Brasil

Pacientes do Rio internados compulsoriamente com hanseníase recebem indenização

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postado em 25/01/2009 17:55
Um sorriso largo no rosto marca o início de um novo tempo. Dona Maria*, de 80 anos, vai receber uma indenização de R$ 15 mil, por ter sido isolada contra sua própria vontade para o tratamento de hanseníase. Há 40 anos, foi obrigada a deixar os seis filhos para trás. Neste domingo (25/01), no Dia Mundial de Combate a Hanseníase, soube do resultado de seu processo, contra o governo federal. Segundo estimativas do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), ela é menos uma das cerca de nove mil pessoas na espera do benefício no país, que ainda é o segundo do mundo em número de casos da doença, atrás apenas da Índia. A indenização está prevista em um decreto presidencial, que tem o objetivo de reparar danos aos pacientes confinados pelo governo em hospitais-colônia. O isolamento compulsório foi adotado por vários países. No Brasil, deixou de ser usado há 23 anos, segundo a Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH), mas ainda restam 33 ex-colônias, mantidas parcialmente pelo governo, onde pessoas internadas compulsoriamente, muitas sem ter para onde ir, vivem com as famílias que fizeram ali dentro ou foram morar com os parentes, após o fim do confinamento. Dona Maria vive em uma ex-colônia com filhas e netas. A casa simples fica em uma das vilas do Instituto Estadual de Dermatologia Sanitária (Ieds), conhecido também por Hospital de Curupaiti, em Jacarepaguá, zona oeste do Rio. Ela conta que o começo da internação foi difícil, porque não podia ver os filhos mas que se acostumou com o lugar. Meu filho mais novo tinha seis anos quando entrei aqui. Quando conseguia visitá-lo, com autorização do hospital, uma vez por mês, era um chorôrô para deixá-lo. Foi difícil mesmo, lembra. A senhora diz que hoje construiu uma vida na comunidade e não tem mais vontade deir embora. "A vontade de fugir é de uma outra época". O hospital onde Maria está abriga cerca de 300 pacientes remanescentes e suas famílias, um total de 2,7 mil pessoas. Além de viver no local, muitos trabalham na unidade que, mesmo com inúmeros problemas, como a falta de equipamentos de raio-X e ambulâncias, dá prioridade aos ex-colonos no atendimento. Eles contam com cirurgiões plásticos e fisioterapeutas, além de uma estrutura para tratar novos e antigos pacientes com seqüelas. Apesar de a hanseníase ter cura, o tratamento dura entre seis meses e um ano. O abandono por muito tempo, mesmo dentro do hospital, fez com com que a doença reaparecesse em Curupaiti, de acordo com o coordenador do Morhan, Artur Custódio. Até bem recentemente o Ieds estava completamente abandonado. Uma total negligência, afirmou. A comunidade de dentro do hospital não tinha nem acesso ao tratamento da hanseníase nem ao estado de saúde, em geral. Alguns pacientes também sofrem de hipertensão, câncer e outras enfermidades. Por conta disso, foram identificadas pessoas coma doença ativa, às vezes, em crianças, o que é raro e significa área de alta endemia. Há pouco mais de um ano, uma nova direção assumiu. A médica Ana Claudia Krivochein ainda não consguiu atender a todas reivindicações por falta de recursos,mas começou propondo uma gestão participativa e uma reavaliação de todos os colonos. "Retomamos a assistência, oferecendo um tratamento individualizado. Todos que precisavam de cuidados foram atendidos", informou. A diretora pretende também regularizar a posse da casa onde vivem as famílias e transformar parte da unidade em museu. O local abriga até uma antiga prisão, com celas individuais, usada para punir os que fugiam da ex-colônia ou se envolviam em confusão. O estado doRio de Janeiro ainda mantém parcialmente três ex-colônias. Na última semana, quatro ex-pacientes, que passaram por duas delas, receberam a indenização por internação compulsória. O benefício atende a quem foi internado contra a vontade até 1986, com uma pensão vitalícia de R$ 750 por mês, retroativa a maio de 2007, quando o decreto foi assinado. De acordo com dados do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), cerca de nove mil pessoas esperam o benefício, concedido pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos. O grande problema, segundo elas, é a demora no julgamento dos processos. * O nome foi alterado para preservar a identidade da personagem.

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