Politica

O lixo que desafia um país: uma lei para não ser cumprida

Dilatação do prazo para o fim dos lixões ressalta a incapacidade de municípios, estados, União e empresas darem destino adequado aos resíduos sólidos. A conta dessa fatura, que sempre resulta em poluição, é paga pela população

Warner Bento Filho
postado em 07/07/2015 12:16
Lixão da Estrutural: prorrogação de prazo para o fim dos lixões está na CâmaraA prorrogação do prazo para os municípios fecharem os lixões empurra para o futuro ; sem nenhuma garantia de êxito ; a solução para o maior problema ambiental brasileiro. E expõe a incapacidade de o poder público e de as empresas lidarem com o assunto. A proposta de dilatação dos prazos foi aprovada pelo Senado na semana passada, mas ainda será analisada pela Câmara dos Deputados. A tendência, porém, é de que não haja obstáculos, já que, de acordo com levantamento da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), nenhum dos 5.565 municípios brasileiros cumpriu a lei na totalidade.

Se aprovada, a iniciativa significará, ainda, um retrocesso em relação à legislação ambiental e à própria Constituição Federal, que estabelece que ;todos têm direito a um meio ambiente equilibrado;, cabendo ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e as futuras gerações.

;Do ponto de vista teórico, a questão dos resíduos sólidos faz parte da política ambiental brasileira desde 1981, quando se estabeleceu que poluição gerada é crime ambiental;, argumenta a diretora de Meio Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente, Zilda Veloso.

[SAIBAMAIS]Da mesma forma, a Lei de Crimes Ambientais, de 1998, prevê prisão de até 4 anos a quem ;causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora;. Se o crime ;ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos;, a pena sobe para até 5 anos.

;A iniciativa do Senado não significa que dispor resíduos em lixões deixará de ser crime ambiental;, avalia Ronei Alves da Silva, líder do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR). ;Para que isso ocorresse, seria necessário revogar a Política Nacional de Meio Ambiente e a Lei de Crimes Ambientais;, diz.

A proposta de prorrogação dos prazos é o ápice de uma crise que se abriu com a edição da Lei n; 12.350, de agosto de 2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), estabelecendo prazo até 2012 para a implementação da coleta seletiva, e até 2014 para o fechamento dos lixões em todo o país.

A alteração nos prazos era defendida pela CNM. ;A lei (de resíduos sólidos) é totalmente desconectada da realidade social e geográfica dos municípios brasileiros. Obriga todos a terem coleta seletiva, quando há cidades que não têm catadores e onde a reciclagem não tem viabilidade econômica;, afirma Cláudia Lins Lima, técnica em Saneamento e Meio Ambiente da CNM.

Prazos escalonados
Uma emenda apresentada durante a votação em plenário estabelece prazos diferenciados para o fim dos lixões. Segundo o texto, as capitais e os municípios de regiões metropolitanas terão até 31 de julho de 2018. Já as cidades de fronteira e as com mais de 100 mil habitantes contarão com um ano a mais para implementar os aterros sanitários. Para aquelas que têm entre 50 mil e 100 mil habitantes, a data limite é 31 de julho de 2020. Os municípios com menos de 50 mil habitantes terão prazo até 31 de julho de 2021.

Desafio nacional
Confira a gestão de resíduos nas cidades brasileiras

Municípios com lixão ou aterro controlado
50,6%

Municípios com aterro sanitário
48,3%

Coleta seletiva
49,1%

Plano de gestão de resíduos concluído
36,3%

Fonte: Confederação Nacional dos Municípios

;A lei (de resíduos sólidos) é totalmente desconectada da realidade social e geográfica dos municípios brasileiros. Obriga todos a terem coleta seletiva, quando há cidades que não têm catadores e onde a reciclagem não tem viabilidade econômica;
Cláudia Lins Lima, técnica em Saneamento e Meio Ambiente da CNM

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