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Coreias entram em acordo após maratona de negociações

As conversas tentavam resolver um perigoso impasse militar, que provocou uma rara troca de tiros de artilharia ao longo da fronteira na semana passada

Agência France-Presse
postado em 24/08/2015 18:27

Seul, Coreia do Sul - A Coreia do Sul e a vizinha do Norte concluíram uma maratona de negociações nesta segunda-feira (24/8) com um acordo sobre uma série de medidas para neutralizar uma crise que levou os dois países rivais à beira de um conflito armado.

As medidas, detalhadas em um comunicado conjunto, incluem o equivalente a um pedido de desculpas público extremamente raro da Coreia do Norte, que "expressou arrependimento" sobre a explosão de minas que, neste mês, mutilou dois soldados sul-coreanos da patrulha fronteiriça.

Em resposta, a Coreia do Sul concordou em suspender as transmissões por alto-falantes de propaganda para a Coreia do Norte que tinham sido retomadas após mais de uma década de pausa, em retaliação pela explosão das minas.

Os alto-falantes serão desligados ao meio-dia (meia-noite em Brasília) de terça-feira, na mesma hora em que Pyongyang suspenderá "um estado de semi-guerra", declarado na semana passada pelo líder Kim Jong-Un.

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Os dois países também concordaram em trabalhar no sentido de uma retomada no próximo mês das reuniões das famílias separadas pela Guerra das Coreias (1950-53) e da manutenção de conversas oficiais em Seul ou Pyongyang em data a ser decidida.

O acordo, que parece cobrir todas as principais áreas de contenção, veio após dias e noites de cansativas negociações que começaram na tarde de sábado na aldeia de fronteira de Panmunjom.

As conversas tentavam resolver um perigoso impasse militar, que provocou uma rara troca de tiros de artilharia ao longo da fronteira na semana passada, com os dois lados elevando a retórica militar e mobilizando armamentos.

Aumento das tensões

As tensões continuaram a se intensificar ao mesmo tempo em que as discussões aconteciam, com aviões da Coreia do Sul e dos Estados Unidos voando e simulando bombardeios, e a Coreia do Norte declaradamente mobilizando dois terços de sua frota de 70 submarinos e navios.

"Espero sinceramente que a partir de agora (dos dois lados) o acordo seja implementado e que seja construída a confiança pelo diálogo e cooperação, de modo que sejam construídos novos laços entre as Coreias que alcancem as expectativas do povo", declarou à imprensa o negociador sul-coreano e Conselheiro de Segurança Nacional, Kim Kwan-Jin.

Kim afirmou que as medidas do acordo não irão apenas segurar a atual crise, como fornecerá um "novo momento" para as relações internas das Coreias no futuro.

Os diálogos de Panmunjon entre Kim e seu contraparte norte-coreano Hwang Pyong-So - um próximo confidente do líder Kim Jong-Un - foram os de mais alto nível entre os dois países por quase um ano.

Houve certa surpresa sobre a natureza inequívoca de como Pyongyang expressou arrependimento sobre a explosão de minas - que muitos previam que seria o principal obstáculo para chegar a um acordo.

A Coreia do Norte repetidamente nega qualquer responsabilidade nas explosões, e desculpas por qualquer coisa - especialmente quando a Coreia do Sul está envolvida - não constam em seu vocabulário diplomático usual.

Um ;sincero pedido de desculpas;

"Acordos anteriores como estes entre as Coreias tendiam a ser extremamente ambíguos", afirmou Jeung Young-Tae, um analista no Instituto Coreano para Unificação Nacional em Seul.

"Mas no mundo da linguagem diplomática, este é um sincero pedido de desculpas, com o objeto do arrependimento - a explosão de minas que mutilou os soldados - claramente estabelecido", afirmou Jeung.

Nesta segunda-feira, a presidente sul-coreana, Park Geun-Hye, insistiu que Seul só iria desligar os alto-falantes de propaganda se Pyongyang apresentasse "desculpas claras" pelo incidente da explosão das minas.

Em comentários televisionados para uma reunião de assessores, uma Park combativa também prometeu "não retirar a propaganda" se acontecerem novas provocações norte-coreanas.

O acordo de segunda-feira deixou claro que a retirada da propaganda dos alto-falantes seria nula e sem efeito se "um caso anormal ocorrer" - uma aparente referência a futuras provocações.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, celebrou nesta segunda-feira o acordo alcançado entre Pyongyang e Seul.

"Comemoro a notícia de um acordo alcançado hoje entre a Coreia do Sul e a Coreia do Norte", declarou Ban em um comunicado.

Ele afirmou ainda que a perspectiva de que haja diálogos regulares entre os dois vizinhos "servirá como mecanismo para solucionar de maneira eficaz qualquer problema que possa surgir na península coreana".

Ban, que foi ministro das Relações Exteriores da Coreia do Sul entre 2004 e 2006, havia chamado as duas partes a frear a escalada das tensões.

Pediu maior cooperação em medidas humanitárias, como a reunião de famílias separadas, que segundo o acordo das duas partes buscarão melhorar, e afirmou que confia que as conversações sobre o desarmamento nuclear possam ser retomadas.

"Como secretário-geral estou pronto para apoiar a cooperação inter-coreana", completou Ban.

O acordo será bem-vindo pelos países vizinhos como China e Japão, que tinha visto o impasse na península coreana com crescente preocupação e que havia aconselhado os dois lados para mostrar calma e moderação.

Também será visto como um alívio pelos Estados Unidos, que têm aproximadamente 30.000 soldados americanos permanentemente instalados na Coreia do Sul e que repetem reiteradamente seu compromisso com a defesa de seu aliado-chave asiático.

Tecnicamente, as duas Coreias estão em guerra nos últimos 65 anos desde que a Guerra das Coreias (1950-53), que terminou com um cessar-fogo nunca ratificado com um acordo de paz formal.

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