postado em 09/03/2009 09:52
Criado em 1993 para auxiliar financeiramente idosos e deficientes incapacitados para o trabalho, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) poderá incluir 1,7 milhão de brasileiros ainda neste semestre. Esse é o número aproximado de maiores de 65 anos e de pessoas com necessidades especiais que, embora pobres, não se encaixam nos critérios de renda definidos pela Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS). Mas um processo que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) deverá culminar na ampliação da cobertura, hoje de 2,9 milhões de beneficiários que recebem um salário mínimo por mês.
Atualmente, para ter direito ao BPC, é preciso que a renda familiar seja inferior a um quarto de salário mínimo per capita, o equivalente a R$ 116,25. Caso o Supremo entenda que esse valor é exageradamente baixo, e portanto restritivo, a tendência é de que seja fixado o patamar de 50% do salário mínimo por pessoa como requisito. Hoje, a conta anual do programa é de R$ 17,6 bilhões. Se o STF definir a mudança de critérios, o valor pode passar de R$ 26 bilhões ; um aumento de pouco mais de R$ 8 bilhões.
;Embora não haja no Brasil um critério oficial de pobreza, os textos internacionais e os próprios programas daqui têm estabelecido a linha em meio salário mínimo;, explica Evilásio Salvador, assessor de política fiscal e orçamentária do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). Segundo ele, o requisito de um quarto de salário mínimo é utilizado para classificar população em situação de miséria. ;Então a pessoa que está um pouco acima dessa pobreza extrema acaba não conseguindo o BPC;, critica Salvador.
É o caso de Maria Gorete do Nascimento, que há quatro anos, desesperada com o corte do benefício, recorreu à Justiça para tentar reaver o direito. Ela recebeu durante oito anos o BPC pelo filho, Diego, 21 anos, que sofre de paralisia cerebral. Quando o marido conseguiu um emprego para ganhar cerca de R$ 750, a família perdeu o auxílio.
;Nossa renda passa de um quarto de salário mínimo por tão pouco! Não é possível que eles pensem que a gente não precisa desse benefício;, lamenta Gorete, que mora com marido e dois filhos no Recanto das Emas. Diego não anda nem fala. Necessita de alimentação especial, porque seu intestino funciona com dificuldade. Toma remédios caros e requer atendimentos especializados, como fisioterapia. ;Eu não posso trabalhar para cuidar dele. Ando de ônibus para cima e para baixo para levá-lo a hospitais. Vou lutando até quando eu puder, esperando a Justiça entender a nossa situação;, afirma a mulher de 46 anos.
Justiça já concede
Sensíveis a casos como esses, a Justiça de 1ª e 2ª instâncias no país tem concedido o benefício mesmo quando a família necessitada ultrapassa o critério de um quarto de salário mínimo per capita. Foi um caso assim, ocorrido em Mato Grosso, que chegou ao Supremo. Devido a consecutivas vitórias judiciais da família, o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) apresentou um recurso extraordinário ao STF. O ministro Marco Aurélio Mello, relator do processo, antecipou ao Correio que discorda do critério rígido de renda. ;Minha visão é de que deixemos em aberto para que os juízes decidam, nos casos concretos, observando as peculiaridades das famílias;, destaca o magistrado.
Marco Aurélio pretende apresentar seu voto e colocar o processo em pauta ainda no primeiro semestre. ;Quero liquidar essa ação, especialmente por ser um tema palpitante, que diz respeito aos menos afortunados;, afirma o ministro. Outro motivo, segundo ele, é que a decisão do STF terá repercussão geral. Ou seja, passará a valer para todos os outros casos. ;Quando são muitas as ações no STF sobre um mesmo tema, o tribunal decide pela repercussão geral;, explica Janaína Penalva, pesquisadora do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (Anis). A entidade foi admitida como amicus curiae (espécie de perito especializado no assunto) pelo STF.
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