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Cidade de Raqa se torna a 'capital' do grupo jihadista rebelde no Iraque

Desde a chegada dos primeiros combatentes à única capital provincial que escapa ao controle do presidente Assad, em 2012, o grupo foi impondo um regime brutal e bem organizado

Agência France-Presse
postado em 20/06/2014 14:22
Beirute - Com bandeiras pretas e combatentes do Estado Islâmico no Iraque e no Levante (EIIL) em cada esquina, não há dúvidas sobre quem manda em Raqa desde que esta cidade do norte da Síria foi declarada capital do grupo jihadista. A localidade, estrategicamente situada no vale do Eufrates e a menos de 200 km da fronteira iraquiana, é a base do EIIL, o movimento que lidera uma ofensiva no Iraque desde 9 de junho.

Ação das forças de segurança iraquianas durante os confrontos com o Estado Islâmico no Iraque e no Levante, em Ramadi
Desde a chegada dos primeiros combatentes à única capital provincial que escapa ao controle do presidente Bashar al-Assad, em 2012, o grupo foi impondo um regime brutal e bem organizado. No alto da hierarquia estão sauditas e iraquianos, além de alguns tunisianos, afirmam especialistas e ativistas. E a base está formada por sírios, egípcios, europeus e chechenos.

"Quando os jihadistas chegaram à província, formavam um grupo de dez ou 15. Hoje, o EIIL controla cada aspecto da vida em Raqa", conta Omar al-Huweidi, escritor e especialista nascido em Raqa, mas que fugiu para a Turquia. O grupo tomou o controle de toda a cidade em março, após a fuga das forças do governo, derrotadas pelos rebeldes. Posteriormente, o EIIL expulsou os insurgentes de outros movimentos e impôs sua lei, proibindo a população de fumar ou ouvir música.

Em Raqa, o "EIIL tem escritórios para tudo o que você puder imaginar: saúde, educação, segurança, socorro islâmico, gestão das relações tribais e, inclusive, uma embaixada do emirado de Aleppo", explica Al-Huweidi.

[SAIBAMAIS]Sem piedade e muito inteligente

O EIIL saiu da Al-Qaeda, mas nunca jurou lealdade ao chefe da rede extremista, Ayman al-Zawahiri. Houve uma época em que quis se fundir com o braço oficial da Al-Qaeda na Síria, a Frente Al-Nosra, mas esta se opôs, iniciando uma guerra fratricida. "A diferença é que a Frente Al-Nosra espera a queda do regime para impor os ;hudus;, enquanto o EIIL já começou" a aplicar esse código de sanções previstas na sharia, como, por exemplo, cortar as mãos dos ladrões, explica Huweidi.



O emir do EIIL em Raqa, Abu Luqman, é um sírio impiedoso e muito inteligente, contou um morador. Segundo Hadi Salame, pseudônimo de um ativista que trabalha em Raqa, os combatentes de alto escalão são iraquianos, muitos deles ex-militares de Saddam Hussein, deposto pelos Estados Unidos em 2003. "Escolhem os chefes em função de vários fatores, sobretudo se estivessem na prisão na Síria ou sob outros regimes árabes, nos Estados Unidos, no Iraque ou em Guantánamo", afirma.

Ao que parece, o chefe do EIIL, Abu Bakr al-Baghdadi, passou quatro anos em um campo de detenção americano. Não se sabe muito sobre ele e "o mistério que o cerca contribuiu para o culto a sua personalidade", explica Aymen Jawad al-Tamimi, um professor universitário especialista em movimentos islamitas.

Salários em dólares

No Youtube florescem os cânticos religiosos elogiando as virtudes de Baghdadi e pedindo a potenciais novos recrutas que jurem lealdade a ele. Milhares de jovens sírios já se juntaram ao EIIL como alternativa ao Exército Sírio Livre (ESL), mal organizado e equipado. Outro motivo é que o EIIL, que deseja criar um Estado Islâmico na fronteira entre Iraque e Síria, "paga os salários em dólares", ressalta Hadi Salame.

O grupo é rico: se apoderou de armas no Iraque, controla campos de gás e petróleo na Síria e instaurou um sistema de arrecadação de impostos nas zonas sob seu controle. No entanto, a vida da população é extremamente difícil."Os jihadistas estrangeiros são prioridade no hospital. Os sírios, inclusive as crianças, são (cidadãos) de segunda categoria", conta Salame. As pessoas precisam se curvar às ações do EIIL. "Os integrantes mais importantes de todas as tribos juraram lealdade (ao grupo), mais por medo do que por convicção", afirma Huweidi.

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