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Papa denuncia 'câncer da desesperança' em visita à Coreia do Sul

Durante a missa, o papa rezou pelas vítimas da tragédia e recebeu em audiência privada várias famílias, que entregaram cartas com pedidos para que o pontífice utilize sua influência para obter uma investigação independente

Agência France-Presse
postado em 15/08/2014 10:33
Dangjin - O papa Francisco fez uma advertência, diante de dezenas de milhares de fiéis reunidos em um estádio na região de Seul, contra os males provocados pela sociedade de consumo, responsável em suas palavras pelo "câncer da desesperança". No segundo dia da visita à Coreia do Sul, Francisco celebrou a missa da Assunção para milhares de devotos no "World Cup Stadium" de Daejeon. O dia sagrado coincide na Coreia com o aniversário da libertação, em 1945, da península do domínio colonial japonês.

Fiéis fotografam o papa Francisco durante missa em estádio de futebol de Daejeon, na Coreia do Sul
"A esperança oferecida pelo Evangelho é o antídoto para o espírito de desesperança que parece crescer como um câncer na sociedade, que no exterior é próspera, mas que frequentemente vive a experiência da tristeza interior e o vazio", disse o pontífice. "A quantos de nossos jovens esta desesperança fez pagar um tributo", completou. "Possam os cristãos desta nação combater a atração do materialismo que asfixia os autênticos valores espirituais e culturais, assim como o espírito de concorrência desenfreado que gera egoísmo e conflitos. Que rejeitem também os modelos econômicos desumanos que criam novas formas de pobreza e marginalizam os trabalhadores", apelou o papa.

Em uma forte crítica ao modelo de sociedade competitiva que ganha cada vez mais espaço na Ásia, do Japão a Cingapura, de Taiwan até a Coreia, e inclusive a China, o líder da Igreja Católica advertiu sobre "a cultura da morte que desvaloriza a imagem de Deus, o Deus da vida, e viola a dignidade de cada homem, mulher e criança", em uma referência ao suicídio, ao aborto e à eutanásia. Francisco visitou após a missa o santuário de Solmoe, onde voltou a abordar o tema, diante de 2.000 jovens procedentes de 23 países da Ásia, incluindo a China,

[SAIBAMAIS]Idolatria da riqueza

"Vemos os sinais de uma idolatria da riqueza, do poder e do prazer, que tem um grande custo em vidas humanas", afirmou aos jovens. De acordo com o pontífice é possível sentir "o sofrimento causado pela pobreza espiritual, a solidão e a desesperança. É como se um deserto espiritual se estendesse no mundo". Na chegada a Solmoe, o papa rezou no santuário de Santo André Kim-Taegon, primeiro sacerdote católico da Coreia martirizado em 1846. O papa, extremamente popular, foi recebido no local com danças e cantos. Entre a multidão estavam dezenas de chineses, apesar das restrições das autoridades de Pequim à viagem de alguns deles, segundo fontes da igreja coreana. Jovens do Camboja, Hong Kong e Coreia do Sul prepararam perguntas delicadas sobre a Coreia do Norte e a China.

Controle e opressão

"Se vivemos 60 anos de ódio recíproco com o Norte, penso que a culpa não está apenas de um lado", afirmou a jovem sul-coreana Marina Park Giseon. Giovanni, de Hong Kong, questionou "por quê à medida que se desenvolve as diversas Igrejas na China continental (China popular) os controles e a opressão aumentam". Em Daejeon, Francisco se encontrou com 38 sobreviventes e parentes de vítimas do naufrágio da balsa Sewol, que aconteceu no sul país em 16 de abril. A catástrofe deixou quase 300 mortos, em sua maioria estudantes em viagem escolar. "Eu sou protestante, mas acredito que a visita do papa ajudará a curar as feridas do naufrágio", disse Kim Hyeong-Ki, pai de uma vítima.

Durante a missa, o papa rezou pelas vítimas da tragédia e recebeu em audiência privada várias famílias, que entregaram cartas com pedidos para que o pontífice utilize sua influência para obter uma investigação independente. O papa também aceitou batizar o pai de um dos adolescentes mortos no naufrágio. "É altamente simbólico que o papa batize um adulto em um país que registra 100.000 batizados católicos por ano", afirmou o porta-voz da Santa Sé, o padre Federico Lombardi.

Mísseis norte-coreanos

A visita do papa desperta grande entusiasmo na Coreia do Sul, onde os cristãos - em sua maioria protestantes - são mais numerosos que os budistas. Os 5,3 milhões de católicos (10,7% da população) integram uma Igreja dinâmica, influente e em pleno desenvolvimento. A chegada do pontífice na quinta-feira em Seul foi marcada pelo lançamento de teste de mísseis norte-coreanos, uma medida utilizada com frequência pelo regime de Pyongyang para demonstrar descontentamento e ameaçar a Coreia do Sul e seus aliados. Mas Pyongyang afirmou nesta sexta-feira que os disparos de mísseis a partir da costa, que coincidiram com a chegada do Papa Francisco à Coreia do Sul na quinta-feira, foram realizados para comemorar o aniversário da libertação do país do domínio japonês.



Em um breve comunicado, que não menciona a visita de cinco dias do Papa à Coreia do Sul, a agência de notícias oficial KCNA assinalou que o líder norte-coreano, Kim Jong-Un, supervisionou pessoalmente os testes com um míssil tático de alta precisão. O papa Francisco fez um apelo na quinta-feira às duas Coreias para que superem as recriminações e parem de recorrer à mobilização de forças.

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