Brasil

Rápido, mas supletivo pode ser ineficaz

É preciso cuidado na hora de escolher um curso. Há escolas que prometem o diploma em um mês, mas não garantem o aprendizado. Rede pública oferece opções presenciais e a distância

postado em 20/08/2008 09:28

A proposta é tentadora: concluir o ensino fundamental ou o médio em um mês. É o que prometem diversos cursos que divulgam seus serviços em classificados, panfletos ou na internet. Às vezes, o tempo é ainda mais curto. Em uma dessas escolas, o estudante pode optar pelo plano VIP, que custa R$ 1.200, e terminar um ciclo de ensino em 20 dias. O certificado de conclusão, reconhecido pelos órgãos públicos, é garantido. Mas o mesmo não se pode dizer sobre o aprendizado, o que pode levar muitos à frustração. Foi o que ocorreu com o garçom Wanderlei*, 38 anos. Com a 5; série concluída, ele sonha terminar os estudos para conseguir um emprego melhor. ;Como trabalho à tarde e à noite, achei ótimo quando vi a propaganda do supletivo;, diz. Num panfleto que pegou na rua, o anúncio prometia: ;Supletivo ultra-rápido;. Para terminar o nível fundamental e o médio em um mês, o garçom desembolsou R$ 1.200, o dobro do que ganha por mês. ;Me entregaram uma apostila e disseram que, dali a quatro semanas, iam aplicar a prova. Fiquei totalmente na mão;, conta. Ele tentou pegar o dinheiro de volta, mas ainda não conseguiu. ;Eu pensei que ia aprender. A secretária do curso disse que as provas são fáceis. Mas do que adianta um diploma sem você saber nada?;, questiona. A presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), Clélia Brandão Alvarenga, concorda com Wanderlei. ;Com esses cursos, é impossível aprender alguma coisa. Embora não exista a exigência de que o candidato faça o curso todo, do ponto de vista educacional, eles não atendem as expectativas;, diz. As diretrizes da EJA serão assunto da próxima reunião do CNE, em setembro. Os chamados ;supletivos a jato; se valem do artigo n; 23 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) para distribuir certificados a alunos que têm pressa em recuperar o tempo perdido. A legislação permite que qualquer estudante, mesmo do ensino regular, seja reclassificado, podendo avançar de série caso os professores avaliem que ele tem condições para isso. Nesses cursos de rápida conclusão, o aluno da Educação de Jovens e Adultos (EJA) pode colocar a mão no diploma mesmo sem pisar na sala de aula. ;Se você se matricula num dia, faz a prova no outro e passa, nada impede que receba o certificado;, exemplifica a subsecretária de Planejamento e Inspeção do Ensino da Secretaria de Educação do DF, Solange Paiva Castro. A prática não é ilegal, desde que a escola seja credenciada. Embora muitas instituições afirmem que possuem autorização do Ministério da Educação (MEC), não é esse o órgão responsável pelo credenciamento. A tarefa cabe às secretarias estaduais e municipais de educação. O maior problema é que a maioria das instituições que oferecem a conclusão rápida omite informações fundamentais. ;Na maioria das vezes, o aluno não é suficientemente informado a respeito do que se propõe o curso;, lamenta Castro. Ela recomenda que pessoas que querem voltar a estudar procurem, primeiramente, a rede pública. No DF, além dos cursos presenciais, há oferta na modalidade a distância. A partir do ano que vem, os alunos da EJA poderão usar a Telematrícula. Fiscalização Com a popularização da internet, cresceu muito a oferta de cursos de EJA a distância. De acordo com Solange Castro, a fiscalização das escolas fica mais difícil. Isso porque a modalidade é credenciada pelo MEC e pode operar em qualquer estado, bastando instituir pólos presenciais onde opera. ;Só conseguimos pegá-las pelo alvará. Se o pólo não tiver alvará de funcionamento, informamos a Secretaria de Governo;, diz. Ela, porém, esclarece que não há nada de errado com cursos a distância. ;O fato de o curso ser a distância não significa que é de má qualidade;, diz. O próprio GDF oferece essa modalidade para o segundo e o terceiro segmentos de EJA, equivalentes ao ensino fundamental e médio, respectivamente, no Centro de Educação de Jovens e Adultos da Asa Sul (Cesas). O aluno estuda em casa, tira dúvidas com os professores e faz as provas na escola. ;O ensino a distância é a saída para a educação no Brasil;, acredita Luzirene Leite, coordenadora do curso. Ela diz que a modalidade facilita o acesso à educação para quem tem problemas de locomoção ou sente vergonha de voltar a estudar depois de anos, por exemplo. Para João Paulo Vasconcelos Albino, 19 anos, o curso do Cesas possibilitou a realização de um sonho: o ingresso na universidade. No ano passado, o jovem se matriculou no terceiro segmento de EJA. Queria recuperar o tempo perdido. Além de ter sido reprovado no 3; ano do ensino médio, ele ficou dois anos sem estudar. De família humilde, precisava trabalhar durante o dia numa lanchonete e não tinha tempo para os estudos. ;Além de estudar em casa, sempre havia professores para tirar as dúvidas;, diz.

Frases

"Eu pensei que ia aprender. Mas do que adianta um diploma sem você saber nada?" Aluno de um curso supletivo de curta duração "O fato de o curso ser a distância não significa que é de má qualidade" Solange Paiva Castro, subsecretária de Planejamento e Inspeção do Ensino do DF * Nome fictício a pedido do entrevistado Confira relação das escolas públicas do DF que oferecem EJA

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação