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A história de cada um

Inspirado em um site norte-americano, grupo de jovens brasilienses fotografa pessoas na rua, conta um pouco de sua vida e posta em rede social. Já um publicitário cria um enredo de ficção a partir de uma foto real

Juliana Contaifer
postado em 18/02/2014 08:00
Comportamento

A história de cada um

Inspirado em um site norte-americano, grupo de jovens brasilienses fotografa pessoas na rua, conta um pouco de sua vida e posta em rede social. Já um publicitário cria um enredo de ficção a partir de uma foto real

Por Juliana Contaifer

Pessoas são feitas de histórias. Sim, de sangue, músculos e ossos também, mas o que diferencia um do outro são as histórias de vida. As experiências pessoais que constroem o caráter e que tornam as pessoas interessantes. A ideia dos Humanos de Brasília, uma página no Facebook que se inspira no trabalho do fotógrafo norte-americano Brandon Stanton, do Humans of New York, é fotografar pessoas nas ruas da capital e fazer algumas perguntas pessoais, como "qual é seu maior medo?" ou "qual foi o melhor momento da sua vida?". A maioria dessas conversas resulta em frases ou histórias inspiradoras de gente que pode estar na sua frente na fila do banco ou deitado no parque.

Em Brasília, são nove pessoas responsáveis por alimentar a página. Entre eles, os estudantes Marina Saint-Hills, 17 anos, e Lucas Ramalho, 18 anos. "O projeto começou em julho de 2013. Queríamos sair na rua, falar com pessoas, achar boas histórias. Cada um tem alguma coisa interessante para contar. As pessoas têm esse desejo de compartilhar. Às vezes, tudo o que eles precisavam era de alguém para desabafar", conta Marina. Lucas explica que, em menos de um ano, quase 80 pessoas já foram entrevistadas pelo grupo. "Se não temos tempo para sair na rua, procuramos pelo Facebook mesmo. Encontramos pessoas legais e conversamos por mensagens. Foi assim que conseguimos um depoimento sobre racismo, por exemplo."

A história que mais marcou o grupo foi uma que nem foram eles que colheram. Um anônimo enviou a foto de um morador de rua que costuma ficar na região do Jardim Botânico. Ele chega e se deita no meio da rua. E lá fica por bastante tempo, sem falar com ninguém. Certa vez, alguém entregou um livro de Nietzsche e pediu para ele ler um parágrafo. Leu sem tropeçar e emendou o parágrafo em uma sonora risada. "Pelo estereótipo, seria um morador de rua que não sabe ler. A gente não sabe o que levou aquela pessoa a estar lá. Tanta gente lê Nietzsche e fica em crise existencial. Ele só riu daquilo tudo, achou que não tinha nada de mais", conta Marina.

As postagens são, em grande parte, sobre assuntos presentes na vida do brasileiro. Racismo, estupro e pobreza estão sempre na pauta dos Humanos de Brasília. Na internet, espaço público no qual é cada dia mais fácil conhecer desconhecidos, os comentários costumam ser positivos, de gente que se identifica com o que é dito. Para Marina, quem faz parte do grupo também passa a ver as pessoas com mais atenção. "Esse trabalho tem um efeito interessante na minha vida porque comecei a perceber que todas as pessoas são importantes e que têm histórias de vida. Agora, olho o mundo de um jeito diferente, julgo menos o outro."

O lado oposto

Se os Humanos contam histórias reais, o publicitário Pedrinho Fonseca faz o contrário. Depois de dois anos longe de todas as redes sociais, resolveu reativar suas contas e se surpreendeu com o que viu. O que se compartilha hoje são fatos cotidianos, onde foi o almoço, o que tinha no prato. Na foto, só um registro que traduzisse o momento. "Foi aí que tive a ideia de criar a Loja de Histórias. Dá aqui essa foto, que vou inventar algo fabuloso sobre ela. É uma loja de trocas, de escambo. As pessoas me mandam uma foto, sem dizer nada sobre ela, e devolvo com uma ficção. Uma história que imagino que pode ser sobre aquela imagem recebida", conta.

Em pouco mais de um ano de projeto, o publicitário recebeu mais de 12 mil imagens de remetentes, que esperam ter suas histórias contadas. Tem de tudo. Retratos, paisagens, natureza morta, detalhes, festas, animais e cenas do cotidiano. De todas, cerca de 600 viraram contos. "Jamais pensei que alcançaria tantos bons leitores. A ideia era ficar no núcleo de 100, 200 amigos próximos. Mas, agora, estamos falando de 10 mil leitores por semana. É muita gente para pouco escritor", afirma. Depois de três meses parada, a Loja voltou a funcionar no começo de abril.

"Cada vez que acabo uma história, penso: ;Que merda;." Para pedrinho, é um boicote saudável que assumiu e gosta de assim pensar e sentir. "Isso me isenta de enxergar a Loja como um objeto acabado ; um livro, por exemplo. Entendo-a como parte da minha construção ; digo, da minha tentativa de construir um escritor, em mim. Cada vez que penso ;que merda;, dimensiono quanta grama ainda tenho que comer para chegar a algum lugar mais confortável do que este, de aprendiz de contador de histórias. E esse desconforto me provoca, me instiga."

Faça parte você também

Tem uma história boa? Conheceu alguém interessante por aí? Mande a foto e a entrevista para a página dos Humanos de Brasília no Facebook (facebook.com/HumanosDeBrasilia)

Se tiver uma foto boa, envie para o e-mail (loja@pedrinhofonseca.com.br) e as histórias estão disponíveis na página do publicitário Pedrinho Fonseca (lojadehistorias.com).

Os estudantes Marina Saint-Hills e Lucas Ramalho fazem parte dos Humanos de Brasília

O publicitário Pedrinho Fonseca já recebeu mais de 12 mil imagens para criar uma história

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