postado em 06/09/2008 08:46
Reza a Constituição que todos são iguais perante a lei. Para representantes da população indÃgena, essa determinação, além de não sair do papel, os exclui. Levantamento feito pelo Observatório dos Direitos IndÃgenas (ligado à organização não-governamental Centro IndÃgena de Estudos e Pesquisas, o Cinep) e pelo Conselho IndÃgena de Roraima (CIR) ressalta que o cumprimento das garantias constitucionais dos Ãndios está muito abaixo do que ocorre com os direitos da população brasileira em geral. O mapeamento considera a situação grave, principalmente nas questões fundiárias e de saúde. Inclui no problema até mesmo iniciativas governamentais como a construção de hidrelétricas e as obras de transposição do Rio São Francisco.
;O Estado tem muito a melhorar na efetivação das leis que existem;, avalia a Ãndia uapixana Joênia Batista de Carvalho. Advogada dos povos da Raposa Serra do Sol (RR) na ação em julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) questionando a demarcação contÃnua dos 1,7 milhão de hectares da reserva, Joênia acompanha 20 processos contra demarcações em áreas indÃgenas no Norte que, segundo ela, podem ir por terra com uma decisão favorável aos Ãndios no STF. ;esperança de mudança está no julgamento do STF;, destaca. De acordo com a advogada, a situação fundiária é ;feia; para 15 mil indÃgenas que vivem em 3 mil hectares no Mato Grosso do Sul. ;Além da falta de terra, eles sofrem problemas como desnutrição devido à escassez de alimento;, diz.
Entre os conflitos fundiários, a advogada considera preocupante o aumento da violência no Nordeste e lamenta não ter como defender os direitos indÃgenas na região. ;O assassinato de guajajaras (no Maranhão) e trucas (em Pernambuco) é um atentado à vida, à integridade fÃsica e à liberdade;, observa. A geógrafa Cristiane Julião, secretária-executiva do Cinep, lembra que a questão territorial para os Ãndios é de subsistência e não de exploração. ;Ninguém está com interesse de construir prédios ou fazer resort, o ponto crucial é que a população indÃgena cresce e precisa de espaço. É necessário pensar em alternativas de energia e alimento para a nação que não ameacem a população indÃgena;, defende.
CrÃticas
O presidente da Comissão Nacional de Assuntos Fundiários e IndÃgenas da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Leôncio Brito, ressalta que a construção de hidrelétricas e a expansão agrÃcola atendem a necessidade da população brasileira que também aumenta, mas não acredita que o interesses devem se sobrepor. ;Os investimentos beneficiam também os Ãndios. É possÃvel respeitar o direito de todos sem prejudicar um determinado povo, mas a forma como estão tratando o direito indÃgena à terra leva à segregação;, avalia.
Para o constitucionalista Ives Gandra, o direito dos Ãndios não pode se sobrepor ao da nação. ;Em um eventual choque, o interesse nacional tem que prevalecer;, defende. Gandra faz referência ao embate dos indÃgenas contra obras de infra-estrutura como hidrelétricas e contra a transposição do Rio São Francisco. O coordenador-geral dos direitos indÃgenas da Fundação Nacional do Ãndio (Funai), Paulo Celso de Oliveira, contra-argumenta: ;O paÃs precisa crescer, mas sem desrespeitar os direitos indÃgenas;, defende. Ele reconhece os impasses fundiários apontados pelo Observatório, mas minimiza os conflitos. ;Os problemas estão sendo resolvidos na Justiça Federal;, pontua.
Na área da saúde, o governo admite a diferença entre o tratamento da população em geral e dos indÃgenas. ;Realmente o acesso ao serviço (de saúde) para a população indÃgena está muito longe daquele que a gente deseja;, reconhece o médico infectologista Jaime Valêncio, consultor do Departamento de Saúde IndÃgena (Desai) da Fundação Nacional de Saúde (Funasa). Segundo Valência, em algumas regiões as distâncias geográficas e a infra-estrutura oferecida pelo Sistema Único de Saúde (SUS) contribuem para a carência no atendimento médico. ;Começando pela quantidade de profissionais de saúde;, observa.
Alerta no Amazonas
A população indÃgena do Vale do Javari, no extremo sudoeste do Amazonas, apresenta taxas de mortalidade geral, infantil e de casos de malária muito acima das toleradas pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Os casos de malária (893,60 por mil ocorrências) estão 19 vezes acima do Ãndice parasitário anual admitido pela OMS (50 ocorrências por mil). A constatação foi feita durante operação da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) em conjunto com o Ministério da Defesa na região, entre 19 de abril e 21 de junho deste ano.
;Essas são as situações mais preocupantes;, avaliou o médico infectologista Jaime Valência, do Departamento de Saúde IndÃgena (Desai) da Funasa. Apesar da constatação, Valência ponderou que a população local é de 3.473 indÃgenas. ;O ideal é não usar os mesmos parâmetros aplicados para a população em geral e sim tratar de números absolutos;, observou. Além dos altos Ãndices de malária, os técnicos da saúde constataram problemas de anemia, parasitose e hepatites virais.
De acordo com o diretor do Desai, Wanderley Guenka, é preciso reorganizar a equipe e mudar a estratégia de atuação na área, além de melhorar a estrutura na reserva.
Confira o que o médico infectologista Jaime Valêncio fala sobre a operação Vale do Javari que oferece atendimento a população do Amazonas