Tecnologia

Investigações em 3D

Scanners, microscópios e tomógrafos de última geração tornam arsenal de instrumentos das polícias Federal e Civil da capital cada vez mais sofisticado. Com ajuda deles é possível achar pistas de um crime ocorrido há mais de quatro anos

postado em 28/06/2010 09:49
Esqueça aquela imagem estereotipada das salas de investigação policial, com um perito ou delegado de camisa amarelada em meio a montanhas de processos com o olhar desconfiado, ao som de uma ruidosa máquina de escrever. As coisas mudaram um bocado nos últimos anos. Computadores e equipamentos cada vez mais velozes conseguem esclarecer crimes que, à primeira vista, poderiam parecer insolúveis. Toda a parafernália tecnológica vem para abrir mais perspectivas ao trabalho da polícia, à ressocialização dos presos e, até mesmo, à defesa pessoal(1).

Uma das máquinas mais impressionantes nessa nova fase da investigação é o microscópio eletrônico de varredura, o MEV, instalado no Setor de Balística do Instituto Nacional de Criminalística da Polícia Federal (INC), em Brasília, o maior da América Latina.

O MEV faz a análise física das amostras a partir de um feixe de elétrons, dando a composição exata delas sem que haja destruição do material coletado. Uma das aplicações do equipamento é para a definição do quilate de peças de ouro. Em outros tipos de análises para determinar o quilate ; seja a química, feita em laboratório, ou a manual, que usa raspas de ouro sobre porcelana ; o material sempre sofre danos.

Palhares e o scanner 3D: peça fundamental no acidente da TAM em 2007Mas o MEV brilha mesmo quando o assunto é balística. Quando alguém dispara uma arma de fogo, uma série de resíduos fica impregnada na mão do atirador. Se o material for coletado até seis horas após o disparo, é possível dizer que determinado suspeito foi de fato responsável pelo tiro. Achou pouco? Pois foi o MEV que ajudou a desvendar o assassinato do dono do restaurante Bargaço, Leonel Rocha, 63 anos, em abril de 2008.

;A Polícia Civil nos procurou pedindo ajuda na manhã seguinte ao crime. O suspeito já tinha lavado as mãos, tomado banho, mas os agentes haviam guardado a roupa dele. Pegamos amostras na camisa e nos bolsos da calça e, duas horas depois, tínhamos o nosso resultado: se o suspeito não efetuou os disparos, estava, certamente, muito perto da vítima na hora do crime;, conta a perita criminal federal Sara Laís Lenharo.

Pistas recuperadas
Em outro caso, o MEV ajudou a descobrir quem matou o pedreiro Rafael Viana, 21 anos, em novembro de 2007, em Belém do Pará. Depois de quatro dias desaparecido, o corpo do rapaz foi encontrado boiando em um rio da cidade. Mais de dois anos depois, a polícia civil paraense enviou ao INC os restos mortais do pedreiro.

Com a reconstituição e análise de partes do crânio, os peritos federais conseguiram encontrar restos de chumbo na nuca de Rafael. ;Ou seja, o rapaz morreu com um tiro na nuca, disparado por alguém que estava atrás dele;, comenta o perito André Lima Logrado. Seis policiais militares são acusados do crime, cujo inquérito está agora em fase de instrução processual.

Outra supermáquina do INC faz uma tomografia de minúsculas amostras de material que podem ser movimentadas em 360;. ;O microtomógrafo pode fazer de 750 a 2 mil imagens de cada amostra. Para se ter uma ideia, um tomógrafo de hospital deve fazer cerca de 50 ou 100;, compara o perito criminal federal Carlos Magno. Atualmente, o órgão estuda novas aplicações para essa máquina, entre elas, a análise da tinta em documentos e a identificação da idade de dentes encontrados na região da Guerrilha do Araguaia.

Novos avatares
Para os mais interessados em ;vivenciar; a cena do crime, há no INC um scanner 3D capaz de guardar informações mais que precisas sobre cada local investigado, com um retrato de mais de 500 mil pontos por segundo. ;O maior desafio do perito é que ele precisa contar a história de trás para frente. Esse scanner é como um sonho para os peritos, porque ele tem o poder de perpetuar o que há no local;, diz o especialista Carlos Eduardo Palhares, responsável pela máquina no instituto.

A primeira vez que a Polícia Federal utilizou esse tipo de recurso foi para esclarecer as circunstâncias do acidente da TAM, que matou 199 pessoas em julho de 2007. Na época, conta Palhares, o objetivo era definir a rota do avião até que ele se chocou com um prédio na frente do Aeroporto de Congonhas. Na primeira tentativa, Palhares e outros peritos usaram uma escada do Corpo de Bombeiros para medir, manualmente, 30 pontos. Esse trabalho durou um dia inteiro.

No dia seguinte, uma máquina semelhante à que está hoje no INC captou 4 mil pontos em cerca de cinco minutos. ;Não tem nem como comparar. É uma revolução no processamento de informações sobre locais de crimes. É claro que tudo ainda depende da perspicácia do perito, mas é muito mais interessante entregar ao juiz um arquivo com imagens dinâmicas do que um laudo de 15 páginas;, opina Palhares.


1 - Arma de cebola
A tecnologia pode ser aplicada ao desenvolvimento de armas não letais. A empresa Poly Defensor, por exemplo, lançou três sprays, produzidos com óleos vegetais, que são capazes de, literalmente, marcar um agressor ou fugitivo. Um deles deixa a pele da pessoa amarelada, outro é como uma gosma que dificulta os movimentos e o terceiro é um spray com péssimo odor (fabricado a partir de extrato de cebola).

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