postado em 08/10/2008 09:44
;O menino apertava meu pescoço sem motivo. Eu só baixava a cabeça na banca e chorava. Minha mãe sempre me ensinou a não devolver a violência.; A cena, contada por uma criança de apenas 11 anos, aconteceu no ano passado dentro de uma escola pública de Olinda, na Região Metropolitana de Recife. Depois de meses de tormento, a família do menino decidiu mudá-lo de escola, porque ele já se recusava a ir às aulas com medo dos espancamentos promovidos pelo colega. Rotinas de bullying (atos de violência física ou psicológica no ambiente escolar), castigos físicos e violência sexual ainda são comuns nas escolas públicas ou particulares.
Pode sair do Nordeste do Brasil um exemplo de transformação dessa realidade. Duas escolas públicas de Pernambuco e uma do Maranhão foram escolhidas pela ONG inglesa Plan, que atua em vários países, para iniciar ações que garantam o direito da criança a aprender sem medo. A iniciativa nos dois estados brasileiros faz parte de uma campanha mundial para acabar com a violência nas escolas.
O assessor nacional de educação da Plan no Brasil, Charles Martins, disse que as escolas escolhidas vão criar oficinas com crianças e adolescentes para discutir o conteúdo dos direitos humanos dentro do contexto escolar. ;Um dos resultados dessas discussões será a construção de comitês de direitos de crianças formados pelas próprias crianças. Eles se transformarão em protagonistas sociais sobre o tema e assim o projeto poderá ser ampliado para o resto do país;, explicou Martins. A iniciativa será posta em prática no início do próximo ano letivo e as escolas ainda estão sendo contatadas para fechar o convênio com a ONG.
Pesquisa
A entidade divulgou ontem, mundialmente, dados de violência escolar em vários países. O estudo apontou que, no Brasil, 84% de 12 mil estudantes de cinco capitais (Belém, Salvador, Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo) e no Distrito Federal reportaram suas escolas como violentas; cerca de 70% afirmaram terem sido vítimas de violência escolar; um terço dos estudantes afirmou estar envolvido em bullying, seja como agressor ou vítima. Quando questionadas a respeito de castigo corporal, crianças brasileiras de 7 a 9 anos disseram que a dor nem sempre é só física. Declararam sentir ;dor no coração; e ;dor de dentro;.
Dos 197 países monitorados pela iniciativa global, 90 permitem, legalmente, que os professores batam em crianças. ;Mesmo em países em que o castigo corporal é ilegal, as leis que protegem as crianças freqüentemente não são cumpridas;, diz um trecho do documento.
O estudo divulgado pela Plan aponta que uma das conseqüências mais graves do castigo corporal é o ferimento físico ou mesmo a morte. Além disso, as crianças vítimas tendem a abandonar os estudos. Já as vítimas do bulliyng podem perder a auto-estima, sentir-se envergonhadas, sofrer de ansiedade e passar a odiar a escola. Quando o problema é a violência sexual, além de a criança sofrer o trauma físico e psicológico, fica sob o risco de infecções sexualmente transmissíveis e da gravidez indesejada.
O trabalho da ONG destaca a necessidade de mudança nas técnicas usadas em classe, por meio de treinamento de professores, conscientização dos direitos infantis e estabelecimento de normas claras quanto ao comportamento na escola. O apoio dos professores e pais é essencial. Escolas que mantêm elos com suas comunidades também têm mais chances de êxito. ;Programas eficientes são aqueles baseados no incentivo, não na repressão;, diz um trecho do documento. Mais informações sobre violência escolar podem ser obtidas no site da entidade: www.plan.org.br.
Alunos agressivos
A professora Rivani Nasário convive com uma realidade onde a violência escolar é constante. Juntou-se a duas professoras e preparou um trabalho de pós-graduação em administração escolar. O resultado da pesquisa Agressividade escolar ; Como solucionar? revelou que 60% dos professores ouvidos consideram que a agressividade dos alunos começa com palavrões, xingamentos contra a mãe e, por fim, violência física. Outros 40% dos entrevistados disseram que as drogas e bebidas alcoólicas estão por trás do início das agressões.
O trabalho, que ainda é inédito, apontou também que a falta de diálogo entre pais e professores, a desigualdade social e a ausência de um apoio psicopedagógico na escola são os fatores que mais contribuem para o surgimento da agressividade nos alunos, na opinião de 80% dos entrevistados. Outros 20% de professores ouvidos acreditam que a crise familiar, a televisão e a internet são as grandes vilãs da agressividade escolar.