Brasil

Câmara aprova cotas

Deputados destinam 50% das vagas de universidades e escolas técnicas federais para alunos que cursaram o ensino médio em escolas públicas. Critérios étnico-raciais também contam. Texto segue para o Senado

postado em 21/11/2008 10:44
No que depender dos deputados federais, as cotas em universidades federais vão virar lei. No Dia Nacional da Consciência Negra, a Câmara aprovou um projeto que reserva 50% das vagas nessas instituições e nas federais de ensino técnico a alunos que tenham cursado todo o ensino médio em escolas públicas. Parte das vagas serão destinadas a jovens carentes e autodeclarados negros e indígenas. O texto, que precisa passar pelo Senado, prevê um prazo de quatro anos para que as entidades se adaptem à regra. ;O fato de ter havido um acordo entre os partidos para sua aprovação aumenta sua grandeza;, comemorou o presidente da Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP). O Projeto de Lei 73/99, de Nice Lobão (DEM-MA), foi aprovado na forma do substitutivo do relator, Carlos Abicalil (PT-MT). No texto do deputado, havia apenas menção às etnias, mas os parlamentares incluíram emenda que destinam as vagas também aos estudantes cuja renda familiar per capita é de até um salário mínimo e meio (R$ 622,50). O excesso de emendas e subemendas substitutivas tornou o projeto confuso, a ponto de ser votado no Plenário com um artigo que havia sido suprimido na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Trata-se da proposta do Ministério da Educação de fixar um currículo mínimo para o ensino médio, coisa que, de acordo com a legislação atual, é atribuição dos estados. Ministro da Educação no governo Fernando Henrique Cardoso, o deputado Paulo Renato Souza (PSDB-SP) criticou as modificações no projeto. ;Eu tinha uma proposta muito mais clara, em relação às vagas destinadas à questão social;, diz. Mesmo assim, comemorou o fato de a emenda de sua autoria, que inclui o critério de renda na partilha das vagas, ter sido incluída no texto final. Segundo ele, esse é o fator que efetivamente vai permitir enfrentar as desigualdades na educação. Ainda assim, o critério racial deverá predominar, caso o Senado aprove o mesmo texto. Metade das vagas reservadas aos egressos do ensino público leva em consideração a renda. Dentro desse grupo, será observada a proporção de autodeclarados negros, pardos, índios e brancos no estado onde está localizada a instituição. A outra metade não vai depender da classe social e levará em conta apenas a distribuição étnico-racial (veja quadro). Orgulho Aluna do terceiro ano do ensino médio, Joelma Pereira Silva, 28 anos, decidiu voltar a estudar há dois anos, após seis fora da escola. Com orgulho de ser negra, ela elogiou a proposta aprovada pela Câmara. Para ela, poucas estudantes de escolas pública e negros conseguiriam ingressar em uma universidade pública sem esse tipo de política. ;É muito difícil para a gente, mas agora vamos torcer para as coisas melhorarem;, diz. Para Natália da Silva e Miriam de Araújo, ambas de 18 anos e estudantes do 3º ano da escola Elefante Branco, a medida é muito importante. Natália acredita que o desafio de ingressar em uma universidade pública é visível, principalmente para quem não tem acesso a um ensino de qualidade. ;Estudei a vida toda em uma escola pública e não me sinto preparada para entrar na UnB, por exemplo;, conta. Apesar de saberem que dificilmente serão beneficiadas, já que o projeto precisa passar pelo Senado e ainda há o prazo de adaptação, elas comemoram a medida. ;Eu me sinto injustiçada por não receber um ensino de qualidade. Acesso à boa educação deveria ser para todos;, lamenta Miriam. Embora não tenha se manifestado oficialmente, o Ministério da Educação recebeu bem a notícia da aprovação do projeto. As cotas vinham sendo defendidas pela pasta, que negociou com os deputados Paulo Renato Souza e Henrique Fontana (PT-RS), líder do governo na Câmara, a emenda que incluiu a renda como critério de distribuição das vagas. O presidente da Comissão de Educação da Câmara, João Matos (PMDB-SC), comemorou a postura dos colegas de parlamento. Antes de assumir a presidência da comissão, ele era o relator da proposta. ;Estamos dando a oportunidade de acesso ao ensino superior aos estudantes que eram candidatos à exclusão por falta de uma oportunidade que até então não tinham;, disse. Porém, deixou claro que não basta só oferecer cotas. ;Agora, precisamos assegurar a permanência desses estudantes nas universidades.; Já no Senado, para onde o texto segue agora, o presidente da Comissão de Educação, Cristovam Buarque (PDT-DF), disse que as cotas são uma espécie de ;bolsa-vaga;. ;Isso é apenas dar um jeitinho. Com isso, não estão querendo resolver o problema de fato, que é garantir escolas boas para todos;, diz. ;Cotas não resolvem o problema. Não vai beneficiar os pobres porque eles sequer chegam ao ensino médio;, diz. A aprovação da proposta desagradou à Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes). ;Temos nos posicionado pela inclusão principalmente dos estudantes oriundos das escolas públicas, tanto que a maioria das universidades já adotam programas nesse sentido. Porém, uma lei estabelecendo as cotas confronta com a autonomia da universidade;, sustenta Amaro Lins, reitor da Universidade Federal de Pernambuco e presidente da associação. ENTENDA A PROPOSTA Veja como será a reserva de vagas nas universidades e instituições de ensino técnico de nível médio federais, caso o projeto que segue para análise no Senado seja aprovado: - 50% das vagas oferecidas pelas instituições ficarão reservadas a estudantes que cursaram todo o ensino médio ; 1º, 2º e 3º anos ; em escolas públicas - Esse conjunto de vagas será dividido de acordo com a distribuição étnico-racial. A partir de dados do último censo do IBGE, a instituição deverá observar a proporção de negros, pardos, indígenas e brancos em seu estado e reservar vagas para os alunos de cada raça respeitando esses índices - Além disso, desse conjunto de vagas destinadas a escolas públicas, metade (ou 25% do total) será reservada a estudantes com renda familiar per capita de um salário mínimo e meio. Essas vagas também devem obedecer a distribuição racial de cada estado

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