postado em 20/09/2008 15:28
A máfia das CNHs vendeu carteiras de habilitação expedidas pela sede do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) a motoristas de São Paulo. As suspeitas atingem quase 40% das 800 auto-escolas e centros de formação de condutores (CFC) da capital. Ao todo, estão sob investigação 15 224 carteiras emitidas em 2007 na Circunscrição Regional de Trânsito (Ciretran) de São Paulo, sob controle direto do Detran. Elas foram feitas com o uso de apenas 1.947 impressões digitais - cada vez que alguém tira uma CNH, é obrigado a registrar a impressão digital em leitor eletrônico, pelo chamado sistema de biometria. Na pior fraude, uma única digital foi usada por 1.341 candidatos.
Só com o golpe das digitais, a máfia pode ter lucrado até R$ 15 milhões, pois cada carta era vendida por R$ 500 a R$ 1,2 mil. A existência do esquema havia sido revelada à reportagem em junho por delegados e despachantes. Na semana passada, a "Agência Estado" teve acesso à íntegra do levantamento feito pela Companhia de Processamento de Dados do Estado (Prodesp) a pedido do Detran sobre as fraudes na biometria.
O documento integra o Inquérito 314/08. Aberto no Detran, ele ainda não levou a indiciamentos. Coincidentemente, foi instaurado em 2 de junho, um dia antes de ser deflagrada a Operação Carta Branca, que pôs na cadeia 19 acusados de fraudes na Ciretran de Ferraz de Vasconcelos. A reportagem constatou nesta semana que a venda de facilidades para obter uma CNH em São Paulo segue a todo vapor.
Os casos detectados pela Prodesp tratam das 15,2 mil carteiras - primeira habilitação - suspeitas de 2007 e envolvem 310 auto-escolas e CFCs. Desta vez, a maioria dos candidatos que tiraram a carteira fraudulentamente é de pessoas que têm CPF expedido em São Paulo. Até então, a maior parte dos beneficiados era de motoristas de outros Estados. Em cinco casos, uma mesma digital foi usada para registrar no Detran mais de 500 candidatos.
Dois meses depois de instaurado o inquérito, a 2ª Delegacia de Acidentes de Trânsito, incumbida pela direção do Detran de apurar a fraude, só havia resolvido intimar os donos de 24 auto-escolas e um CFC, mas só três deles e três motoristas supostamente beneficiados foram ouvidos até 30 de julho. Todos alegaram inocência. Nesse ritmo, a polícia deve demorar 430 anos só para ouvir todos os donos de carteiras e de auto-escolas e CFCs. Para acelerar a apuração, o Detran criou uma força-tarefa.
"A fraude é tão grande que será difícil apurar as responsabilidades de todos os envolvidos antes que ocorra a prescrição dos crimes, até porque não há gente suficiente para apurar, denunciar e julgar essas pessoas", disse um delegado. Segundo ele, o sistema de biometria é só um dos problemas no Detran. "Como a artilharia, ali tem fraude de todo calibre."