Voltas às aulas


A volta à rotina escolar é um desafio não só para os estudantes, que estão acostumados ao ritmo diferente das férias, mas também para os pais, que devem participar desse processo de adaptação. A menos de um mês da volta às aulas, o Correio preparou um guia com dicas de especialistas sobre como fazer essa transição da melhor maneira possível e respeitando a individualidade de cada criança. Navegue no menu acima para acompanhar o conteúdo ou use a barra de rolagem da página. De 18 a 20 de janeiro, será publicada ainda uma série de reportagens no caderno de Cidades que complementarão a publicação on-line. Confira!

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Adaptação à rotina escolar deve começar com uma semana de antecedência

Com a proximidade do fim das férias é preciso começar a pensar em como preparar crianças e adolescentes para se adaptar novamente ao dia a dia na sala de aula

Renato Souza
Especial para o Correio

Voltar ao ritmo das aulas após mais de um mês de férias não é uma tarefa fácil para os estudantes. É necessário alguns dias de adaptação para que eles se acostumem novamente com o horário de acordar retomem o foco para os estudos. Especialistas afirmam que os adolescentes são os que mais enfrentam dificuldade nesse período e que, por isso, precisam de tanta atenção dos pais quanto as crianças.

A diferença de comportamento de crianças e adolescentes na sala de aula é nítida. O menores tendem a ser mais curiosos, a fazerem mais perguntas em sala e se apegam mais aos materiais escolares. Por isso, fica mais fácil envolvê-los no processo de volta às aulas com a personalização de cadernos e a organização de estojos e de mochilas, por exemplo.

O papel de acostumar o aluno com as rotinas da escola vai além da instituição de ensino. Pamela Cristine da Silva, 25 anos, é mãe de Victor Hugo Costa, 6, que ingressará a no ensino fundamental, em uma escola pública no Jardim Botânico. Desde os dois anos de idade ele foi matriculado no maternal e agora, no período de férias, a mãe mantém a rotina do estudante de acordar cedo para que ele não perca o hábito.

"Eu não deixo ele dormir até tarde, mesmo nas férias, já pensando no período das aulas. Ele não tem videogame, para não ficar acordado até tarde, e geralmente só brinca aqui na rua mesmo", relata Pamela. "Ele é um garoto muito bom e que se adaptou bem na escola. Quando o coloquei no maternal a adaptação foi rápida. Ele gosta bastante dos coleguinhas, do material escolar. Estou tentando colocar ele em uma escola aqui perto de casa, para ficar mais fácil e onde o primo dele já estuda, mas até agora não consegui vaga", completa.

Pamela mantém a rotina do pequeno Victor Hugo mesmo durante as férias, para que ele não tenha problemas na hora de se adaptar ao cotidiano escolar | Foto: Ana Rayssa/Esp. CB/D.A. Press

A psicóloga Ana da Costa Polonia, professora do curso de psicologia da Unieuro, estuda as relações entre a escola e a família. Ela destaca que a preparação para voltar ao ritmo normal das aulas deve começar uma semana antes do início do ano letivo. "Uma coisa importante é apontar para a criança que as férias foram somente um período de descanso e destacar que a rotina normal vai reiniciar. Deve-se lembrar para o estudante mais pequeno o que se fazia antes das férias. Lembrar quando eles acordavam", explica. "Uma boa estratégia é chamar a criança para fazer um calendário de rotinas. Pode-se usar uma cartolina ou colar avisos com os horários na parede", destaca a especialista.

A professora destaca que é importante tomar algumas medidas antes da volta às aulas para evitar que os estudantes tenham problemas nos primeiros dias. "Uma ação importante nessa semana que antecede a volta do período letivo é fazer com que a criança durma mais cedo. Não deixar que fique até tarde na televisão", ressalta.

Ela lembra ainda que a alimentação não pode ser deixada de lado nesse período de preparação. "Os pais devem explicar que agora vão existir horários para as refeições, que o sorvete e outros alimentos que a criança gosta só serão consumidos agora no fim de semana. Com isso, as crianças vão se adaptar muito melhor e não terão dificuldades de aprendizado", afirma.

Uma coisa importante é apontar para a criança que as férias foram somente um período de descanso e destacar que a rotina normal vai reiniciar"
Ana da Costa Polonia, psicóloga

Com o início das aulas, o desafio de prender a atenção dos estudantes é repassado aos professores. A atenção e apoio que os alunos têm nas primeiras séries do ensino fundamental são cruciais para definir como eles vão evoluir ao longo das séries seguintes e a vontade que os discentes terão de aprender. A professora Angela Macedo, 43 anos, dá aulas para estudantes do 1º ao 4º ano, no Centro de Ensino Fundamental Nossa Senhora de Fátima, em Planaltina. A professora destaca que é perceptível a diferença no comportamento dos estudantes quando eles chegam das férias para os demais dias do ano.

Segundo ela, é importante ter ferramentas pedagógicas para chamar a atenção dos pequenos durante a rotina escolar. "As crianças chegam mais dispersas nos primeiros dias após as férias. Temos que retomar o aprendizado do ano anterior. É preciso criatividade para prender a atenção deles. Geralmente, uso histórias infantis para atrai-las. Podemos usar fantoches e livros com um tom de voz mais agradável", ressalta Angela.

A pedagoga destaca que as famílias devem estar sempre presentes na vida escolar dos alunos. Assim, a criança se adapta melhor e desenvolve o aprendizado de maneira mais fácil. "Os estudantes menores demonstram mais alegria ao chegar à escola. A preguiça começa a surgir com o avançar dos anos. As crianças passam a conversar mais em sala. O foco de atenção muda com o avançar das séries. Por isso, os pais precisam acompanhar a vida escolar dos filhos", destaca.


Saiba como ajudar na adaptação do seu filho:

Uma semana de preparo
A preparação para o retorno das aulas deve começar na semana anterior ao início do ano letivo. Nesse período, os pais devem evitar que os filhos fiquem acordado até tarde, para descansarem e acordarem bem dispostos no dia seguinte.

Calendário e avisos
Com os filhos, os familiares devem confeccionar avisos e um calendário de rotinas. O material deve ser fixado nas paredes do quarto do estudante ou em um mural confeccionado para este fim. Pode-se usar cartolina, papel e outros materiais. Os avisos não devem ser colocados em meios eletrônicos.

Alimentação definida
Na semana de preparação, os estudantes já devem voltar à rotina normal de alimentação. Com hora definida para café da manhã, almoço e jantar. Também devem ser cortados doces, sorvetes e salgados durante as refeições. Esses alimentos devem ser restritos ao fim de semana, a fim de que o jovem não se acostume a comer esses itens na sala de aula.

Material organizado
O material escolar deve ser revisado e organizado na companhia da criança. É preciso conversar com o estudante sobre a importância de ter os itens a serem levados para a aula organizados, mostrar para que serve cada um e como tudo deve ser arrumado na mochila antes e depois das aulas.

Uniforme arrumado
Os especialistas recomendam que exista um lugar no quarto para guardar o uniforme escolar. Pode ser uma caixa em cima de uma cadeira ou um espaço no guarda-roupas. Assim, a criança e o adolescente vão saber onde colocar o uniforme quando chegar da escola. Isso incentiva a organização e o planejamento dos estudantes.

Independência
Quando o estudante, seja criança ou adolescente, realizar atividades relacionadas à rotina escolar, ressalte que ele está mais independente. Frases de apoio, demonstrando reconhecimento e orgulho incentivam os estudantes a serem protagonistas das próprias rotinas e terem consciência das responsabilidades.


Fontes: Alba Lúcia Pezam, professora de psicologia do Iesb; e Ana da Costa Polonia

Período mais complicado para adolescentes

Apesar de estarem mais ansiosos para a volta das aulas, momento de retomarem o contato com o ciclo de amizades, os estudantes com idades acima de 12 anos levam mais tempo para voltar a acordar cedo e se desapegarem da rotina de férias, segundo especialista. Isso ocorre principalmente porque os adolescentes precisam de mais horas de sono e de descanso do que as crianças. "O adolescente tem um perfil diferente e exige uma rotina mais pessoal. Com eles se deve ter uma conversa mais pessoal sobre a importância da escola. Os pais precisam destacar que ser independente é importante para eles. Geralmente após duas semanas de férias eles já estão entediados, querendo voltar para a escola. Mas essa volta deve ser feita de forma tranquila, sem pressão", destaca a psicologa Ana Polonia.

O Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC) apontou que os adolescentes deveriam entrar na escola por volta das 8h30. No Brasil, um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa e Orientação da Mente em parceria com o Instituto Sou +Jovem mostrou que 43% dos jovens com idades entre 14 e 18 anos dormem de três a cinco horas por noite, levantando geralmente às 6h para irem à escola. Nas férias escolares, as horas de sono aumentam e o corpo se acostuma com o descanso prolongado.

Ao voltar à rotina normal, de levantar cedo, o estudante pode ter um baixo rendimento escolar, dificuldade de concentração e para fixar o conteúdo apresentado em sala. Segundo o estudo, se adaptar à mudança pode levar várias semanas.

O desafio do primeiro dia em sala de aula

Na casa de Caio Lima há um ambiente adaptado para que as filhas mais novas, Marília e Clara, se acostumem com a experiência que viverão na escola | Ana Rayssa/Esp. CB/D.A Press

Renato Souza
Especial para o Correio

O primeiro dia de aula é marcante tanto para os pais quanto para as crianças. A partir desse momento, os pequenos se tornam mais independentes e começam a trilhar o próprio caminho na educação formal. Especialistas destacam que a presença dos familiares nesses primeiros instantes é essencial e que os pais devem conhecer as instalações da instituição de ensino escolhida para os filhos estudarem. Tanto na creche quanto na pré-escola eles devem ter acesso a atividades para incentivar a percepção de espaço e desenvolver as primeiras habilidades cognitivas. O aprendizado ocorre por meio de jogos e de brincadeiras.

Uma das questões que costuma preocupar os pais é decidir com que idade matricular a criança. "Essa questão de idade exata para colocar a criança na escola acompanha os pais desde a gestação; procura-se a melhor idade para tudo. As creches ou pré-escolas são espaços destinados à educação de crianças, desde a socialização até o preparo e desenvolvimento para uma base educacional mais sólida", resume o psicopedagogo Alfredo Lacerda, especialista em educação da Unieuro. Ele destaca que o melhor período para colocar os filhos na escola depende de cada criança. "Não existe uma idade exata, isso vai depender muito do estímulo e da prontidão da criança. Quanto antes ela puder se socializar, frequentar o espaço escolar e introduzir as atividades educacionais apropriadas à idade, melhor será para a criança e para a família", afirma.

Além de levar em conta o perfil da criança, é necessário avaliar em que tipo de ambiente ela conviverá. O especialista ressalta que a educação é formada por um conjunto de fatores, que vão definir qual será a primeira impressão do aluno. Sentir-se bem desde o primeiro dia é fundamental para que o estudante tenha uma vida escolar sem entraves. "O que se destaca nesse momento é a importância da seleção dessa instituição que recepcionará a criança. É essencial que os pais conheçam bem desde as instalações físicas, preparo e formação de profissionais, além da proposta pedagógica da escola, que, por sua vez, deverá estar apropriada à idade da criança", completa Lacerda.

De acordo com a legislação brasileira, até os 5 anos de idade, as crianças podem ser matriculadas em creches e pré-escolas. Aos 6, a matrícula passa a ser obrigatória, e os pequenos ingressam no primeiro ano do ensino fundamental, independentemente de terem ou não cursado a educação infantil. No Distrito Federal, a Lei Orgânica garante a oferta de vagas em creches públicas ou privadas que têm convênio com o governo.

O webdesigner Caio Lima, 28 anos, morador do Jardins Mangueiral, não pensou duas vezes em colocar as filhas na escola o mais cedo possível. Caio é pai de quatro meninas, duas delas estudam e as outras duas, Marília, 6, e Clara Alves, 4, se preparam para ingressar na escola. Caio conta que a convivência entre as irmãs facilitou a adaptação à escola. "Nós decidimos colocar as meninas cedo na escola para elas já irem se acostumando com o ritmo do ensino. No primeiro dia, elas estranharam o ambiente, mas a adaptação foi muito rápida, por conta da convivência com as irmãs e as primas. A Marília, que tem 6 anos de idade, entrou na creche desde os dois 2 anos. Antes de irem à escola, temos uma conversa, explicamos como é a rotina e que vai ser bem divertido", afirma Caio.

Para facilitar a adaptação das pequenas, Caio criou em casa um espaço com brinquedos educativos e um ambiente parecido com o da escola. O objetivo é fazer com que as crianças se acostumem com a rotina que vão ter e aprendam a conviver bem com os colegas. "Aqui em casa temos vários brinquedos educativos no espaço destinado para as meninas. Assim elas vão interagindo entre elas e se acostumando a fazer atividades em grupo. Analisando o comportamento das primeiras duas, que já estão estudando, percebi que essa interação é fundamental", afirma. "Acredito que é por conta disso que não tivemos problemas assim que elas ingressaram na creche. A partir daí, é um caminho mais natural", complementa.

Para o estudante, a escola se torna uma extensão de casa e do convívio social. É hora de conhecer pessoas novas, de aprender assuntos das mais diversas áreas do conhecimento. No primeiro dia, por conta do contato com um ambiente diferente daquele que está acostumada, é comum que a criança fique com receio da mudança. O professor Célio da Cunha, professor da pós-graduação em educação da Universidade Católica de Brasília (UCB), ressalta que, nesses momentos iniciais, os pais devem acompanhar os estudantes na escola. No primeiro dia de aula, é recomendável que o responsável fique algumas horas na sala de aula ou local de atividade, até que a criança se sinta confiável.

"Chorar no primeiro dia de aula é comum, e isso ocorre muito na pré-escola. O pai ou a mãe pode ficar com a criança na escola por duas ou três horas, até que ela se ambiente melhor. O responsável deve entrar na escola, interagir. A instituição de ensino precisa ter sensibilidade em relação a isso e ficar atenta a conflitos. A criança é o centro da educação. Temos que ter uma atitude pedagógica em relação a esses problemas", destaca o professor.

Mudança monitorada
Confira as dicas de especialistas para que o processo de adaptação à escola seja tranquilo

Primeiro dia
Entre com a criança na escola, converse com o professor por alguns minutos e observe como ela se comporta com as demais. Se ela resistir, fique na instituição por algumas horas. As escolas devem entender que a presença dos pais, mesmo em sala de aula, é importante nesse momento.

Período de adaptação
É comum o estudante levar de duas a três semanas para se acostumar à rotina escolar. Choros, birras e recusas em ficar no colégio são comuns. Caso durem mais tempo, pode ser a hora de procurar um especialista. Pode ser um profissional da própria escola, especializado nesse tipo de atendimento.

Instigar o conhecimento
Quando a criança não estiver na escola, procure levar ela a pontos turísticos, peças de teatro, zoológico e mostre desenhos educativos. Isso vai propiciar o surgimento de dúvidas e curiosidades que podem ser sanadas na escola.

Dificuldades de ambientação
Sempre existem as crianças que não se adaptam bem à rotina escolar. Não querem fazer as atividades, não obedecem ao professor. Nesses casos, é necessário acompanhamento diário da família, para saber como o estudante está evoluindo. Não espere receber uma notícia de reprovação no fim do ano. A interação entre escola e família é capaz de resolver esse problema.

Casa não é escola
É importante ressaltar que algumas atividades devem ficar restritas à escola. O estudante não deve ser pressionado a fazer atividades pedagógicas fora da sala de aula. As atividades de casa devem complementar o ensino formal. Os pais podem coordenar o horário de estudo dos filhos, mas devem evitar passar atividades além das solicitadas pelo professor.

Fontes: Célio da Cunha e Alfredo Lacerda

Segundo ciclo do ensino fundamental é marcado por mudanças

Entre elas estão o aumento no número de professores e, em alguns casos, a mudança do turno de vespertino para matutino. Especialistas dão dicas para o momento de transição

Fernando Caixeta
Especial para o Correio

Muitas mudanças esperam os alunos que terminaram o 5º ano do ensino fundamental em 2016 e vão começar o 6º em 2017. A "tia", que ensinava praticamente todas as disciplinas, sai de cena. Os estudantes que passarem pela transição do primeiro para o segundo ciclo desta etapa do ensino terão professores diferentes para cada matéria. Isso significa mais responsabilidade e mais deveres de casa.

Essa nova etapa pode exigir outras adaptações, que não dizem respeito apenas ao conteúdo. Muitas escolas separam as crianças que entram nos anos finais do ensino fundamental dos estudantes mais novos. A separação pode ser física, com setores diferentes da escola para cada faixa de ensino, ou em turnos diferentes para cada ciclo. Nesses casos, estudantes que estavam acostumados a começar as aulas à tarde passarão a entrar no começo da manhã, o que deve exigir alguns dias de adaptação para a nova rotina.

É o caso de Theo Oliveira, 11 anos, que terminou o 5º ano em 2016 e agora, no 6º, terá uma rotina diferente da que levava até então. Theo estudava à tarde no ano passado e, neste ano, terá de estar uniformizado, na porta da escola, às 7h30. O horário de saída é perto das 13h. "Vou sair da aula morrendo de fome. Lá no meu colégio, a lanchonete fica perto das salas, então quando eles estão cozinhando alguma coisa lá, entra aquele cheirinho bom de comida, que a nossa barriga fica até roncando", brinca.

A mãe de Theo, Cristina Oliveira, diz que a mudança vai alterar a rotina da família. "Eu estou na expectativa, vai ser uma novidade para todo mundo. Além de mudar de turno, a carga horária vai aumentar. Ele vai ter mais professores, o que significa mais dever de casa. Também vai precisar se adaptar ao novo horário e a logística de levá-lo à escola e buscá-lo também muda", afirma Cristina.

Theo, filho de Cristina, vai entrar para o segundo ciclo do ensino fundamental este ano e já se preparar para as mudanças | Foto: Ana Rayssa/Esp. CB/D.A. Press

Para Walmir Cardoso, doutor em educação matemática e coordenador da Roquette Pinto, empresa de comunicação educativa, essa é uma passagem que implica num número expressivo de mudanças. "Os estudantes deixam de ter um professor único em sala de aula e passam a conviver com estilos diversificados de quase uma dezena de docentes diferentes", explica.

Além disso, ele detalha que os tempos são marcados pelas durações determinadas das aulas em cada disciplina, com o decorrente aprofundamento de conteúdo, níveis de exigência e ampliação significativa no volume de tarefas para casa. "Soma-se a isso o fato de muitos estudantes deixarem a rede municipal e passarem à rede estadual, o que implica em mudança de escola. Para completar o quadro de complexidade dessas mudanças, os estudantes estão entrando na adolescência", completa Cardoso.

De acordo com o psicólogo escolar Erich Botelho, o impacto causado pela entrada na segunda etapa do ensino fundamental é menos intenso do que o causado no acesso ao ensino médio. Em qualquer caso, no entanto, a família tem que ajudar na adaptação.

Algumas crianças chegam a essa nova etapa sem o devido domínio de alguns conteúdos que foram ensinados. O psicólogo defende que, nesses casos o atendimento deve ser individual e personalizado para cada criança. "Mesmo entre crianças da mesma faixa etária, com os mesmos professores, aprendendo a mesma matéria, podem ter aquelas que compreenderam e aquelas que não entenderam a matéria. Mesmo nessas condições em que tudo é igual, são indivíduos diferentes. O grande desafio da escola é saber identificar isso", analisa Botelho.

O estudante Theo Oliveira, filho de Cristina, já está ciente de que 2017 vai ser um ano com muito dever de casa. "Esse ano eu vou ter bem mais professores, pela primeira vez, vou ter professor homem e uma matéria nova: espanhol. Acho que vai ser muito legal aprender esse idioma", diz.

Apesar de tanta mudança, Theo aguarda o começo das aulas com ansiedade e expectativa. "Eu sei que vai ter muita coisa nova, mas fiquei feliz em passar para o 6º ano e acho que não vou ter problema para me acostumar', afirma.

Na avaliação de Walmir Cardoso, não existe uma quantidade padrão de lição de casa que deve ser feita pelo estudante, mas a tendência é que aumente quanto mais professores entrarem em cena, como ocorre a partir do 6º ano. Para o doutor em educação, se o tempo de dedicação para a lição começa a exceder, sistematicamente, duas horas por dia, outras atividades igualmente importantes podem ficar comprometidas.

"Com a lição de casa, o professor avalia o desempenho individual e coletivo dos estudantes. Ela serve para sistematizar conhecimentos, pode ser usada como elemento preparatório de novas atividades e também funciona para aprofundar temáticas desenvolvidas", diz o especialista. Segundo ele, o ócio também é essencial na vida do estudante.

Ao completar a primeira metade do ensino fundamental, o aluno deve dominar alguns conteúdos para conseguir acompanhar o ritmo a partir do 6º ano. "Creio que mais do que uma lista de conteúdos a preocupação deve ser o processo para se chegar até esse estágio de complexidade. Por exemplo, uma expectativa em língua portuguesa no fim do 5º ano é que o estudante possa revisar textos, próprios e dos outros, em parceria com colegas, com intenção de evitar repetições, ambiguidades e erros ortográficos e gramaticais", detalha.

"Para ele atingir essa etapa de desenvolvimento entre suas competências leitoras, é necessário que, em anos anteriores, ele reescreva histórias conhecidas, ditando-as e, em outra etapa, revise textos coletivamente com a ajuda do professor, prestando atenção aos aspectos de coerência, coesão e ortografia."

Confira as dicas de especialistas para a mudança de ciclos:

- Deixar claro para a criança que ela terá mais responsabilidades a partir de agora;
- Estabelecer horários fixos para fazer a lição de casa;
- Reservar um tempo para as atividades físicas e brincadeiras;
- Auxiliar a criança na lição de casa, o que não significa fazê-la para ela;
- Indicar fontes de pesquisa e supervisionar resultados da criança.

Arthur Menescal/Esp. CB/D.A Press

Saiba como agir na mudança de escola

Fernando Caixeta
Especial para o Correio

Um dos momentos que costuma marcar a trajetória escolar de crianças e adolescentes é a troca de colégio. É praticamente inevitável que isso ocorra, uma vez que muitas instituições são especializadas apenas em determinada faixa de ensino. Algumas só contam com turmas de educação infantil, outras, do 1º ao 5º ano do fundamental. O papel da escola e dos pais para inserir o aluno no novo contexto deve ser compartilhado, pois o aspecto emocional, que envolve a relação do estudante com os amigos e o local, embora importante, não deve ser o único a ser levado em conta. A linha pedagógica da também precisa ser considerada e, se possível, comparada com a anterior.

Para a psicopedagoga Sílvia Celeghini, cada faixa etária recebe a mudança de uma forma e, muito mais do que uma questão de idade, a adaptação leva em conta a personalidade do aluno. "A mudança em si não provoca nenhum problema na criança ou no jovem. O que, às vezes, interfere é o perfil psicológico e a personalidade, além de como a transição é feita e como o estudante é comunicado disso. Também devemos observar se ela está preparada ou não e se a mudança ocorre repentinamente", orienta.

O estudante de 15 anos Vítor Montefusco terminou o ensino fundamental no ano passado e vai deixar a escola que estudou desde a infância. O grupo de amigos que fez na instituição onde estudava vai para escolas diferentes. "Eu vou sozinho para essa nova escola. Do meu grupo, todos vão para outros lugares. Fiz muitos amigos no ano passado. Estão todos passando pela mesma situação", conta. A mãe dele, a servidora pública Liliane Montefusco, acredita que o filho não terá dificuldade em se adaptar à nova instituição e fazer novos amigos. "Ele é muito sociável", diz.

Liliane conta que a escolha levou em conta alguns critérios. "O primeiro é a proximidade de casa. Agora, ele vai poder ir a pé ou de bicicleta. Antes, eu pagava uma van escolar para deixar e buscar na escola, o que já era um gasto a mais, sem falar que a gente precisa pagar dezembro, janeiro e julho, mesmo sem usar o serviço. Então, como a antiga escola dele só tinha turmas até o 9º ano, e ele teria de mudar de qualquer jeito, optei por uma boa escola que fosse perto de casa."

Casos como o de Vítor exigem dupla adaptação. Quando acabarem as férias, o estudante terá de se adaptar à nova etapa de ensino em que ingressará e à nova instituição. Para Maria Eleusa Montenegro, pós-doutora em psicologia da educação, tanta novidade pode exigir supervisão, mas ela lembra que cada pessoa reage de uma maneira diferente. "Conforme o aluno vai avançando, ele ganha mais liberdade, o que pode ser bom para uns e deixar outros perdidos. O normal é que a criança consiga se adaptar sem maiores dificuldades. Caso isso não ocorra, é importante buscar ajuda profissional", orienta.

Vítor Montefusco vai ingressar no ensino médio e precisará mudar de escola pela primeira vez | Arthur Menescal/Esp. CB/D.A Press

Maria Eleusa Montenegro defende que mudanças como essas quando ocorrem na infância marcam a formação do indivíduo e o preparam para outras situações de vida, sobre as quais todas as pessoas passam. "A dinâmica de mudar de escola é a mesma da que se ela tivesse mudado de bairro ou de cidade, por exemplo. A mudança tem o seu lado difícil, mas nem por isso deixa de ser saudável", observa.

No período de adaptação, os pais devem ficar mais próximos da criança e ajudar a manter as relações que o filho desenvolveu. "Se ele tiver ficado muito próximo de um amigo, os pais devem levar para visitar. Isso evita grandes traumas, já que toda mudança gera desequilíbrio. Se ele perceber o apoio que recebe nessa adaptação, isso ocorre sem grandes preocupações porque a criança sente o apoio familiar", descreve.

As especialistas destacam que a opinião dos filhos deve ser levadas em conta na hora decidir sobre a mudança de instituição, mas que a palavra final deve ser dos responsáveis. "Os pais podem ajudar com muito diálogo, procurar saber o que a criança está sentindo. A partir de 6 ou 7 anos, a criança já pode opinar, falar o que ela quer e tentar uma negociação. Ela pode participar desse processo de escolha, ir com os pais visitar as escolas. O diálogo é fundamental. Às vezes, nós, pais, julgamos, fazemos escolhas que a gente acha que é melhor por conta de uma referência nossa, mas a nossa necessidade pode ser diferente da necessidade dos nossos filhos", argumenta Sílvia Celeghini.

ENTREVISTA | Maria Eleusa Montenegro, pós-doutora em psicologia da educação

Como deve ocorrer o processo de adaptação à nova escola?
Se o colégio não tiver uma linha pedagógica muito diferente, a adaptação ocorre sem grandes problemas. A criança já conhece esse mecanismo de mudança porque ela já passou por isso em outras fases da vida, como quando entrou na escola, quando saiu da educação infantil para o ensino fundamental e também quando saiu do primeiro para o segundo ciclo do ensino fundamental. A adaptação à nova escola vai ser a mesmo como se a criança tivesse mudado de casa ou de escola.

Como os pais devem contribuir nessa fase?
É um período em que os pais devem ficar mais próximos da criança. Se ela tiver feito algum amigo muito próximo, levá-la para visitar esse amigo ou convidar esse amigo para sua casa. A mudança é difícil, mas nem por isso deixa de ser saudável. Ao longo da vida, a gente passa por muitas mudanças e isso deixa de ser desagradável e passa a ser uma situação cotidiana, que ocorre quando a pessoa entra na faculdade, quando ingressa no mercado de trabalho.

E o papel da escola nesse processo?
A escola deve dar atenção especial ao aluno que veio de outras escolas, mostrar a estrutura física, os novos professores e funcionários. Na medida em que o aluno vai amadurecendo, ele aprende a lidar melhor com essas situações. Os adolescentes são um caso à parte, até pela questão hormonal e afirmação da identidade, pode tornar mais difícil a mudança para um adolescente do que é para uma criança menor. Uma das características da adolescência é se desgarrar dos pais e buscar essa afirmação da identidade no grupo de amigos.

Família e escola têm responsabilidade conjunta na formação do estudante

Formação escolar ajuda a desenvolver aspectos essenciais, como a responsabilidade e o respeito às diferenças, mas é importante que os pais dialoguem com a instituição de ensino para contribuir no processo

Fernando Caixeta
Especial para o Correio

Bruna Corrêa com os filhos Sophia, Bruno, Bento e Davi. Em casa, ela tenta mostrá-los diversos pontos de vista sobre todos os temas | Foto: Minervino Júnior/CB/D.A. Press

Quando se fala em educação dos filhos não existe uma divisão brusca entre o que é de responsabilidade da escola e o que deve ser ensinado em casa. Profissionais de educação e psicólogos especializados em comportamento escolar afirmam que família e instituições de ensino devem trabalhar de forma integrada, pois ambas têm papel essencial na formação da personalidade de crianças e adolescentes.

A própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), promulgada em 1996 e atualizada praticamente todos os anos, prevê uma educação integrada, que não deve ser restrita somente ao que o aluno aprende na escola. A lei prevê "a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber". No texto, também consta o pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, a valorização da experiência extra-escolar e a vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais.

A empresária Bruna Corrêa, mãe de Davi, 14 anos, Sophia, 13, Bruno, 6 e Bento, 3 anos, acredita que a responsabilidade da escola é fornecer o conteúdo pedagógico e o acompanhamento individual do estudante, informando, sempre, a situação escolar da criança aos pais e responsáveis. Bruna faz questão de apresentar aos filhos vários pontos de vista diferentes sobre o mesmo assunto. Até nos temas que, às vezes, levantam polêmica entre pais e professores, como ensino religioso e educação sexual, ela transmite às crianças os valores em que a família acredita, de maneira a complementar o que aprenderam na escola.

"As pessoas têm muita facilidade em delegar responsabilidades. As crianças ficam muito tempo na escola e com outras pessoas, que não os pais, isso faz com que o pai e a mãe acabem só supervisionando ou, às vezes, nem isso", observa Bruna. "Alguns assuntos, é bem mais coerente a família ensinar, embora eu seja da opinião de que a criança precise ter noção de tudo. Eu quero apresentar para os meus filhos várias questões e, claro, que ao lado deles eu tento orientar, mas tenho que dar essa liberdade a eles."

Bruna acompanha de perto a vida escolar dos filhos e dialoga com eles sobre o que têm aprendido na escola. "Não vejo problema de a escola contribuir na educação religiosa e sexual, mas não é papel só da escola. Deixar só a cargo da escola, eu acho que é transferir uma responsabilidade muito grande. De repente, a criança absorve informações e acaba aprendendo valores que não correspondem aos da família", diz.

Para a psicóloga infantil e especialista em ludoterapia Vanessa Lacombe, cabe à instituição planejar a melhor metodologia e aplicar as ferramentas disponíveis para contribuir para a formação dos alunos, respeitando o ritmo de cada um. Segundo ela, aos pais, cabe acompanhar os estudos, os interesses e o desenvolvimento cognitivo, social e emocional dos filhos.

"A escola é primeira grande oportunidade de a criança expandir seu mundo social. São muitas oportunidades de crescimento, aprendizado, amadurecimento, enfim, é onde se inicia um novo caminho para a criança. A escola deve funcionar como mediadora do processo de desenvolvimento de seus alunos", explica. Para a psicóloga, família e escola devem estreitar os laços e a comunicação, com o objetivo de dar suporte aos estudantes. Isso pode ocorrer, segundo a especialistas, por meio de reuniões que não tenham como objetivo tratar apenas do desempenho educacional da criança, mas que também que busquem ampliar o olhar de ambas as partes sobre a criança e o desenvolvimento.

A diretora da Escola Classe 304 Norte, Nara Gomes, concorda com a opinião da psicóloga. Há 28 anos trabalhando com educação, Nara acredita que a escola tem o papel de cuidar da parte cognitiva e, cada vez mais, o currículo vem focando na formação do cidadão. "Se uma criança estuda em tempo integral, ou semi-integral, a escola acaba entrando também na formação do indivíduo, na postura, na questão da higiene pessoal, então o papel de educar acaba ficando muito misturado", afirma. Ela explica que a escola contribui para o desenvolvimento de habilidades e características já na infância que preparam para outras fases da vida. "A questão do compromisso e da responsabilidade, por exemplo, é uma delas. Para ajudar a desenvolver a responsabilidade, a gente passa o dever de casa, mas a criança não dá conta sozinha, aí entra a família. Por isso essa colaboração é tão importante."

Para ajudar a desenvolver a responsabilidade, a gente passa o dever de casa, mas a criança não dá conta sozinha, aí entra a família. Por isso essa colaboração é tão importante"
Nara Gomes, diretora da Escola Classe 304 Norte

Existem aspectos particulares a cada faixa etária e precisam ser observadas com atenção, conforme ressalta a psicóloga Vanessa Lacombe. "Cada indivíduo tem o seu tempo particular de desenvolvimento, não devem ser feitas comparações entre crianças de mesma faixa etária, por exemplo", explica. De acordo com a especialista, a criança aprende mais a partir de atividades sensoriais, que envolvam o corpo e a experiência motora. Já o adolescente tende a buscar referências nos amigos, no grupo social ao qual pertence ou deseja fazer parte. Por isso, segundo Vanessa Lacombe, é fundamental trabalhar as relações em grupo nessa idade.

O ambiente social da escola faz com que os alunos tenham experiências que contribuam para a aceitação do outro e o respeito aos diferentes pontos de vista, segundo a diretora Nara Gomes. "A experiência que ele tem em casa é uma, quando ele convive com outro colega, a realidade daquele colega é outra, então ele também aprende com aquilo", reforça.

ENTREVISTA | Vanessa Lacombe, psicóloga

Que aspectos da formação escolar estão envolvidos na formação da personalidade e da identidade da criança, do adolescente e do jovem?
O desenvolvimento individual se dá de forma contextualizada social e culturalmente. A escola é o espaço físico, psicológico, social e cultural onde os indivíduos se desenvolvem globalmente, mediados por uma sistemática metodológica em função dos estágios de desenvolvimento. Na medida em que a escola sai do papel restrito de promover exclusivamente a aprendizagem de conteúdo, deve levar em consideração as fases diferenciadas de desenvolvimento, a fim de promover o desenvolvimento dos papéis sociais de seus alunos. Estes, enquanto protagonistas do próprio aprendizado, ampliam o repertório de comportamentos constituintes de sua personalidade, com mais autonomia e independência. Ao ampliar os seus papéis sociais além do ambiente familiar, o indivíduo desenvolve-se cognitiva, social, física e afetivamente.

Se em uma das instituições (família ou escola), o aluno vai mal, como isso pode afetar o desenvolvimento da criança?
O aluno reflete em cada um dos seus ambientes o seu interior, que é indivisível. Não é possível "deixar em casa" os problemas familiares e pessoais, bem como não é possível "deixar na escola" os problemas enfrentados lá. Sendo assim, é preciso que tanto os pais quanto os professores fiquem atentos aos seus alunos, observem mudanças de comportamento como isolamento social, distúrbios gástricos (vômitos, dores estomacais, encoprese, diarréias), distúrbios do sono, desejo de não voltar para casa ou de não ir à escola, dificuldade de relacionamento, aumento na agressividade, queda brusca no rendimento escolar, entre outros.

Até bem pouco tempo atrás havia uma clara distinção entre o que deveria ser aprendido nas escolas e em casa, com as famílias. Era papel da escola instruir, passar conteúdo para as crianças. Já às famílias ficava restrito o papel de educar. No entanto, instruir e educar andam juntos, são indivisíveis e não é possível um sem o outro"

E como esses problemas afetam o aprendizado especificamente?
Os problemas emocionais têm influência direta nos processos cognitivos, afetando por exemplo, memória, raciocínio lógico, concentração, dentre outros. Novamente, é a questão de se ter um olhar global sobre um indivíduo. Uma criança que se sente pressionada a ler porque todos os seus amigos já estão lendo, pode desenvolver uma encoprese de fundo emocional, por exemplo. Já um jovem que sofre bullying pode se tornar isolado e ficar o dia trancado no quarto, sem qualquer interação social, por exemplo. Outra criança cujos pais passaram um recente divórcio pode ter uma queda brusca nas notas. E assim, por diante. Nesse caso, cabe a uma das partes comunicar a outra sobre o que está acontecendo em cada um dos ambientes para que, juntas, possam buscar o melhor caminho a fim de ajudar o aluno.

Existe, de fato, uma separação entre o que a criança deve aprender na escola e o que deve aprender em casa?
Até bem pouco tempo atrás havia uma clara distinção entre o que deveria ser aprendido nas escolas e em casa, com as famílias. Era papel da escola instruir, passar conteúdo para as crianças. Já às famílias ficava restrito o papel de educar. No entanto, instruir e educar andam juntos, são indivisíveis e não é possível um sem o outro. O ambiente escolar se diferencia dos aprendizados em casa na medida em que atende às necessidades cognitivas, sociais, culturais e psicológicas de forma sistematizada e estruturada.

Saiba como identificar as causas do desânimo para voltar às aulas

Renato Souza Especial para o Correio Crianças e adolescentes têm diferentes motivações para frequentar a escola. Os menores são movidos pela novidade, pelo convívio com os colegas e até mesmo pela vontade de usar pela primeira vez o material escolar. Já os adolescentes costumam ser influenciados pelo contato com grupos sociais diferentes. Procuram estar próximo de pessoas com as quais se identificam e, por isso, aguardam a volta às aulas para rever amigos. Existem os casos, no entanto, de estudantes que rejeitam o ambiente escolar. Seja no fim das férias ou ao longo do ano, o desânimo para estudar, a recusa em ir para a escola e a criação de motivos para ficar em casa às vezes aparecem. Esses fatores são sinais importantes para acender o alerta aos pais, que precisam analisar o que está ocorrendo.

Os sinais variam dependendo da idade do estudante. Crianças pequenas deixam claro quando não gostam da escola. Choro, pedidos para ir para casa e recusa em seguir para a escola são alguns dos sinais. Já entre os adolescentes, a oposição em frequentar a escola pode vir por meio de faltas não informadas aos pais, fuga durante o horário de atividade ou evasão. O fato de o estudante demonstrar não ter interesse em frequentar a instituição de ensino é um indício de que algo está errado. A psicóloga Alba Lúcia Martins, professora do Centro Universitário Iesb, afirma que os fatores que levam à rejeição à escola podem ser explicados por casos mais simples, como apego aos pais, ou podem ter como origem problemas mais sérios, como a hostilização por parte dos colegas, por isso, sempre é importante averiguar as causas.

"Não é comum que os estudantes rejeitem a escola. Quando se fala em crianças, essa rejeição é ainda mais rara, pois elas vão em busca de ambientes novos. Os pais devem acompanhar o filho na escola o tempo todo. Não se deve esperar o ano seguinte para saber como o estudante está se relacionando na instituição", explica a especialista.

Nas primeiras séries do ensino fundamental, as escolas investem em jogos, músicas e desenhos. Essas atividades têm como objetivo acolher o estudante e repassar a mensagem de que a escola é um ambiente divertido e acolhedor. Mas nem tudo depende do professor. Além da escola, a família tem um papel importante na independência das crianças e no gosto pelos estudos. A autônoma Raiane Oliveira e o marido, Wesley de Paula Xavier, ambos de 28 anos, buscaram um ambiente acolhedor para matricular o filho, Állex Carlos de Paula, 6. Eles conseguiram uma vaga para o menino em uma creche pública em Samambaia, mas, ao chegar no local, o pequeno começou a chorar e durante vários meses se recusou a frequentar a instituição. "Assim que o colocamos lá, enfrentamos muita resistência. Ele chorava muito e não queria ficar. Os primeiros meses foram bem difíceis, mas com um tempo ele foi se adaptando", conta Raiane.

Incluir Állex no processo de preparação para o início da aula é uma das estratégias que os pais usaram para a adaptação. "Sempre o levo para comprar o material escolar e isso ajuda na expectativa pelas aulas. Todos os anos ele escolhe uma mochila de um desenho que está na moda entre as crianças. Hoje, ele já convive bem com todos e, segundo a professora, até lidera a bagunça", completa a mãe.

Raiane e Wesley incluem o filho Állex no processo de adaptação à rotina escolar, como na compra do material, para que ele não recuse frequentar a instituição | Jhonatan Vieira/Esp. CB/D.A Press

Na adolescência, os sinais são diferentes. Os estudantes conversam mais a partir do 5º ano do ensino fundamental e essa interação com os colegas aumenta à medida que as séries avançam. No entanto, em diversos momentos, as conversas podem ser um problema e motivar até mesmo faltas na escola. A estudante Nátali Danielly, 16, cursa o 2º ano do ensino médio e conta que já foi prejudicada por desviar o foco dos estudos. "Houve uma época em que eu tinha muitas amizades na escola. Eu faltava aula direto para ficar conversando, mas, com o tempo, criei mais responsabilidade", conta. "Tive sorte de nunca ter reprovado na escola. Hoje, estou mais próxima dos professores e tenho os estudos como prioridade, até mesmo porque preciso me preparar para o vestibular."

A professora Francimeire Rodrigues dá aulas de ciências para estudantes do 5º ano do ensino fundamental no Centro de Ensino Fundamental Nossa Senhora de Fátima, em Planaltina. A educadora destaca que o maior desafio em sala é lidar com os diferentes grupos. "Os adolescentes procuram pessoas com personalidades parecidas e formam grupos. Quem quer focar nos estudos procura pessoas que também têm esse objetivo. Já aqueles mais dispersos formam os grupos que atrapalham a aula. Nesses casos, eu procuro separar os estudantes que formam grupos que não focam nos estudos", afirma.

Para evitar que os estudantes se dispersem, ela procura ministrar aulas que exijam mais participação, seja para continuar a leitura que ela começou, seja para responder perguntas sobre o assunto abordado na aula. "Quem participa mais, ganha mais nota", destaca Francimeire.

Para enfrentar o bullying

Quando mesmo diante do esforço dos pais e dos professores os estudantes continuam rejeitando a escola, é hora de investigar mais a fundo o que está acontecendo. Nos casos de bullying, por exemplo, muitas vezes a criança ou adolescente sofrem em silêncio, com medo de contar aos pais. Esse receio decorre do constrangimento de levar o problema para dentro de casa ou até mesmo de temer não ser compreendido pelos familiares.

Acompanhar a vida escolar dos filhos de forma frequente é importante para evitar o bullying. Essas situações normalmente levam à mudança de escola. Caso a família opte por manter o estudante na instituição, é importante um trabalho em consonância com a direção e o corpo docente. "Se o estudante permanece na escola em que sofreu hostilidade, deve haver um trabalho conjunto com os professores e alunos. Mas é papel dos pais conversarem sempre com os filhos e identificarem possíveis problemas do tipo", alerta a psicóloga Alba Lúcia Martins.

A mudança de comportamento em casa pode dar dicas. A criança que não quer comer, fica triste durante o dia e conversa pouco pode estar sendo vítima de comentários ofensivos dos colegas. Se os pais notarem mudança de comportamento de crianças e adolescentes, é importante entrar em contato com o colégio, mesmo que por telefone. O ideal é falar com os professores, que conhecem a rotina de sala de aula.

O que fazer
Saiba como identificar problemas de relacionamento na escola e o que fazer para preveni-los e solucioná-los

Ir à escola
Os familiares devem estar presentes na vida escolar dos estudantes. Mesmo na fase da adolescência é preciso conversar com professores e não se limitar a visitar a escola apenas nos dias de reuniões com os pais.

Entender o problema
Toda resistência tem um motivo. A primeira coisa é tentar identificar o que está afastando o estudante da escola. É necessário ficar atento para situações de bullying ou a problemas familiares que estejam atrapalhando o rendimento pedagógico.

Conversar
Aproveite o caminho entre a casa e a escola para conversar com a criança e o adolescente. Pergunte como foi a aula, o que foi feito e se o estudante está gostando da instituição de ensino. Evite ligar televisores portáteis ou som alto nos automóveis quando for buscar o jovem na escola.

Atenção ao isolamento
Crianças e adolescentes que se isolam na sala de aula ou na sociedade exigem mais atenção. O isolamento pode ser motivado pela ausência de um grupo no qual o estudante se identifique ou até mesmo tristeza por ser alvo de chacota dos demais.

Buscar ajuda
Caso os problemas persistam por meses, se agravem ou o rendimento do estudante caia bastante, procure ajuda de um profissional. O ideal é buscar um psicopedagogo para problemas relacionados à escola. Geralmente as próprias instituições contam com esses profissionais em seu quadro de funcionários.

Fontes: Alba Lúcia Martins e Francimeire Rodrigues

Gastos com a lista de material escolar podem ser parcelados

A lista de material escolar chega com as contas do fim do ano anterior e as de janeiro, o que deixa boa parte do orçamento comprometida. O que muitos consumidores não sabem é que é possível parcelar gastos com esses itens, uma vez que é dever da escola fornecer um plano de execução que mostre quando cada material será usado e, portanto, em que mês será necessário adquiri-lo e entregá-lo à instituição de ensino.

A especialista em direito do consumidor Simone Magalhães, colaboradora do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon), explica que a Lei Distrital nº 4.311, de 2009, estabelece regras para instituições de ensino privadas quanto à escolha dos materiais pedidos. "Especificamente o artigo 2º fala sobre a obrigação de a escola entregar um plano de execução com a lista. Assim, os pais podem fornecer o material escolar à instituição de maneira gradativa e isso facilitaria a organização financeira da família", explica a advogada.

O problema é que a maioria dos centros de ensino não cumprem essa obrigação. De acordo com o Procon, esse índice chega a 80%. No ano passado, das 65 instituições fiscalizadas pelo órgão, apenas 11 passaram na inspeção. Simone percebe que esse é um ponto delicado na relação entre pai e escola, afinal é ali que os filhos passam boa parte do tempo e, além da formação intelectual, conceitos relacionados a moralidade e ética são transmitidos para os estudantes.

"Se os pais perceberem que o colégio não está entregando o plano de execução como é pedido por lei, o primeiro passo é conversar com a escola. Essa relação deve ser de confiança e ambas as partes precisam ter uma posição de diálogo", aconselha. Caso isso não resolva, o Procon é o primeiro órgão que os pais devem procurar. Outra opção é uma ação conjunta no Ministério Público. Geralmente o primeiro recurso é a negociação pré-judicial.

Gizeuda Lima, mãe de Vinícius, recebeu o plano disciplinar anual: A lista deste ano veio bem mais enxuta | Foto: Luis Nova/Esp. CB/D.A Press

A lista de material escolar do filho de Gizeuda Lima, 45 anos, veio acompanhada do plano disciplinar anual. O documento designava em qual período seriam utilizados os itens, além do objetivo e da descrição das atividades didáticas. A caixa de gizão de cera, por exemplo, é destinada ao aprimoramento da técnica de pintura e desenho e será utilizada ao longo de todo o ano. As quantidades pedidas também foram menores. "A lista deste ano veio bem mais enxuta. Nos anos passados, sempre me assustava com o tamanho", comemora a analista de sistemas.

Outro ponto polêmico é o pedido de itens como produtos de limpeza ou materiais de escritório, que não podem ser solicitados. Brinquedos pedagógicos ou livros de literatura para uso comum também entram no rol dos proibidos, segundo Simone Magalhães. "Uma forma de esclarecer isso é se perguntar se aquele objeto pode ser individualizado, ou seja, se o filho será o beneficiado direto do uso", explica.

A especialista Gabriela Mieto, do Departamento de Psicologia Escolar e do Desenvolvimento da Universidade de Brasília (UnB), defende que, em algumas situações, compartilhar o material faz parte do processo de formação dos pequenos. No caso de tintas coloridas, por exemplo, os professores podem reunir todas as cores dadas pelos alunos em grandes quantidades para tarefas coletivas. "É legal que a criança veja que algumas tintas não estão ali no estojo dela, mas ela aprende a dividir. Tudo isso é paralelo ao conteúdo programático."

Além da experiência em conjunto, o propósito da formação é uma das explicações para as extensas listas infantis, com vários produtos de artesanato e aparentemente desconexos da sala de aula. Enquanto os adolescentes têm foco nos conceitos teóricos, a educação infantil e os primeiros anos do ensino fundamental buscam o desenvolvimento motor e das capacidades criativas.

A psicóloga explica que produtos como tinta e massinha de modelar são auxiliares para o professor formular atividades mais interessantes aos olhos da criança. "O ensino tradicional é baseado na passividade do aluno, em ouvir o conteúdo que está sendo aparentemente transmitido", afirma Gabriela. Isso não se aplica apenas às aulas de artes plásticas, mas a todos os conteúdos que tenham contexto lúdico.

Outro exemplo são as sucatas. Caso haja uma razão pedagógica, a escola pode pedir rolos de papel higiênico para atividades natalinas, por exemplo. Além disso, as texturas são usadas como uma forma de aprendizagem psicomotora, que mais tarde facilita atividades como a escrita. "Quando a criança amassa um papel mais duro, conhece a força que ela precisa para amassar", detalha a especialista.

Para ela, qualquer material pode ser justificável nas listas em questão, desde que devidamente explicado pelo plano de aprendizagem. "É interessante colocar a justificativa para a família saber que tipo de uso a escola está planejando. A lista define se é para usar em casa, em qual aula, dá uma transparência para a família", esclarece. A compra de itens para a construção de murais pelos próprios professores, por exemplo, não é responsabilidade dos pais.

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