Brasil

Médicos e usuários de talidomida desconhecem orientação para evitar gravidez

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postado em 16/10/2008 08:28
Homens que ingerem medicamentos com talidomida e que mantenham vida sexual ativa com mulheres em idade fértil devem usar preservativos para evitar a gravidez das parceiras. Cinqüenta e dois anos após ter sido colocada à venda, ainda restam dúvidas sobre se a quantidade da substância eliminada pelo sêmen de usuários do remédio pode ou não causar danos ao feto. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou, por e-mail, que o risco ;não se trata de uma hipótese desconhecida;, o que motivou a agência a publicar, em 2003, uma resolução (RDC nº 140/03) orientando o fabricante a incluir na bula do remédio a recomendação para que usuários de talidomida, mesmo que tenham sido submetidos à vasectomia, adotem barreiras para evitar que as parceiras engravidem. Restrita à bula, a orientação vem sendo ignorada. Enquanto alguns pacientes sequer chegam a receber a bula nos postos públicos onde o medicamento é distribuído (a venda em farmácias é proibida), médicos e profissionais de saúde dizem jamais terem sido alertados sobre as ameaças que a substância pode causar em caso de gravidez. Todos os profissionais ouvidos pela reportagem (a maioria pediu para não ser identificada) justificaram o desconhecimento, alegando se orientar e atender a todas as orientações da Portaria nº 354. Publicada em 1997 pela antiga Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, órgão que deu origem à Anvisa, a portaria disciplina a distribuição e o uso da talidomida no Brasil. A medida estabelece que a talidomida só pode ser indicada e usada no âmbito dos programas do Sistema Único de Saúde (SUS) para o tratamento da Hanseníase, DST/Aids e doenças crônicas degenerativas e proíbe a venda do produto em farmácias. O médico é obrigado a assinar um termo assumindo a responsabilidade por prescrever a substância. Uma das vias do documento é enviado à Coordenação Estadual do programa de saúde. A outra cópia deve ser anexada ao prontuário do paciente. Redigida numa época em que a excreção da substância pelo sêmen ainda era pesquisada, a norma não faz qualquer menção aos cuidados que os homens em tratamento devem ter para não engravidar as parceiras. Conseqüentemente, os termos de Responsabilidade e de Esclarecimento distribuídos pelas secretarias estaduais de Saúde e que têm que ser assinados por médicos e pacientes também não tratam do assunto. ;Isso é um cuidado extremo. A gente aqui não tem esse cuidado com os homens;, afirmou a dermatologista do Hospital Universitário de Brasília (HUB), Elisabeth Pederneiras. Ao lado de outras três profissionais tão surpresas quanto ela, a médica admitiu desconhecer que a bula do medicamento orienta os homens a evitarem que as parceiras engravidem. Segundo Elisabeth, os médicos costumam se limitar a orientar os homens para que não deixem outras pessoas usarem seus comprimidos, principalmente mulheres em idade fértil, proibidas de usar o medicamento, de acordo com a norma. ;Esse remédio é distribuído pelas secretarias de saúde e nós preenchemos os papéis [termos de Responsabilidade e de Esclarecimento] de acordo com as especificações da Anvisa. A bula serve para informar o paciente;, comentou a dermatologista, reconhecendo que o ;assunto é sério;. Além do Termo de Responsabilidade, o médico profissional também deve entregar ao paciente o Termo de Esclarecimento. Elaborados com base no que determina a Portaria nº 354, os dois termos servem para comprovar que o paciente foi informado de que, entre outras coisas, a talidomida ;pode causar o nascimento de crianças sem pernas quando tomada por mulheres grávidas; e que ele poderá ser responsabilizado caso repasse ou deixe alguém mais tomar o remédio que lhe foi prescrito.

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