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Carga tributária aumentou 10 pontos percentuais após criação do real

Para equilibrar as contas públicas, o governo federal criou e aumentou tributos nos anos seguintes à criação do real

postado em 04/07/2014 08:54
A estabilidade da moeda trouxe custos para o contribuinte. Necessário para derrubar a inflação, o ajuste fiscal resultou em aumento de impostos. De acordo com a Receita Federal, a carga tributária ; peso dos tributos sobre a economia ; saltou mais de dez pontos percentuais depois do Plano Real. De 25,72% do Produto Interno Bruto (PIB) em 1993, ano anterior ao plano, o indicador subiu para 35,85% em 2012, dado mais recente.

Para equilibrar as contas públicas, o governo federal criou e aumentou tributos nos anos seguintes à criação do real. O destaque foram as contribuições sociais, cujas receitas ficam todas com a União. As principais são a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (Cofins), o PIS, o Pasep e a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que taxou as transações financeiras até 2007. A voracidade sobre os contribuintes, no entanto, destacam especialistas, puniu as camadas mais pobres da população e não resultou em melhoria de serviços públicos.

Presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), João Eloi Olenike diz que o real acentuou uma tendência iniciada com a Constituição de 1988, que permitiu aos governos (federal, estadual e municipal) obter cada vez mais recursos por meio do aumento de tributos. Para ele, o maior problema é que a tributação, no Brasil, concentra-se no consumo e nos salários.

Com caráter regressivo, a tributação sobre o consumo pune os mais pobres porque as alíquotas incidem sobre o preço final dos produtos. Para uma mercadoria que custa R$ 5 e tem alíquota de 20%, o consumidor pagará R$ 1 de tributo, independentemente da classe social. Proporcionalmente, a quantia pesa mais no bolso dos mais pobres. Com desconto direto na folha de pagamento, a tributação sobre os salários taxa os trabalhadores, não os empresários.

;Hoje, no Brasil, não temos uma política tributária para que haja uma arrecadação de acordo com a capacidade contributiva de cada cidadão. Existe, sim, uma política de arrecadação tributária. Aquela do quanto mais eu arrecadar, melhor;, critica Olenike. Ele defende uma reforma tributária executada em etapas que mude o foco da tributação para o lucro e o patrimônio, que têm maior impacto sobre as parcelas mais ricas da população. ;Hoje não existe interesse em fazer reforma tributária. Se cada vez se arrecada mais, por que fazer reforma tributária?;, questiona.

Em 2012, os tributos sobre o consumo e os salários corresponderam a 76,26% da arrecadação, segundo a Receita Federal. Nos países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), grupo que reúne nações desenvolvidas, a média correspondia a 58,35% em 2011. A tributação sobre a renda e o patrimônio somava 21,69% da arrecadação no Brasil, contra 38,27% da OCDE.

Para Cláudio Damasceno, presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco Nacional), as distorções no sistema tributário brasileiro persistem porque, até hoje, o grande capital define os rumos da política tributária. ;Temos uma carga de primeiro mundo e retorno de terceiro mundo nos serviços que o governo acaba oferecendo à população. Desde a criação do real, pouco mudou;, comenta.



Damasceno cita a defasagem de 61% na correção da tabela do Imposto de Renda e a isenção na distribuição de lucros e dividendos para sócios e acionistas como medidas que pioraram o sistema tributário brasileiro para a população de menor renda nos últimos 20 anos. ;Nos países desenvolvidos, a tributação sobre o patrimônio é muito maior. Essa discrepância tem raízes profundas;, diz.

Apesar do aumento da carga tributária nas últimas duas décadas, a Receita Federal não considera o peso dos impostos sobre a economia alto em relação a outros países. Segundo o órgão, o Brasil está numa posição intermediária na comparação com os 27 países da OCDE. Além disso, a Receita informa que alguns países como o Chile, cuja carga tributária soma 21,8% do PIB, não tem Previdência Social.

A Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda alega que a carga tributária líquida, que desconta dos tributos arrecadados o retorno à sociedade por meio de subsídios e das transferências de renda, ficou praticamente estável nos últimos anos, passando de 18,39% em 2002 (dado mais antigo disponível) para 19,82% em 2012. Segundo a secretaria, a carga tributária líquida é mais importante que a carga bruta porque considera as devoluções do governo, que aumentam a renda disponível do setor privado e o bem-estar das famílias.

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