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Para o alto e avante

Há pelo menos três décadas, nossas crianças estão mais altas que os pais e avós. Para especialistas, a melhoria da qualidade de vida tem ajudado o brasileiro a desenvolver o seu potencial genético, que está a caminho de atingir o topo

Flávia Duarte
postado em 20/01/2013 08:00
Precoce. O predicado já se tornou chavão nas conversas entre os pais que querem definir o comportamento e o desenvolvimento de seus rebentos. É que, atualmente, entre a garotada, está tudo mais rápido, e toda ação parece ser praticada no superlativo. Eles estão mais inteligentes, se interessam por assuntos de adultos cada vez mais cedo e também crescem de maneira acelerada. Sim, as crianças estão mais altas nessa realidade em que tudo é mais veloz. Os pais podem até se assustar com a ideia de ter filhos que, com pouco mais de uma década de vida, já alcançaram a estatura deles próprios, mas a maioria torce por vê-los altos e fortes.

Empiricamente, comprova-se em casa que as novas gerações estão ultrapassando os pais e os avós na curva do crescimento. Mas, de fato, as crianças de hoje estão mais altas? Sim. A tendência é seguir essa ascensão. Segundo o pediatra Durval Damiani, membro do Departamento Científico de Endocrinologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), constata-se que o perfil do crescimento do brasileiro registrou um incremento, nas últimas três décadas. Isso quer dizer que a garotada está mais altas que os pais, que já estavam mais altos que os pais deles. Somos um país em plena fase de crescimento.

A diferença de medidas, explica o médico, é resultado da melhora da qualidade de vida da população. Uma dieta mais rica, a erradicação de doenças por meio de vacinas e o saneamento básico permitiram que as crianças se desenvolvessem mais. Além disso, o médico lembra que a miscigenação possibilitou a mistura de diferentes raças, de diversos padrões genéticos de altura. O resultado é uma geração de crianças longilíneas, que atinge o topo da estatura. "Quando atingirmos nosso padrão genético de altura, iremos parar de crescer." Isso quer dizer que, quando as crianças brasileiras chegarem ao ponto máximo da curva do crescimento, estipulado pelos genes, não haverá mais grandes variações de estatura nas gerações seguintes.

"Em todas as populações, há um tempo em que as médias de estatura se estabilizam. Então, diz-se que a população alcançou seu ponto médio (pico) de estatura", explica o doutor em ciência do esporte Adroaldo Gaya, coordenador do Projeto Esporte Brasil, um estudo inédito que, desde 2005, analisa os indicadores de crescimento corporal, de estado nutricional e de aptidão física relacionados à saúde de crianças e jovens brasileiros entre 6 e 17 anos.

Pelos dados desse projeto, porém, nossos pequenos estão em fase de crescimento e alcançando uma média de altura antes registrada apenas em países desenvolvidos. "A estabilização ainda não ocorreu nos adolescentes e jovens brasileiros, o que significa que, provavelmente, nossa população ainda terá uma média maior de estatura." Adroaldo ainda acrescenta que, até os 15 anos, os brasileiros têm uma altura média maior que a dos americanos, segundo referências adotadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

A tendência secular de crescimento dos brasileiros é algo estudado há tempos. Não há oficialmente um tamanho padrão, definido por idade, que identifique a média de altura da população no Brasil, mas há pesquisas isoladas que apontam que o rumo é mesmo subir alguns centímetros a cada década. Os últimos dados do Ministério da Saúde são do estudo Saúde Brasil 2008, que comparou o resultado de cinco questionários domiciliares sobre a estatura e o índice de massa corporal (IMC), realizados entre 1974 e 2007. O resultado mostrou que, nesse período, o deficit de altura, um dos principais sinais da desnutrição infantil, reduziu cerca de 85% em meninas menores de 5 anos, e 75%, nos meninos. A interpretação dos números aponta que nossa garotada se aproxima do padrão internacional estabelecido pela OMS para definir o peso e a altura de crianças sadias.

O mesmo estudo concluiu que nossos adolescentes estão mais crescidinhos. Entre os brasileiros de 10 a 19 anos, a diminuição desse deficit de altura foi de 70% em 29 anos (1974 a 2003). "Podemos dizer que a geração atual cresceu entre três e quatro centímetros se comparado às três gerações anteriores. Isso fica mais evidente em regiões onde houve grande melhora econômica, como Norte e Nordeste", considera a endocrinopediatra Ângela Spinola, presidente do Departamento de Pediatria da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia.

O pediatra Mauro Fisberg enfatiza, porém, que, além das condições sociais de uma determinada população, há que se levar em conta a característica genética de cada povo. "Nossa herança genética é uma mescla do europeu, do índio, do negro, do asiático. Não sabemos qual nosso máximo potencial de altura, mas seguramente será menor que a dos países europeus", considera.


Filho de peixe, peixinho é
Há pelo menos três décadas, nossas crianças estão mais altas que os pais e avós. Para especialistas, a melhoria da qualidade de vida tem ajudado o brasileiro a desenvolver o seu potencial genético, que está a caminho de atingir o topoMas não adianta comer bem, ter saúde de ferro e ser filho de pais pequenos. Assim, umas das maneiras de saber, aproximadamente, o quanto uma criança vai crescer é fazer uma matemática básica com a altura dos pais. Para ter uma ideia de quão alto será seu filho, a orientação dos especialistas é somar a altura do pai e a da mãe. Se for menino, some mais 13cm; se for uma menina, subtraia 13cm. O resultado, divida por dois. O valor final é uma hipótese, que deve levar em conta um desvio padrão de normalidade: 8cm, para mais ou para menos, no caso delas; e 9cm, para mais ou para menos, no caso deles.

Ou seja, as chances de essa altura feita na calculadora variar na prática são grandes. O mais importante é não criar expectativas de ter um filho com 1,80m se os pais não passaram de 1,60m, por exemplo. A possibilidade de ser bem mais alto que os genitores existe, mas não é regra. "Muitas vezes, esses pais não tiveram condições de atingir o potencial máximo da estatura, então os filhos acabam atingindo a curva e ficando mais altos", explica Durval Damiani, membro do Departamento Científico de Endocrinologia da SBP.

Com essa simples soma, é possível concluir algumas obviedades. Filho de pais altos, provavelmente será tão alto quanto. Arthur, por exemplo, tem 2 anos e 1,01m. A altura dele é atingida por apenas três crianças entre 100, com a mesma idade dele. Isso faz com que ele seja sempre um dos maiores entre os coleguinhas de igual faixa etária. Seu tamanho também provoca questionamentos sobre suposto comportamento de criança para menino tão grande. "Sim, ele é grande, mas só tem 2 anos", volta e meia a mãe Carla Regina Andrade, 31 anos, tem que explicar.

Mas a genética não permitiria outra história. Carla tem 1,80m e o marido dela, Bruno Braga, 32 anos, 1,83m. A soma da altura dos dois só podia gerar um "pequeno grande homem", como a bancária se refere a Arthur. Pelas contas do pediatra, ele vai atingir pelo menos 1,83m e pode chegar a 1,93m. Os pais até gostam que o filho seja alto. Já planejam investir em esportes, como vôlei ou basquete, se ele quiser. A preocupação da mãe é que as medidas saiam da normalidade, por isso acompanha periodicamente o crescimento do menino. Aos 6 anos, o médico sugeriu o exame da idade óssea para confirmar se a idade dos ossos correspondem à idade cronológica (leia mais na página 25). O resto é administrar as relações sociais com os amigos menores e monitorar o desenvolvimento escolar. "Já até fui conversar com a professora para saber se, por ele ter um desempenho tão adiantado e ainda ser tão alto, a gente deveria mudá-lo de sala, para não se sentir deslocado. Mas ela disse que não", comenta essa mamãe com porte de top model.

Leia esta matéria na íntegra ne edição n;401 da Revista do Correio.

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