre, onde Villar vivia, está tomada por um forte contingente policial para impedir que as pessoas se aproximem da viúva do dissidente, Maritza Pelegrino. Ela tem uma opinião muito diferente da que está sendo difundida pelos meios oficiais.

A senhora acredita que o governo cubano é responsável pela morte de Villar?

Sim, porque o governo cubano não assumiu nenhum compromisso para que as pessoas sejam respeitadas nos cárceres, principalmente os presos de consciência. Dessa forma, os carcereiros fazem justiça como querem, sentindo-se amparados pelo governo. Assim, quando uma pessoa está em greve de fome, o modus operandi é retirar-lhe a água, trancar a pessoa em uma cela de castigo. Coisas como essas comprometeram a saúde de Villar. Se o governo penalizasse os carcereiros por tais atitudes, o panorama seria muito diferente. Todo indivíduo que está em uma cadeia, em uma escola, em um hospital é de responsabilidade das autoridades.

Algumas informações dão conta de que Villar teria sido condenado por agressão à mulher e não por atividades políticas.

Essa é uma informação falsa. Houve um incidente familiar entre os dois, em abril de 2011, mas foi algo que não teve acusação, processo nem qualquer implicação legal. Vários meses depois, Wilmar foi a um protesto denunciar a situação em cadeias do país, foi detido, processado e condenado por desacato, resistência e atentado. Ele se abalou muito com a condenação e, então, se submeteu à greve de fome. O governo tenta mesclar um evento com o outro, algo muito reprovável. É certo que houve um incidente doméstico que não deveria ter ocorrido, mas isso não transforma em inválida a tentativa de um homem de ter uma participação política. Me incomoda muito, e à esposa de Wilmar também, os insultos e as mentiras que estão falando sobre seu marido.

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