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Em Pernambuco, projeto põe estudantes como protagonistas do modelo escolar

Como em Pernambuco, outras práticas bem-sucedidas na área educacional, catalizadoras de avanços e que estão contribuindo de forma efetiva para melhorar o ensino público brasileiro

postado em 17/12/2017 13:49
Quatro grandes eixos estratégicos: melhoria da infraestrutura, educação em tempo integral e profissional, aprimoramento dos processos de aprendizagem para tornar a escola mais atrativa e gestão eficiente, com avaliação de indicadores e metas de resultados. Esses são as principais condicionantes de um modelo educacional que deu a Pernambuco o primeiro lugar no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), do Ministério da Educação, em 2015.

Segundo o secretário de Educação do estado, Frederico da Costa Amancio, o resultado espelha a adoção de ensinamentos do grande educador pernambucano Paulo Freire, banido pelos governos militares na década de 1960 por sua Pedagogia do Oprimido, chamada pelos fazendeiros de "praga comunista;, que adapta o ensino à realidade do indivíduo. "Colocamos o estudante no centro do processo, fortalecendo o seu protagonismo e projeto de vida", define.

Como em Pernambuco, outras práticas bem-sucedidas na área educacional, catalizadoras de avanços e que estão contribuindo de forma efetiva para melhorar o ensino público brasileiro e podem ser replicados, foram apresentadas no Correio Summit: Experiências Exitosas na Educação Pública do País, em 12 de dezembro.

Segundo Amancio, não existe nenhum projeto, nenhum resultado, se as iniciativas não envolverem o chão da escola. Se o professor não se sentir envolvido no processo, é impossível alcançar sucesso. É claro que uma boa política salarial é indispensável. "Mas salário por si só não significa, necessariamente, valorização do professor. Na minha opinião, é bem mais amplo", afirma.

Até 2006, Pernambuco estava nas últimas posições, com os piores índices de avaliação da educação no país, como o 21; lugar no Ideb do ensino médio, além de péssima colocação (penúltimo lugar) em abandono escolar. Uma política do ex-governador socialista Eduardo Campos mudou o cenário. "Foi quando se decidiu o processo de transformação", que foi além da implantação de programas. "O que falta para a educação do Brasil não é criar programas. Historicamente, temos um conjunto de programas que nem sempre se articulam entre si, e nem sempre articulam os diversos atores envolvidos no processo", comenta o secretário.

Gestão de resultados

Primeiro, foi feito um grande diagnóstico sobre o mapa do ensino médio, para melhorar suas colocações. Uma estratégia foi construída, um novo modelo de gestão baseado não só na ampliação da oferta, mas com foco na qualidade. Os quatro grandes eixos horizontais foram definidos. Note-se que a primeira grande experiência de tempo integral ocorreu em um ginásio público pernambucano, em 2004. Hoje, são 370 nesse regime.

"Não bastam escolas de excelência. Se a política é tão boa, ela não pode ser só para poucos", diz o secretário. Foi a partir dessa constatação que se decidiu massificar a escola em tempo integral. Apesar de toda a melhora, permanece latente o desafio de atrair os jovens para a escola, porque há vagas ociosas e milhões de meninos e meninas fora das salas de aula.

O secretário enfatiza: "Devemos entender que se trata de um novo jovem, completamente diferente daqueles de muito tempo atrás. Têm outra perspectiva, outros interesses e precisa ser cativado". O modelo estruturado foi de gestão por resultados, para o monitoramento de todas as escolas, a partir de um conjunto de indicadores de desempenho, envolvendo do professor ao diretor, desembocando no governador. "Todos estão envolvidos em vários níveis estratégicos", afirma.

Hoje, são mais de 620 mil alunos inscritos no ensino fundamental e médio da rede pública de Pernambuco, distribuídos em 1.057 escolas. Desse total, 332 são instituições de referência, além das 40 técnicas, com 30 cursos profissionalizantes (tempo integral), dos 91 polos de educação a distância com avaliação instalada em 53 municípios. "Somos o primeiro estado a atingir a meta do Plano Nacional de Educação, de 2024. Neste ano, 51% dos estudantes do ensino médio se encontram em escolas em tempo integral e mais serão implantadas em 2018", explica Amancio, comemorando também o recuo na taxa de abandono das salas de aula.

Público presente em seminário conheceu os avanços no sistema de educação de Pernambuco

Um mundo pela frente

O projeto de vida e o protagonismo do jovem são os dois grandes pilares que Pernambuco trabalha nas escolas em tempo integral. "Efetivamente, temos a visão de preparar o jovem não apenas para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ou para a universidade. Nós o preparamos desde o início para a vida", diz o secretário de Educação do estado, Frederico da Costa Amancio.

A questão é conseguir mais dinâmica para os mais novos olharem a escola como parte importante do futuro. "Por que isso é tão importante? Se somente 18% dos jovens vão para a universidade, a gente não pode esquecer e dar uma formação para os outros 82%", responde o secretário. Para tornar o ensino mais interessante, um dos programas em que o estado investiu foi o intercâmbio "Ganhe o Mundo", que levou mais de seis mil alunos para o exterior, tudo bancado pelo governo estadual. Os que se destacam nos cursos de língua estrangeira, desde 2012 passam um semestre em países de língua inglesa, espanhola e, a partir de 2018, alemã. Tudo bancado pelo governo.Voltam para fazer o Enem. "Em 2015, criamos o Ganhe o Mundo Esportivo, para dar a oportunidade àqueles com talento nos esportes", conta.

Outro projeto de sucesso é o de trocas de conhecimento de cunho artístico. "Já embarcamos alunos com aptidão musical para o Canadá, para estudarem com grandes músicos. De manhã, vão às classes tradicionais do ensino médio. À tarde, aperfeiçoam seus dotes artísticos na escola de música", ressalta Amancio.

Para aumentar a dinâmica do dia a dia nas salas de aula, há novos insumos e experiências inovadoras compartilhadas. Criou-se um portal com um conjunto de ferramentas de mídia usados pelos professores, a exemplo de vídeosaulas, apresentações, jogos digitais. "Todo nosso trabalho de formação dos professores é focado em identificar quais as carências e traduzi-las em habilidades para satisfação dos alunos."

Há sistema de avaliação externa desde 2009, em que o desafio é tornar os resultados em instrumentos de análise. "É da escola que vem o resultado. Não vem de nenhum outro lugar. E tem a ver com a formação do professor. Não há formação genérica. Apesar de termos programas focados na especialização, em mestrado e doutorado, que são muito importantes para a própria carreira do professor, isso, por si só, não necessariamente traz o resultado", acrescenta o secretário.

Seleção

Ele aponta um conjunto de estratégias de avaliação do ensino. "Não existe bala de prata nem fórmula mágica. O que existe é trabalho contínuo", comenta Amancio. Um exemplo: para tornar o aprendizado de matemática e física mais agradável aos alunos, há aulas de robótica em mais de 300 escolas. Foi atingida a meta de criar escola em tempo integral em todos os municípios, mesmo naqueles onde há uma única escola de ensino médio.
Na média, o Brasil não avançou no ensino médio nos últimos 10 anos. Pernambuco evoluiu, de 2,7 para 3,9 em 2015, segundo o Ideb, ultrapassando a média brasileira de 3,5. Em 2017, Amancio acha que a nota pernambucana será 4,1, o que coloca o estado no 1; lugar nacional.

Depoimento

"Não vou desistir do meu sonho"

A jovem Roberta Vieira, 17 anos, sempre estudou na rede de ensino público de Pernambuco. Durante todo o ensino fundamental, frequentou os bancos escolares do Liceu de Artes e Ofício em Recife. No ensino médio, passou para o Ginásio Pernambucano em tempo integral. Ali, a jovem foi apresentada à matéria eletiva ;Projeto de Vida;. Trata-se de uma estratégia delineada pela Secretaria de Educação do estado para provocar a importância de trabalhar as habilidades do aluno que cursa o ensino médio.

Durante três anos, Roberta teve uma hora por semana dessa matéria. "Nunca pensei em ser advogada. Tinha o sonho de ser bailarina quando criança. Mas os professores me redirecionaram. Tenho um enorme potencial na escrita, com forte argumentação e sei defender direitinho minhas ideias", pontua. Por conta disso, Roberta pretende se tornar defensora pública. "Vivemos num sistema totalmente desigual. Quero ter voz ativa na sociedade para poder defender causas de pessoas que não tem condições financeiras", afirma.

Aluna com média que varia entre oito e 10 no boletim escolar, Roberta surpreendeu a todos com o resultado do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) em 2016, quando ainda estava no segundo ano do ensino médio. "Só descobri a força que tenho na palavra escrita ao atingir 920 de pontuação na redação do Enem", diz. Neste ano, que é para valer, ela quer passar para Direito na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). "Caso não passe, não vou desistir dos meus sonhos. Mas acredito que fiz uma boa prova e estou esperando o melhor resultado", enfatiza.

Com família de baixa renda, filha de pai aposentado e mãe trabalhando como auxiliar administrativo, a jovem, que divide a moradia com mais cinco irmãos, em Boavista, em Recife, afirma que não tem como pagar uma universidade particular. Hoje, recebe todo o suporte da escola na qual estuda.

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