postado em 19/06/2008 09:18
Superlotação, comida estragada e falta de acesso à educação soam como problemas menores perto do que apontará o relatório da CPI do Sistema Carcerário. O documento, que será apresentado nesta quinta (19/06) na Câmara dos Deputados, traz um vídeo bombástico de 40 minutos com cenas estarrecedoras colhidas pelos parlamentares durante as inspeções em 60 estabelecimentos de 18 estados, incluindo Brasília e o Entorno. Presos dormindo com porcos numa penitenciária do Mato Grosso ou recebendo a refeição dentro de um saco plástico, como ocorre em Minas Gerais, são alguns dos casos críticos apontados pela CPI (leia quadro).Os deputados pedem, entre as muitas recomendações listadas no
relatório, que não haja contingenciamento das verbas do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) repassadas pelo governo federal aos estados. Do total de R$ 424 milhões autorizados para 2008, o fundo aplicou menos de 2% até agora. Mesmo contando com os empenhos (compromissos assumidos para posterior pagamento), a execução orçamentária é de pouco mais de 5%. O diretor do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), Maurício Kuehne, afirma que o ritmo de repasses está dentro da normalidade. ;No primeiro semestre do ano, nós analisamos os pedidos enviados pelos estados e só depois liberamos a verba. A execução se dá mesmo no último trimestre do ano;, diz o diretor.
Mas não é só dinheiro a preocupação dos parlamentares que integram a CPI do Sistema Carcerário. O relatório pede, ainda, o indiciamento de autoridades que administram mal os estabelecimentos penais. De acordo com Domingos Dutra (PT-MA), os casos gritantes de violações de direitos humanos passam pela responsabilidade de diretores, administradores e agentes penitenciários. Além disso, a falta de estrutura das defensorias públicas para atender juridicamente a população pobre contribui para a situação ;caótica; do sistema prisional no país. ;Estamos recomendando aos estados que façam mutirões jurídicos, visto que aproximadamente 30% dos detentos já poderiam estar soltos, segundo estimativas;, diz Dutra.
O parlamentar rechaça qualquer tentativa de desqualificar a CPI. ;Nosso trabalho não se destinou a defender privilégios para presos, mas sim trabalhar em prol de quem está solto. Se o Brasil continuar colocando na ruas todos os dias feras humanas que produziu dentro das cadeias, pagaremos uma conta muito alta em vidas, patrimônio e impostos;, ressalta o deputado, lembrando que a estimativa de custo de um preso é de R$ 1,5 mil por mês. O relatório recomenda ainda que os sentenciados sejam direcionados para presídios de acordo com o potencial ofensivo do crime. ;Cada estabelecimento abrigaria presos com o mesmo nível de periculosidade. Os mais perigosos, como Fernandinho Beira-Mar,
ficariam nas unidades federais;, afirma Dutra.
Ranking
A CPI do Sistema Carcerário apresentará uma espécie de ranking com os piores estabelecimentos entre os visitados. ;Não conseguimos ir a todos os estados por falta de tempo. E mesmo naqueles que visitamos, só conseguimos ir a um ou dois presídios. Mas posso dizer que a grande maioria está completamente falida. São piores que campos de concentração;, diz o relator. Na lista, estão a Colônia Penal Agrícola de Campo Grande (MS), onde presos foram flagrados dormindo com porcos; o Presídio Central de Porto Alegre (RS); a Penitenciária Lemos de Brito, em Salvador (BA); a Penitenciária Vicente Piragibe, no Rio de Janeiro (RJ); entre outras.
Para o presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Mozart Valadares Pires, a responsabilidade pela falência do sistema penitenciário deve ser compartilhada pelas autoridades. ;A magistratura tem a sua parcela de culpa nesse assunto. Os juízes precisam entender que a prisão não é o remédio para solucionar todos os problemas ligados aos delitos;, diz o jurista. Mozart lembra que, por conta da morosidade da Justiça e da mentalidade punitiva dos magistrados, 40% dos presos brasileiros são provisórios, ou seja, ainda não foram sentenciados.
MODELO FALIDO
Confira algumas das situações críticas flagradas pela CPI:
Colônia Agrícola Penal de Campo Grande (MS)
Dos 680 homens que vivem num espaço destinado a apenas 80, 60 dormiam dentro de um chiqueiro, junto com porcos, ou ao ar livre. Às vezes, utilizavam barracas improvisadas
Instituto Penal Paulo Salazarte de Aquirás (CE)
Os presos recebem comida dentro de sacos plásticos. Também não existem talheres no presídio. A refeição tem de ser feita com as mãos
Cadeia Pública de Contagem (MG)
Onde deveriam estar 12 presos, concentram-se cerca de 70. Eles têm uma única privada à disposição. As outras existentes no local foram retiradas para que as celas tivessem mais espaço. Cinco ou seis homens dormem encostados no sanitário