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Eles não usam black tie

Quem disse que moda não é assunto de homem? Blogs escritos por jovens antenados dão dicas e ajudam rapazes de todo o mundo a se vestir com muito estilo

postado em 28/10/2010 12:24

Inevitável não reparar: em qualquer shopping ou comércio de rua, é comum ver o interesse das mulheres pelas vitrines das lojas de roupas, sapatos e acessórios. Ao lado delas, um homem segura a bolsa e faz cara de tédio. Essa cena, porém, está mudando. Não que os caras compartilhem o mesmo interesse da mulher pela moda. Só que, neste início do século 21, estão mostrando mais atenção às vestimentas e apostando em ousadia. Eles também querem que cada peça de roupa os torne mais atraentes e decifre sua identidade na multidão.

Por meio de sites e blogs voltados ao público masculino, jovens rapazes também querem falar sobre moda e como brincar com o estilo. O filipino M;c Kenneth Licon, 21 anos, por exemplo, mora em Vancouver (Canadá) e escreve no blog Little Fashionisto () há dois anos. Repleto de referências, grifes e editoriais, o blogueiro ainda esbanja um visual pra lá de inusitado. M;c Kenneth defende o lema: "Você pode ser quem você quiser e não deixar ninguém impor barreiras ao seu estilo". Para ele, moda é outra forma de individualidade, e os homens também gostam de investir nesse aspecto. "Estar bem vestido nos faz bem", afirma. Outro blogueiro, do site The Sartorialist, dá atenção a diferentes estilos da indumentária masculina, apesar de também mostrar imagens de belas e estilosas mulheres.

A influência da internet, importante marco para compreender esse período da moda, é levado em consideração por estudiosos e profissionais da área. "Pelos blogs, podemos entender a moda contemporânea. No entanto, esses são novos olhares que não necessariamente serão traduzidos em grandes meios. Não significa que os homens vão abraçar todas essas ideias. Isso seria um grande passo", conclui o coordenador do curso de design de moda do Iesb, Marco Antônio Vieira. Talvez pela iniciativa de brasileiros como Guilherme Cury e Fábio Allves do site Moda para Homens, de Douglas Archanjo, criador do blog Bar Metrossexual, sem falar nos estrangeiros "curiosos", como o espanhol Juan Cocco, o holândes Jean Pierre, o filipino M;c Kenneth e o britânico Charles Matthew, os homens já deram, pelo menos, o primeiro passo rumo à ousadia.

Vaidade histórica
Se voltarmos nosso olhar para história da humanidade, veremos que no começo eles se mostravam mais vaidosos que as mulheres. Na Roma Antiga, os homens eram mais paramentados, enquanto na Idade Média, tanto eles quanto elas compartilhavam o interesse por perucas e por maquiagens. "Somente depois da Revolução Francesa, por uma necessidade de austeridade maior, os homens começam a adotar a alfaiataria", explica Marco Antônio Vieira.

Segundo o professor, o interesse masculino por novas peças e cortes, no entanto, parece ter congelado no tempo. "Tanto que boa parte do que se vê hoje nas passarelas é um resgate do espírito dândi." Mesmo quando observamos que a moda teve vários momentos no século 20, caso dos anos 1960. Nesse período, "o homem deixou de usar o costume e a gravata para aderir às modernidades vigentes em jaquetas com zíper, golas altas, tecidos sintéticos, botas, calças mais estreitas, além de camisas coloridas ou estampadas", descreveu o historiador João Braga em História da moda: uma narrativa (Ed. Anhembi Morumbi).

Irreverência espanhola
Morando na Islândia, o espanhol Juan Cocco mostra que frio e cores também tem tudo a ver"Devemos aprender a dizer não às coisas que não caem bem na gente", aconselha o espanhol Juan Cocco, 20 anos. Observador, o estudante de direito percebe que muitos fazem um esforço tremendo para seguir tendências. Para ele, a única coisa que as vestimentas dessas pessoas expressam é: "Minha personalidade muda a cada seis meses". Esse não é o caso de Juan. Ele prefere acreditar que moda é uma forma de mostrar, todos os dias, como está seu humor. "Posso estar me sentindo bonito, rebelde, inconformado; Acho que estilo é algo de dentro para fora."

Há dois anos, ele publica no site fotografias do seu estilo, além de imagens do país onde mora: Islândia. A terra fria da cantora Bjork mudou a forma como o estudante se vestia. "Ao contrário do que pensamos sobre países nórdicos ; de que são frios e cinzentos ;, aqui é cheio de cores. Talvez seja por isso que, ultimamente, também uso roupas coloridas", constatou. No guarda-roupa, recordações de amigos, de familiares e momentos especiais ganham a forma de casacos, blusas e calças que preenchem as gavetas. Fã de grifes como Timo Weiland, Acne, Patrick Ervell e Comme des Garçons, ele não acredita que a masculinidade seja incompatível com o gosto pela moda. "Acho que os homens sempre tiveram interesse pelo assunto, mas agora é muito mais fácil assumir em voz alta."

Eles também podem

O blogueiro e futuro designer holandês Pieter Jan tem se dedicado à criação de bolsasCharles Matthew, 23 anos, não dispensa uma boa bisbilhotada no que anda rolando nas passarelas e nas ruas e que pode virar tendência. Há um ano e meio, o estudante britânico de jornalismo começou a escrever no encorajado por uma amiga também blogueira. Apesar do jornalismo ser a carreira que Charles escolheu, a moda dá o que ele chama de "brilho" ao texto que redige. "Acho as roupas tão fascinantes; A forma como elas transformam, ilustram e abraçam a personalidade das pessoas. Elas são relevantes para mim. Acredito que a moda pode expressar coisas que a fala não pode", filosofa. Para o estudante, o interesse por esse cenário já ganhou muitos rótulos. Um deles, inclusive, presumia que os homens envolvidos no meio ou interessados por ele eram pouco convencionais. "Mas para acabar com essa ideia, todos nós precisamos de roupas. Então, quem disse que não podemos ter interesse por elas?", questiona. Charles ainda acredita que esse interesse masculino também se reflete nas passarelas em coleções andrógenas. "Quer dizer, ambos, garotos e garotas, podem se identificar com o design que está sendo proposto e se inspirar." Sobre a moda brasileira, o estudante adora a riqueza das cores. Admirador incondicional da conterrânea Vivianne Westwood, Charles também adota o estilo grunge de justaposições. Confiante, mostra em atitude e roupas a irreverência londrina.

Fome de arte e de moda
O britânico Charles Matthew é fascinado por moda: %u201CQuem disse que não podemos ter interesse por roupas?%u201DO holandês Pieter Jan Boterhoek, de apenas 19 anos, já sabe que caminho trilhar. Estudante de design gráfico em Amsterdã, ele arrisca comentários sobre moda no blog que assina como Jean Pierre desde 2009. Em , mostra estilo, fotografias e trabalhos gráficos. Assim que se graduar, daqui a dois anos, pretende estudar moda. "O blog é uma ótima plataforma individual para chamar a atenção do público para seu trabalho", defende. Para Pieter Jan, ou melhor, Jean Pierre, é inegável a influência das artes sobre o mundo fashion. "As artes elevam a moda a outro patamar, enquanto a moda leva a arte para o público", justifica. Recentemente, o estudante vem criando bolsas. "São desenhos meus, sem referências como inspiração." Jean Pierre também acredita que a escolha da roupa que vai usar no dia pode dizer muito sobre seu humor. Sneakers, skinny jeans, suéter e um ou outro blazer mais chique dão um tom casual ao armário do estudante. "Para mim, a forma como me visto mostra minha personalidade e o que penso sobre design e roupas. Sou um indivíduo e quero sobressair. Todos deveriam fazer o mesmo."


Em terras tupiniquins
Os brasileiros Fábio Allves e Guilherme Cury estão à frente do blog Moda para homensCom a missão de "orientar os membros do sexo masculino, independentemente da sua orientação sexual, a deliciosa arte de se vestir", o blog Moda para homens (MPH) vem cativando internautas. A página criada pelo publicitário Guilherme Cury, 23 anos, há apenas um ano, é atualizada diariamente com notícias sobre roupas, acessórios, música e diversos apêndices relacionados a esses assuntos.

Guilherme acredita que a proliferação de blogs de moda escritos por homens e voltados para eles responde a uma demanda de rapazes preocupados com o assunto. "Os homens estão deixando o ;machismo; de lado e vendo que as mulheres estão procurando rapazes que não só cuidem do corpo, mas também do estilo", acredita. Amparado pelo lema "homem também ter que ter estilo", o publicitário comemora o interesse de brasileiros, de europeus e até de japoneses que acessam o blog.

Escrito por uma equipe de 11 pessoas ; entre garotos e garotas na faixa dos 20 e poucos anos ;, o Moda para Homens comemora a marca de 20 mil acessos diários. Coordenador de conteúdo do site, o publicitário Fábio Allves, 24, acredita que se deve ter o básico no guarda-roupa e investir em peças diferentes para compor o visual. "Sou uma mistura de nerd com rock, e clássico com alternativo. Tento misturar essas referências, mas compro sempre o necessário", conta. Ele também observa que hoje existem marcas para todos os gostos. Zara, Reserva e Alexandre Herchcovitch compõem a lista de favoritas do colaborador. "O MPH surgiu com essa ideia de ajudar os homens a se sentirem mais confiantes nas escolhas e com muito estilo; sempre."

Moderno e minimalista
"O homem está cada vez menos preocupado com o que vão dizer ou falar sobre ele e, por isso, busca dicas e informações sobre o mundo da moda." Essa é a percepção do editor e criador do site Bar Metrossexual (), Douglas Archanjo, 21 anos. Apesar de estar despreocupado com o que os outros vão pensar sobre o seu estilo, ele acredita que o tipo de roupa que vestimos é nosso "cartão de visita". Para atender ao interesse de caras que gostam de se vestir bem, o site traz novidades de coleções, tendências, além de dicas de como combinar peças. As grifes nacionais Colcci, Reserva e o trabalho do estilista Mario Queiroz são destaques para esse consumidor que se diz minimalista. No armário, destaca a redução de sapatos para três pares de chuteiras, outros quatro de tênis e dois de sapatênis. "Costumo deixar as roupas no cesto e tiro para passar na hora", brinca. Avesso a preconceitos, Douglas defende um interesse democrático sobre o assunto. "Com o tempo, a coisa foi mudando e muitos heterossexuais, como eu, se interessaram por moda. Poucos chegam ao ponto de acompanhar desfiles, mas tentam, à sua maneira, estar informados."

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