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O planeta e o corpo agradecem pessoas que consomem produtos orgânicos

Preocupação com o próprio corpo e com as formas de proteção (ou agressão) à natureza que envolvem a produção dos alimentos leva brasiliense a aumentar o consumo de orgânicos

Camila Costa - Especial para o Correio
postado em 07/01/2018 07:00
Antes, eram os naturebas. Bichos grilos, ripongas, ;gente esquisita;, era como costumavam ser chamados os amantes das comidas orgânicas até certo tempo atrás. Optar por alimentos cultivados de forma agroecológica, sustentável, e fazer essa escolha dentro dos restaurantes, dos mercados e em feiras fazia o outro ao lado entortar o nariz.

Mas o conhecimento chegou, as informações sobre os benefícios dos orgânicos para o homem e o planeta se espalharam, e hoje, mais do que uma caminhada em busca da saúde, o consumo de orgânicos se tornou uma filosofia de vida. Um jeito justo de consumir: íntegro com os produtores, com o meio ambiente e com a saúde.

Uma das barreiras de acesso aos orgânicos sempre foi o preço. A lei da oferta e da procura não falha nessa hora. Quando a saga para encontrar o produto é grande, o preço também complica. Encontrar, comprar e consumir esse tipo de alimento já foi, para muitos, inacessível. Exatamente nessa conjugação: foi. A produção agrícola de orgânicos no país, em 2017, deve superar os 750 mil hectares registrados em 2016.

O resultado se reflete muito além das paredes dos supermercados. Está nas feirinhas de rua, entrequadras, sacolões, nas lojas comerciais parceiras e empresas especializadas na compra e repasse desses produtos. Uma pesquisa feita pelo Instituto Kairós ; uma organização civil sem fins lucrativos, que apoia projetos ligados ao consumo sustentável ; durante um ano, revelou que uma cesta com 17 produtos orgânicos ficou, em média, cerca de 50% mais barato nas feiras do que nos supermercados.

Realizada em cinco cidades brasileiras, a pesquisa envolveu 22 produtos e apontou que os preços dependem, entre outros fatores, do tipo de canal de comercialização. Para a nutricionista Mariana Garcia, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), nos canais tradicionais o orgânico sempre sairá mais caro. ;As feiras apresentam preços mais em conta, assim como os grupos de consumo, quando as pessoas se juntam e pedem diretamente do produtor;, compara.

A orientação do Idec é que as pessoas façam a pesquisa de preço por canais de consumo. ;Claro que nem todas as regiões terão uma variedade de alternativas, mas, nas grandes cidades isso já é realidade;, diz Mariana. ;Há comércios que são parceiros de produtores e também trazem os orgânicos por um valor mais barato, ou seja, com um pouco de pesquisa é possível achar alimento saudável e que temos condições de pagar;, aconselha.

Para ajudar essa busca, o Idec criou o Mapa de Feiras Orgânicas. Uma ferramenta que encurta o caminho do consumidor até o produtor. O mapa localiza feiras orgânicas ou agroecológicas, grupos de consumo responsável e comércios parceiros de orgânicos. Indica o dia de funcionamento e o horário. No Brasil, são 743 iniciativas. Em Brasília, são quase 40. Rita de Cássia tem uma tabela em casa com os melhores locais para comprar os produtos orgânicos:

A bióloga e funcionária pública Rita de Cássia Surrage, 53 anos, tem uma tabela em casa com os melhores locais para ela e a família comprarem orgânicos. Nas quartas pela manhã, o ponto de parada é na comercial da 409 Sul, atrás do restaurante Girassol. ;Tem quase 10 anos que não abro mãos dos orgânicos, mas sempre nas feiras. Eu e meus pais. E cada dia que passa mais pessoas próximas, amigos, estão se conscientizando da importância de se alimentar melhor;, comenta Rita.

Quando aderiu ao novo hábito de consumo, era mais complicado encontrar, lembra a bióloga. Consequentemente, os preços eram lá em cima. Hoje, Rita e a família levam para casa os alimentos sem química por um preço justo. ;Tem que procurar um ponto de distribuição, mas vale a pena. A diferença nos valores não é mais tão significativa e as vantagens são em dobro. Bom para a saúde e para o meio ambiente;, pondera.

Canteiros livres de venenos

Apesar do crescente interesse dos consumidores, o país ainda não sabe qual o tamanho preciso de suas áreas de produção de orgânicos. Isso prejudica o setor, que está em expansão e precisa de investimentos. ;É preciso saber o que existe para construir a estrutura necessária que ajude a manutenção desse crescimento;, explica Sylvia Wachsner, coordenadora do Centro de Inteligência em Orgânicos (CIO), vinculado à Sociedade Nacional de Agricultura (SNA).

;Dados atualizados são fundamentais. O que temos, mesmo assim não oficialmente, é que em 2016 foram registrados 750 mil hectares;, diz Sylvia. Dados do Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, no entanto, mostram o avanço das unidades de produção. Os produtos cadastrados devem conter o selo de certificação.

Neli Christ se orgulha do plantio 100% orgânico na chácara no Lago Norte: produção familiarSó no Distrito Federal, o número de unidades produtivas passou de 110, em 2013, para 305, até novembro de 2017. Estão cadastrados 200 agricultores, duas vezes mais do que o registrado há quatro anos. Entre eles, a produtora Neli Christ, 65 anos. Ela, a filha e o marido produzem dois hectares de frutas, verduras e legumes orgânicos, no Lago Oeste. Nos fins de semana, a família vende diretamente para o consumidor, na feira do Colorado, junto ao balão que liga Brasília a Sobradinho e ao Lago Oeste.

;A produção tem aumentado ano a ano. Quando começamos, não plantávamos nem um hectare;, orgulha-se Neli, que transformou o plantio em 100% orgânico há quatro anos. Além da feira do Colorado, aberta aos sábados e domingos, das 6h às 13h, os produtos colhidos ; que chamam a atenção pela qualidade ; abastecem uma casa de orgânicos na Ceasa, de segunda a sexta feira.

;A consciência do produtor e do consumidor tem aumentado, assim como a informação. E, na medida que essa consciência aumenta, também cresce a procura pelos alimentos mais naturais;, observa Neli. Nos canteiros, nada de veneno. A família usa apenas adubos orgânicos e produtos naturais à base de pimenta e sabão de coco, por exemplo, para cuidar da plantação.

A mudança de pensamento também está nos consultórios dos nutricionistas. Paula Daher Milhomem, 28 anos, atende há 7 anos e revela que, de lá para cá, algumas coisas mudaram, principalmente, na hora de montar uma dieta. ;Hoje, recebo pacientes mais esclarecidos, ou seja, eles já chegam aqui com pedido específicos, como a preferência por orgânicos. Eles mesmos me contam das feiras perto de casa, das opções que têm achado na rua.;

Paula diz que aproveita para incentivar o consumo do alimento sustentável. ;Antigamente, por ser mais caro, menos acessível, eu não podia indicar para todos os pacientes. Hoje não tenho mais essa restrição.; Segundo ela, consumir orgânicos ajuda o corpo a absorver melhor os nutrientes de cada alimento. A preferência deve ser para as frutas e legumes da época.

;O organismo assimila muito melhor, por causa da ausência de componentes tóxicos. Absorve e elimina melhor. Por exemplo, o betacaroteno da cenoura orgânica é mais ativo do que o da convencional. Quando explicamos tudo isso fica fácil convencer das vantagens, sem contar a parte ecológica, de preservação do meio ambiente;, observa a nutricionista.

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