postado em 28/09/2008 16:58
Foi com "perplexidade" e "surpresa" que o Movimento dos Sem-Terra (MST) recebeu a notícia da decisão da governadora do Pará, Ana Júlia Carepa (PT), de promover a cabo mais de 80 soldados que participaram do massacre de trabalhadores rurais em Eldorado do Carajás, no sudeste paraense, ocorrido em abril de 1996. Os líderes do movimento avaliam que a promoção incentiva atos de violência no campo.
"É uma manifestação extremamente perigosa", disse Ulisses Manaças, da coordenação nacional do MST. "A decisão irresponsável do governo premia a impunidade". Ele observou que a Justiça do Pará aceitou pedidos de prisão preventiva contra líderes de sem-terra e mandou o movimento pagar indenização por danos que teriam sido causados à Vale, segunda maior mineradora do mundo. "O problema é que a decisão da governadora ocorre num momento em que o MST sofre um processo de criminalização", disse Manacás.
Manaças relata que, na semana passada, líderes do movimento se reuniram com representantes do governo do Estado, mas não foram informados de que Ana Júlia iria promover os soldados - os militares ainda respondem na Justiça pelos assassinatos. A governadora alterou uma lei que só permitia a promoção de oficiais que respondem processos judiciais.
"Ela promoveu agentes do Estado que promoveram crime", disse o líder sem-terra. "Não é o MST quem condenou os assassinos, mas a sociedade brasileira".
O massacre
O massacre de Carajás ocorreu na curva do "S", num trecho da rodovia que liga Marabá a Eldorado, quando 155 policiais do Pará atiraram num grupo de sem-terra que obstruía a estrada. A ação resultou na morte de 19 pessoas e dezenas de feridos.
Todos os oficiais e militares de baixa patente que participaram da ação liderada pelo coronel Mário Pantoja e pelo major José Maria Pereira de Oliveira estão em liberdade. Para Ulisses Manaças, a situação é contraditória. Em abril Ana Júlia assinou lei concedendo pensões especiais para 22 dos 69 mutilados no massacre. "Essa promoção de soldados é a cara do governo do Estado, formado inclusive pelo grupo do deputado do PMDB Jáder Barbalho", disse. "Os soldados e oficiais deveriam estar na cadeia."
Defesa
Em nota, o governo paraense argumentou que os soldados não foram condenados pela Justiça. A promoção deles pode dar fôlego a outro grupo de militares de baixa patente, no caso do Exército, que reivindica reparação do governo federal. No rastro da indústria das indenizações milionárias para vítimas do regime militar, soldados e cabos que participaram do combate à Guerrilha do Araguaia (1972-1975), também no sudeste paraense, passaram a buscar laudos e testemunhos para ter o direito de reivindicar parte do dinheiro. Tanto militares de baixa patente quanto oficiais das Forças Armadas participaram da operação, que deixou mais de 60 guerrilheiros mortos.