Politica

Comissões Parlamentares Inúteis

Guilherme Goulart
postado em 27/09/2009 08:53
Relatórios finais das investigações dos últimos 15 anos no Congresso mostram que menos de 10% dos projetos de lei propostos foram aprovados

Oito comissões parlamentares de inquérito estão em funcionamento no Congresso Nacional. Outras quatro aguardam para serem instaladas. Apesar das negociações políticas e do tempo de investigação que elas requerem, o destino é sempre o mesmo: poucas mudanças legislativas. Levantamento feito pelo Correio nos relatórios finais revela que menos de 10% dos projetos de lei sugeridos foram aprovados. Das 38 propostas, apenas três viraram lei. Todas as outras ainda estão tramitando ou foram engavetadas. São projetos que disciplinariam a transferência de recursos, combateriam a corrupção na administração pública e o crime organizado, além de moralizar poderes e propor reformas estruturais.

Para o senador Demostenes Torres (DEM-GO), relator da CPI do Apagão Aéreo, o impacto(1) das comissões é muito maior fora do Congresso. ;Temos ações no Ministério Público Federal e na Polícia Federal. Agora com relação às lei que sugerimos, o governo como sempre atrapalha;, diz, referindo-se às propostas que tratam da utilização e exploração dos aeroportos, do fim de alguns impostos e a competência do Senado para destituir dirigentes da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que também teria de remeter a prestação de contas à Casa. O relatório sugeria diversas medidas para ampliar direitos dos passageiros em casos de overbooking, atrasos e cancelamentos de voo. ;A Aeronáutica entrou com um lobby porque quer que os impostos continuem sendo cobrados, mas só oneram os preços das passagens;, acusa.

Os quatro projetos foram remetidos à Câmara dos Deputados, onde acabaram engavetados. Nos aeroportos brasileiros, a situação melhorou. O índice de atrasos registrados pela Infraero na última sexta-feira foi de 4,2%, o que representa 28 dos 671 voos previstos. Já os cancelamentos atingiram 31, ou 4,6% do total. A segurança dos voos nem tanto. Um levantamento da Agência Nacional de Aviação Civil mostra que a taxa de mortes em acidentes aéreos no país é quatro vezes maior do que a média mundial.

Apesar do caos ter sido controlado, Demostenes acredita que um apagão ainda maior deverá ocorrer nos próximos anos por falta de investimentos e de infraestrutura no setor. ;Naquela época, a causa maior era realmente a indisciplina dos controladores.; O Ministério Público Federal em Brasília está apurando as denúncias encaminhadas pelo Senado, assim como a Polícia Federal, que iria fazer uma operação há cerca de duas semanas em empreiteiras. As informações vazaram antes dos mandados de busca e apreensão serem cumpridos.

Orçamento
Poucas mudanças também na CPI das Ambulâncias, que identificou fraudes na destinação de emendas para a saúde. Dos quatro projetos de lei sugeridos, nenhum foi aprovado. Todos tramitam no Congresso a passos lentos.

O mais grave é que nesse caso as irregularidades identificadas eram recorrentes desde a primeira comissão que tratava de orçamento. A mais famosa ; dos anões do Orçamento em 1993 ; recomendava, entre outras coisas, regras para a abertura de créditos suplementares, limites para emendas e a obrigatoriedade de aplicação de recursos em continuidade de obras.

O relatório também tentava moralizar questões polêmicas, como a imunidade parlamentar e a abolição do sigilo bancário e fiscal para agentes políticos. O relator Roberto Magalhães (então PFL de Pernambuco) sugeria ainda a extinção da Comissão Mista de Orçamento e que a proposta fosse elaborada ao mesmo tempo pelo Executivo e Legislativo.

;O problema é cíclico. Tivemos os anões, depois outras tantas. São questões que não conseguiram ser solucionadas;, ressalta o relator da CPI das Ambulâncias, Antônio Biscaia (PT-RJ), prevendo que enquanto uma nova forma não for definida a população ainda deve assistir a outros escândalos envolvendo o tema.

;Apesar de termos sugerido instrumentos de moralização, ainda não há lisura. O assunto precisa ser discutido e aprimorado para evitar novos desvios de conduta;, afirma Biscaia, que defendeu no relatório o orçamento impositivo, ao contrário do autorizado, o praticado atualmente. O relatório apontou envolvimento de 72 parlamentares. Grande parte está sendo processada pela Justiça de Mato Grosso. (Colaborou Denise Rothenburg)

Perda de força

No início dos anos 1990, as CPIs eram fortes instrumentos de investigação, a ponto de coletar informações capazes de levar ao pedido de impeachment e a cassação do mandato de 18 parlamentares ; respectivamente, a CPI do caso PC Farias e a dos Anões. Mas, aos poucos, os acusados descobriram que CPIs poderiam ser contidas. Em 1999, por exemplo, a dos Bancos se viu às voltas com liminares para impedir quebra de sigilos e depoimentos. Por ironia, o banqueiro Salvatore Cacciola, personagem do escândalo, é um dos poucos condenados por gestão fraudulenta. Cacciola pode até estar preso, mas, de lá pra cá, as CPIs nunca mais foram as mesmas.

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