Jornal Correio Braziliense

Brasil

Ajuda que não chega para as crianças

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Apenas cinco das 27 unidades da Federação foram contempladas, desde o início do ano até 11 de agosto, com mais de 50% das verbas previstas no Orçamento da Criança e do Adolescente (OCA). Levantamento feito pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) a pedido do Correio mostra que na maioria das unidades da Federação e no Distrito Federal, menos da metade do dinheiro chegou aos cofres públicos locais. A situação mais grave é a do Acre, onde os investimentos do governo federal correspondem a 25,41% dos R$ 29,5 milhões aos quais o estado tinha direito, conforme previa a Lei Orçamentária Anual (LOA).

Metodologia criada pelo Inesc para medir os investimentos feitos na infância e na adolescência, o OCA reúne 23 programas de diversos ministérios voltados ao atendimento de meninos e meninas em diversas áreas, como saúde, educação e saneamento. Esse conjunto de programas foi contemplado com R$ 40 bilhões na LOA, para serem divididos este ano entre as 27 unidades da Federação. O valor inclui as transferências de renda do Bolsa Família e os repasses constitucionais do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) que, juntos, correspondem a 75% do OCA. Reportagem do Correio publicada ontem mostrou que, a menos de quatro meses do fim do ano, somente metade do previsto foi executado. O restante do dinheiro permanece parado no caixa.

Para o assistente de política fiscal do Inesc, que elabora as tabelas do OCA para o Senado Federal, Lucídio Bicalho, o maior problema é o contigenciamento dos recursos feito pelo governo federal ; até agora, foram retidos R$ 19,4 bilhões. O especialista argumenta que, devido à economia feita para engordar o superávit primário, os programas da área social, que não têm garantia constitucional para receber os repasses, acabam prejudicados.

É por esse motivo, segundo o especialista, que a LOA muitas vezes acaba sendo fictícia. Ou seja, embora a lei estabeleça um teto para cada programa (o chamado ;orçamento autorizado;), dificilmente esse dinheiro é efetivamente aplicado. Mesmo depois de o Congresso aprovar os valores, é possível contingenciar a verba.

Responsabilidade
Mas o governo federal não é o único responsável por esse quadro. O coordenador da Comissão de Orçamento do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), José Ricardo Caporal, explica que vários fatores influenciam a baixa execução orçamentária. Entre elas, o não-cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, o que impede repasses a estados e municípios com pendências tributárias. Caporal explica que ao não cumprir os requisitos exigidos pela lei, governadores e prefeitos acabam impedindo que os recursos beneficiem àqueles a quem são destinados.

;Isso demonstra uma falta de compromisso com a criança e o adolescente;, lamenta Helder Delena, coordenador do programa Prefeito Amigo da Criança da Fundação Abrinq. Delena diz que são poucos os governos estaduais e as prefeituras que fazem um controle do orçamento da infância. Em junho passado, 132 prefeituras foram certificadas como ;amigas da criança; por terem utilizado a metodologia do OCA. ;É um número ainda incipiente, mas é uma etapa;, diz.

Outro problema é que, muitas vezes, os estados demoram a enviar os projetos nos quais especificam a aplicação do dinheiro. Somente de posse desses documentos é que a verba pode ser repassada. Em alguns casos, porém, os próprios ministérios demoram para analisar os projetos enviados. ;Isso significa falta de eficiência da gestão;, critica. A reportagem procurou a Subsecretaria da Criança e do Adolescente, da Presidência da República, mas não obteve resposta.

Distrito Federal
Quanto ao orçamento que os próprios estados dispõem para programas voltados à criança e ao adolescente, Lucídio Bicalho afirma que o controle social fica mais restrito, já que nem todos disponibilizam essa informação ao público. ;A falta de transparência dificulta muito o trabalho;, diz.

No Distrito Federal, porém, o Fórum de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, composto por 21 entidades, elaborou um relatório no qual faz um diagnóstico pouco animador. O documento mostra que a baixa execução dos programas voltados a essa faixa etária em 2008 segue a tendência de anos anteriores. Em 2006 e 2007, foram gastos 64% e 63% dos recursos, respectivamente. Este ano, até 11 de agosto, haviam sido executados 42,07%.

A área mais problemática é a do sistema de garantias de direitos, que inclui a manutenção do Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente, o Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente, e os conselhos tutelares. Segundo o fórum, dos R$ 3,8 milhões autorizados para o Fundo, nenhum centavo foi executado. Dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) mostram que, o conselho de direitos executou, até 11 de agosto, 2,58% do orçamento disponível. A partir do ano que vem, o DF adotará o OCA, como determina lei sancionada este ano pelo governador José Roberto Arruda.

A frase

"Há uma falta de compromisso com a criança e o adolescente"
Helder Delena, coordenador do programa Prefeito Amigo da Criança da Fundação Abrinq

O número
75%
do Orçamento da Criança e do Adolescente são formados por programas de transferência de renda e pelo Fundeb