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Que história é essa que o cérebro aprende dormindo?

postado em 22/11/2015 08:00

* Por Ricardo Teixeira

A velha história de que é possível aprender uma língua estrangeira enquanto dormimos parece ter um fundinho de verdade. Uma pesquisa publicada na última semana pelo disputado periódico Nature Communications mostrou que é possível fixar melhor o vocabulário de uma língua estrangeira durante o sono, desde que não existam fatores de distração.

Suíços que falam habitualmente o alemão tiveram aulas de holandês e no mesmo dia dormiam com um repeteco das palavras aprendidas no dia. Após fazerem o ;dever de casa; dormindo, eles conseguiam ter um ganho de 10% na capacidade de se lembrar das palavras no outro dia. Entretanto, quando os pesquisadores misturavam traduções certas ou incorretas no áudio, os ganhos não aconteciam. Também não havia piora.

Na década de 1950, dois pesquisadores americanos, Simons e Emmon, conduziram um experimento que deu um banho de água fria nas expectativas da capacidade do cérebro aprender dormindo. Eles fizeram quase cem perguntas a um grupo de voluntários e em seguida deram as respostas numa gravação enquanto dormiam. O resultado foi que ninguém aprendeu nenhuma das respostas e, assim, concluíram que o aprendizado durante o sono seria praticamente impossível. Mas a ciência não parou por aí.

Nos últimos 20 anos, uma série de estudos tem contestado os resultados pioneiros de Simons e Emmon demonstrando que nosso cérebro, enquanto dorme, é capaz de aprender, reativar memórias e solidificar conteúdos recém-aprendidos.

Há tempos sabemos que nosso cérebro não pára de trabalhar durante o sono, especialmente no processamento afetivo e na organização e consolidação daquilo que aprendemos quando acordados. Além disso, é no sono que o cérebro descarta memórias pouco relevantes para nossa vida e isso se dá não por falta de espaço no hardware. O cérebro precisa manter sua mesa de trabalho livre de penduricalhos supérfluos.

Mesmo assim, com todo esse trabalho cerebral durante o sono, não há porque ter muita esperança em aprender conteúdos novos e complexos durante o sono. Digo isso porque ainda não estão implantando chips no cérebro para uploads.


*Dr. Ricardo Teixeira é neurologista do Instituto do Cérebro de Brasília e professor de pós-graduação em divulgação científica e cultural na Unicamp.

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