postado em 26/08/2008 18:30
São Paulo - O Ministério Público Federal e a Advocacia Geral da União entraram nesta terça-feira (26/08) na Justiça Federal de São Paulo com ação civil pública e pedido cautelar para indisponibilizar os bens e quebrar os sigilos bancário e fiscal do ex-reitor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) , Ulysses Fagundes Neto, do vice-reitor, Sérgio Tufik, do atual chefe de gabinete da reitoria, Reinaldo Salomão, e da ex-chefe de gabinete da reitoria Lucila Amaral Carneiro Vianna por atos de improbidade administrativa. O MPF pede também o afastamento de todos de seus cargos para apurar as demais ilegalidades cometidas por eles e preservar os interesses da universidade. O reitor Fagundes Neto pediu demissão nesta segunda-feira.
De acordo com o procurador Sergio Suiama, autor da ação, os réus vêm atuando com claro propósito de dificultar a apuração das ilegalidades praticadas. O procurador entende que a improbidade administrativa está caracterizada em três momentos: a primeira relacionada a 13 viagens ao exterior ocorridas nos anos de 2006 e 2007; a segunda, pela violação do regime de dedicação exclusiva, que culminou em enriquecimento ilícito por parte do reitor; a terceira, pelo uso irregular do cartão corporativo em despesas pessoais nacionais.
O MPF quer que os réus sejam condenados a restituir integralmente à Unifesp as importâncias recebidas indevidamente. O procurador pede ainda que os acusados percam os bens e valores acrescidos ilicitamente aos seus patrimônios. Também seja destituídos dos cargos que exercem na universidade, não possam contratar com o poder público e tenham os direitos políticos suspensos por dez anos. Além disso, na ação, é solicitado o pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial obtido.
O vice-reitor, a ex-chefe de gabinete e o atual chefe de gabinete são considerados réus pelo MPF porque participaram dos atos ilegais praticados dentro da universidade. Segundo o MPF, eles autorizaram o pagamento de diárias, passagens e do cartão corporativo utilizado pelo reitor.
As viagens realizadas pelo reitor da Unifesp foram analisadas pelo Tribunal de Contas da União, que detectou várias irregularidades. Segundo o relatório do TCU, em todas as viagens, o reitor comprou passagens aéreas de primeira classe ou classe executiva e se utilizou do cartão corporativo como se fosse seu.
Com o cartão público, comprou equipamentos eletrônicos nos EUA, roupas esportivas em Berlim, souvenirs em Orlando (Disney Gift Shop), alugou carros, visitou lugares turísticos e freqüentou restaurantes caros. Também hospedou-se, com acompanhante, em hotéis luxuosos em Paris, Londres, Cancún, Orlando, Pequim, Berlim e Salt Lake City.
"As despesas da universidade com as viagens internacionais do reitor são ilegais, porque as finalidades buscadas pelo ato não eram públicas, mas sim privadas. O reitor se valeu das prerrogativas que o cargo lhe conferia para fazer turismo de luxo", destacou o procurador.
Todas essas viagens foram bancadas pela Unifesp e os pagamentos foram efetuados com o cartão corporativo. O total das despesas internacionais e demais atos de improbidade somam cerca de R$ 230 mil.
Segundo o "Portal Transparência", do Governo Federal, este ano, o reitor da Unifesp consumiu, sozinho, 89,34% do total dos recursos públicos destinados ao pagamento das faturas do cartão corporativo da Unifesp.
Além do emprego abusivo e ilegal do cartão, o TCU também detectou desvio de finalidade nas viagens empreendidas por Fagundes Neto. Foi apurado que, com exceção de uma viagem, todas as outras foram usadas pelo reitor para participar de eventos de sua especialidade médica, a gastroenterologia. Nenhum outro professor da área teve o mesmo tratamento. Dos 13 professores que ensinam as disciplinas de Gastroenterologia e Gastroenterologia Pediátrica na Unifesp, nenhum deles teve diárias e passagens para participação em congressos internacionais custeadas pela universidade.
Depois que tomou posse do cargo, o reitor providenciou, com auxílio dos funcionários citados na ação do MPF, que a administração pública patrocinasse treze viagens, sendo doze delas diretamente ligadas a eventos de sua área de interesse profissional e não ao exercício da função de dirigente de uma instituição universidade pública.
De acordo com o MPF, mesmo estando submetido ao regime de dedicação exclusiva na Unifesp, o que o impede de exercer outra atividade remunerada, o reitor possui um consultório no bairro Vila Mariana, em São Paulo, onde exerce atividade em sua área de atuação: a pediatria gastroenterológica. Fagundes Neto prestou várias consultas médicas no ano de 2004. Segundo levantamento feito pelo MPF junto às empresas de plano de saúde, ele realizou 26 consultas particulares.
"A infração ao regime de dedicação exclusiva importou em enriquecimento ilícito por parte do reitor", afirmou Suiama.
O reitor também prestou, ilegalmente, serviços de consultoria à empresa INSINCconsulting, de quem recebeu US$ 10.419,00 para pagamento de honorários e US$ 8.805,34 para pagamento de viagens e hospedagem. A serviço da empresa, ele utilizou o cartão corporativo da universidade para pagar suas passagens e suas despesas com viagens a Montreal (2007) e Londres (2007). Em ofício encaminhado ao TCU, o reitor disse se tratar de "consultoria esporádica", mas o serviço em que ele prestou consultoria durou dez meses de trabalho, de junho de 2007 até abril de 2008.
O cartão corporativo do reitor também foi utilizado para pagamento de despesas nacionais de caráter particular, como restaurantes e farmácias. Segundo o MPF, o reitor também utilizou o cartão para adquirir livros de entretenimento, em uma livraria do aeroporto de Cumbica. Para o procurador, apesar do pequeno valor das despesas nacionais, Fagundes Neto, com a conivência dos demais acusados, passou a usar o cartão corporativo como se fosse seu.
O MPF também emitiu três recomendações. Na primeira,dirigida ao Ministério da Educação e ao Conselho Universitário (CONSU), da Unifesp, é pedida a instauração de sindicância em face dos acusados para apurar as irregularidades apontadas. Nos outros dois documentos, é recomendado que o Ministério da Educação e o CONSU regulamentem o afastamento de docentes e servidores que participarem de congressos e eventos fora do país, que os dois órgãos exijam dos funcionários, que viajarem com o custeio da universidade, uma estimativa com todos os custos envolvidos e que apurem qual a finalidade da viagem, o trajeto e, principalmente, se não viola o regime de dedicação exclusiva previsto no artigo 14 do decreto n° 94.664/87.
À Unifesp também é recomendado que siga critérios que garantam a igualdade de oportunidades e o estabelecimento de regras claras e objetivas quanto à escolha de docentes para participarem de congressos e eventos de capacitação nacional e internacional.