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Divisor de águas

Com a conferência da ONU, as areias cariocas voltaram a ser palco do acalorado debate sobre o mundo sustentável. Preparamos este pequeno guia para que os leitores não percam de vista os temas mais relevantes

postado em 02/12/2012 08:00

Com a conferência da ONU, as areias cariocas voltaram a ser palco do acalorado debate sobre o mundo sustentável. Preparamos este pequeno guia para que os leitores não percam de vista os temas mais relevantes

Neste ano, os olhos do mundo se voltaram para a mais importante conferência ambiental da Organização das Nações Unidas (ONU): a Rio%2b20. De 13 a 22 de junho, o Rio de Janeiro abraçou exposições, debates e propostas para um planeta sustentável e uma economia verde. Discussões ; algumas mais acirradas que outras ;, conduzidas por mais de 100 chefes de Estado e por, aproximadamente, 10 mil entidades do terceiro setor. Passados quatro meses da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, que fatos continuam merecendo a nossa atenção? Para destacar ações e compromissos que marcaram o evento, a Revista consultou pesquisadores e ambientalistas. Entre alguns pontos levantados estão a crescente participação da sociedade civil, a economia verde e a esperança de mudanças cunhadas pela juventude.

O papel da sociedade civil

De duas décadas para cá, as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs) se tornaram o principal veículo de ativistas ambientais. Só no Brasil, estima-se que haja 500 mil OSCIPs em atividade, segundo levantamento feito pelo Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife), ela própria uma OSCIP. Por isso, não era de se estranhar a massiva participação da sociedade civil na Rio%2b20. Maior conferência da ONU, com ampla participação de líderes do governo, empresários e, claro, sociedade civil, o evento ouviu o que o terceiro setor da economia, sem cetro ou coroa, tinha para discutir. "A forte presença da sociedade civil foi um aspecto importante da Rio%2b20, embora isso não seja mais uma surpresa. A sociedade civil está mais avançada que os governos. Tanto na consciência dos problemas e na mobilização, quanto em termos de propostas. Se olharmos a conferência com um escopo mais amplo, nota-se que ela produz esse tipo de troca de ideias. Estamos vivendo esse clima: a sociedade civil fala o que é preciso fazer em prol do meio ambiente, enquanto o governo leva tempo para colocar em prática soluções", reflete o sociólogo e cientista político Sérgio Abranches.
Com a conferência da ONU, as areias cariocas voltaram a ser palco do acalorado debate sobre o mundo sustentável. Preparamos este pequeno guia para que os leitores não percam de vista os temas mais relevantes

A onda dos negócios verdes

Os temas economia e emprego verdes ganharam holofotes nas mesas de discussões da Rio%2b20. A ideia de promover um desenvolvimento econômico e sustentável pode ser a resposta para tirar milhões de pessoas da linha de pobreza. Segundo o relatório Construindo uma economia verde para todos, da Parceria Pobreza e Ambiente (PEP), a transição para uma economia verde pode mudar o orçamento de 1,3 bilhão de pessoas que ganham menos de dois dólares por dia.

Para discutir essa alternativa, o Sebrae participou da conferência com o objetivo de inserir o tema na agenda das micro e pequenas empresas. "Apresentamos o que podemos oferecer às empresas de modo que elas se adequem à necessidade de sustentabilidade como competitividade. A geração de negócios verdes, a apresentação de tecnologias limpas, enfim, oferecer às empresas produtos técnicos e tecnológicos bem como despertar novos modelos de gestão", disse Gláucia Zoldan, analista de Inovação e Tecnologia do Sebrae Nacional.

Enquanto na Cúpula Mundial Green Jobs, coordenada pela Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), o conceito de emprego verde estava em pauta. Segundo a presidente da ABRH nacional, Leyla Nascimento, a preocupação com o impacto ambiental deve ser incluída em todas as carreiras. A analista Gláucia Zoldan explica. "A preocupação em torno do green job é que, por meio de processos inteligentes, tecnologias limpas e eficácia em gestão, se consiga reduzir o consumo de energia, de materiais e de água; descarbonizar a economia e minimizar ou evitar a geração de todas as formas de lixo e poluição. Tudo isso sem perder o foco na geração de negócios."

Jovens pela sustentabilidade

Com a conferência da ONU, as areias cariocas voltaram a ser palco do acalorado debate sobre o mundo sustentável. Preparamos este pequeno guia para que os leitores não percam de vista os temas mais relevantes
Os jovens e as crianças mantiveram um papel importante na Rio%2b20. Porta-vozes de uma geração cada vez mais comprometida com a natureza, eles foram destaque no evento e reivindicaram mudanças imediatas. Escolhida no concurso internacional Encontro com a História, a neozelandesa Brittany Trilford, 17 anos, representou a juventude na conferência internacional promovida pela Organização das Nações Unidas. Para convencer o júri, Brittany enviou um vídeo de três minutos intitulado O futuro que eu quero.

No discurso na Rio%2b20, a jovem bela e loira disse: "Meu nome é Brittany, tenho 17 anos e sou uma criança. Hoje, neste momento, sou todas as crianças, suas 3 bilhões de crianças. Pensem em mim como metade do mundo", disse a jovem para os chefes de Estado.

Brittany é a sucessora de outra menina que foi destaque na Eco-92. Na época, a canadense Severn Suzuki tinha 12 anos e discursou para os principais chefes de Estado. Duas décadas depois, a agora bióloga (formada em Yale) e mãe de dois filhos fez questão de participar da Rio%2b20. Vista, com frequência, pelos corredores, Severn chegou a dar o seguinte conselho a Brittany: "Não tenha medo de dizer a verdade para o mundo. Lembre-se de que você está representando aqueles que não são ouvidos."

Para a bióloga Nurit Bensusan, que esteve no encontro para divulgar um trabalho sobre meio ambiente dedicado às crianças, a presença de Severn e de Brittany foi emblemática. "Essa jovem geração será de tomadores de decisão no futuro. As crianças têm uma empatia com a natureza que os adultos estão perdendo. O adulto só começa a achar que aquele impacto ambiental é ruim quando aquilo afeta a vida privada dele. Quando alguma comida que ele gosta fica mais cara ou quando ele precisa racionar água, por exemplo. Já a criança não tem essa postura. Conseguir que a juventude conserve isso na vida adulta é uma chance de fazer a diferença. Aí, sim, teremos mais gente pensando no bem-estar coletivo", aposta.

O futuro que queremos

O tão aguardado documento final da Rio%2b20, O futuro que queremos, recebeu vaias e aplausos. Considerado pouco ambicioso, o texto assinado por representantes dos 188 países participantes da Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável levantou pontos como erradicação da pobreza, economia verde, energia, gestão da água, entre outros.

Coordenador do programa Mudanças Climáticas e Energia da ONG WWF-Brasil, Carlos Rittl não viu com bons olhos a carta. "Não chegamos a resultados concretos. Não se decidiu, por exemplo, sobre quais temas estabeleceremos objetivos de desenvolvimento sustentável no país. Sobre segurança alimentar e consumo, o que tivemos foi uma agenda de negociação para que, ao longo dos anos, consigamos definir metas. Pensando nos países mais pobres, que lutam por recursos mínimos e que dependem de ajuda internacional, saímos sem saber de onde virão os investimentos. É claro que seria muito difícil chegar a uma conclusão sobre todos os problemas, mas foram todos muito cautelosos. Esperávamos uma liderança, inclusive do Brasil. Saímos da Rio%2b20 da mesma forma como entramos."

O jeito, segundo os especialistas, é esperar que as intenções do documento final da Rio%2b20 se concretizem em 2015. Ano em que a Organização das Nações Unidas (ONU) estabelecerá os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) para o planeta.

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