A Câmara dos Deputados e o Ministério Público Federal (MPF) deverão investigar as possíveis fraudes apontadas pelo Correio no Programa Universidade para Todos (ProUni). Reportagem do jornal revelou que estudantes autodeclarados indígenas para receber bolsas de estudo negam, agora, a ascendência. O presidente da Comissão de Educação e Cultura da Câmara (CEC), deputado João Matos (PMDB-SC), considerou grave a situação e afirmou que vai conversar com o ministro da Educação, Fernando Haddad, para averiguar as possíveis fraudes. ;Podemos ajudar o MEC ou, enquanto comissão, buscar, nós mesmos, apurar as responsabilidades. Mas tenho certeza de que o ministro também terá interesse em investigar.; Já a procuradora federal Luciana Loureiro, da Procuradoria dos Direitos do Cidadão, disse que aguarda a manifestação da comunidade indígena para abrir uma investigação. Regulamentado em 2005, o ProUni concede bolsas parciais ou integrais para estudantes de baixa renda estudarem em instituições particulares de nível superior. Parte desses benefícios é reservada aos que se dizem indígenas. A autodeclaração é utilizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para definir a raça à qual pertencem os cidadãos brasileiros. Como não há exigência de comprovação, alguns estudantes afirmaram ser descendentes de índios na ficha de inscrição, embora tenham negado qualquer ligação com etnias aos serem procurados posteriormente pela reportagem. Em artigo (leia ao lado), o secretário de Educação Superior do Ministério da Educação, Ronaldo Mota, afirma que ;o MEC desconhece qualquer ação sistêmica relativa ao uso indevido do expediente da autodeclaração;. No entanto, o ex-presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai) Mércio Gomes afirmou domingo passado em seu blog que levou a denúncia ao MEC, apresentando queixa formal ao ex-secretário de Educação Superior Nelson Maculan. Segundo Mércio, o secretário reconheceu ;a impropriedade de se fiar na autodeclaração como critério único de reconhecimento de identidade;. ;Mas não mudaram as regras para que a Funai tivesse um dizer sobre isso;, prossegue o antropólogo. Para a deputada Raquel Teixeira (PSDB-GO), integrante da CEC, a autodeclaração tem se mostrado um instrumento ambíguo e equivocado. Embora favorável a políticas de inclusão ao ensino superior, ela diz que outros caminhos devem ser encontrados. Cita, por exemplo, o projeto da Universidade de Campinas (Unicamp) que, nos vestibulares, acrescenta 30 pontos na nota final de todos os secundaristas egressos de escolas públicas. Já o senador Cristovam Buarque (PDT-DF), presidente da Comissão de Educação do Senado e ex-ministro da Educação, defende mudanças no ProUni. ;O ProUni era para apoiar estudantes que não tinham condições de pagar os estudos na área de licenciatura e pedagogia, independentemente da raça. Está descaracterizado. Não deve ser para cotistas, mas para quem quer ser professor e alfabetizador;, afirma. Manifestação Segundo o líder indígena Eli Ticuna, estudantes índios matriculados em universidades de Brasília se reúnem hoje na Câmara para preparar uma representação ao MPF solicitando a investigação das possíveis irregularidades no programa. Para a procuradora Luciana Loureiro, a reportagem do Correio mostra que ;podem estar ocorrendo fraudes eventuais no programa;. Os casos apontados podem viabilizar o início das investigações. Ela faz o monitoramento do ProUni e afirma que o programa tem sido aperfeiçoado nos últimos anos. Esclarece que o cadastramento pela internet é a primeira fase da inscrição. Depois disso, é realizada uma prova de abrangência nacional. ;Quem atinge determinada nota pode se habilitar a uma vaga na faculdade que escolher. Nessa segunda fase, eles precisam comprovar que são índios. É nesse momento que pode estar havendo alguma irregularidade;, comenta. Ela avalia ainda que as faculdades podem ser negligentes, aceitando a autodeclaração mesmo sem receber a documentação que comprove a descendência indígena dos estudantes. Mas salienta que somente uma investigação poderia apontar possíveis ilegalidades. Ela diz acreditar que qualquer irregularidade não passa pela Fundação Nacional do Índio (Funai) nem pelo Ministério da Educação, que têm sido monitorados pelo Ministério Público.
A frase
"Podemos ajudar o MEC ou buscar apurar as responsabilidades" João Matos, presidente da Comissão de Educação e Cultura da Câmara Ouça entrevista: com o senador Cristovam Buarque