Politica

Disque-Denúncia recebeu 17 ligações que podem ajudar no caso de Marielle

A polícia não descartada a participação de milícias no assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson

Renato Souza
postado em 17/03/2018 08:00
Última imagem de Marielle antes de entrar no carro, logo após de sair de um evento na Lapa: trajeto fatal

As balas utilizadas no assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes tinham sido roubadas de uma agência dos Correios na Paraíba. O exame de balística, realizado pela Delegacia de Homicídios do Rio de Janeiro, revelou que a munição encontrada no local do homicídio faz parte do lote UZZ-18, que foi vendido para a Polícia Federal em Brasília, em dezembro de 2006. Cápsulas deste mesmo lote também foram encontradas após a maior chacina de São Paulo, que deixou 18 mortos em 2015.

A investigação usou os números de série dos projéteis que foram recolhidos no local do crime para descobrir a origem. O ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, afirmou que recebeu a informação de que a munição foi roubada após saber o número do lote. ;Essa munição foi roubada na sede dos Correios, pela informação que eu tenho, anos atrás, na Paraíba. E a Polícia Federal já abriu mais de 50 inquéritos por conta da munição desviada. Eu acredito que essas cápsulas que foram encontradas na cena do crime, este bárbaro crime, foram efetivamente roubadas;, afirmou o ministro.

A PF comprou a munição da Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC). Esse mesmo lote abasteceu os autores da chacina que ocorreu nas cidades de Osasco e Barueri, em 13 de agosto de 2015. Após a matança, a Corregedoria da Polícia Militar de São Paulo abriu investigação por conta de suspeitas de que PMs estariam envolvidos com a mortes provocadas em oito ataques que ocorreram na mesma noite. Na ocasião, a CBC informou para a corporação que as balas do lote UZZ-18 tinham sido repassadas para a PF.

Câmeras

Meses depois, foi confirmado que PMs realizaram os ataques. Há duas semanas, o policial Victor Cristilder Silva dos Santos, de 32 anos, foi condenado a 119 anos, 4 meses e 4 dias de prisão pelo júri popular no Fórum Criminal de Osasco, por ter participado da morte de 17 pessoas. Outros dois policiais e um guarda civil também acabaram responsabilizados pelos homicídios. Jungmann afirmou que a ligação com a chacina está sendo apurada pela PF.

A investigação realizada até agora indica que o carro de Marielle foi seguido por pelo menos dois veículos. Um deles é um Cobalt, que estava estacionado em frente à Casa das Pretas, na Lapa. Um homem saiu do automóvel por um momento, falou ao celular e voltou. A ação acabou registrada por câmeras de segurança. Quando o veículo da vereadora saiu do local, o Cobalt começou a segui-lo e piscou os faróis no começo do trajeto. Os tiros foram disparados após quatro quilômetros. Em depoimento à polícia, a assessora Fernanda Chaves, que estava no veículo, contou que ela não percebeu que eles estavam sendo perseguidos.

De acordo com Fernanda, Marielle disse um ;ué; poucos segundos antes de ser atingida. O motorista gritou apenas ;ai; quando os disparos começaram. Ela disse que se abaixou, sem olhar pelas janelas e a vereadora caiu em cima dela, já sem vida. Cinco pessoas prestaram depoimentos até agora. O Disque-Denúncia recebeu 17 ligações com pistas que podem colaborar com a investigação. Em nota conjunta, a Polícia Civil do Rio e a Polícia Federal informaram que estão apurando a origem da munição. A principal hipótese para o crime é a de execução. Não é descartada a participação de milícias.


Comunidades

Enquanto o Estado brasileiro cria estratégias para neutralizar o tráfico de drogas, apreender armas e munições, grupos organizados formados por policiais militares, bombeiros e até delegados usam recursos públicos para dominar comunidades inteiras na periferia do Rio de Janeiro. As milícias mantêm o controle de 2 milhões de cariocas. Especialistas alertam que já existem alianças com facções criminosas, para ampliar a área de atuação.

Milicianos estão fazendo acordos com traficantes em comunidades como a Rocinha. O professor Ignácio Cano, especialista em segurança pública e integrante do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), afirma que esses grupos assumem regiões que eram controladas pelo tráfico. ;Formada por policiais, bombeiros e agentes penitenciários, na ativa ou aposentados, eles ocupam comunidades inteiras e passam a comandar o tráfico de drogas. Ainda exploram serviços como gás, TV e internet e praticam extorsão contra os moradores. A prática de usar armas e munições do Estado para manter o poder é corriqueira;, afirmou.

O que se sabe até agora

; Pelo menos dois carros seguiram o veículo em que estava Marielle, Anderson e a assessora de imprensa

; Um dos veículos é um Cobalt, com placa clonada de Nova Iguaçu (RJ). Ao sair atrás do carro da vereadora, o motorista piscou os faróis

; Na Rua Joaquim Palhares, o atirador disparou 13 vezes, sendo que quatro balas atingiram a cabeça da vereadora e três acertaram Anderson

; As armas usadas no crime são de calibre 9mm, de uso exclusivo das forças de segurança

; As munições são do lote UZZ-18, que foi comprado pela Polícia Federal em Brasília, em 2006. Uma sindicância foi aberta para investigar o destino da munição

; Cápsulas de balas deste mesmo lote foram encontradas após a chacina que deixou 18 mortos nas cidades de Osasco e Barueri, em São Paulo, em 2015

; Câmeras de segurança, na saída do evento em que Marielle estava na Lapa, flagraram um suspeito conversando ao celular, pouco antes de entrar no carro

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação