postado em 07/05/2009 09:44
Minas Gerais faz um pacto inédito pela conservação e proteção do seu patrimônio religioso. Uma força-tarefa, formada por vários órgãos responsáveis pela preservação da cultura mineira, vai coordenar a implantação de um projeto de segurança nas igrejas, com o objetivo de evitar a degradação das construções e os furtos e roubos de imagens e objetos sacros.
A iniciativa será testada em quatro igrejas, todas incluídas no livro do tombo: Capela Nossa Senhora do Rosário, em Santa Rita Durão, distrito de Mariana, na Região Central; Capela Nossa Senhora do Rosário de Quinta do Sumidouro, em Fidalgo, vilarejo de Pedro Leopoldo, na Região Metropolitana de Belo Horizonte; Santuário Bom Jesus do Matozinhos, em Piranga, na Zona da Mata; e Capela de Nossa Senhora da Lapa, em Ravena, distrito de Sabará, também na Grande BH. Entre os critérios adotados na seleção estão as condições das construções, como a de Ravena, em processo de ruína, e o histórico de desaparecimento de peças.
O modelo foi inspirado no projeto Igreja segura, igreja aberta, criado pelo Instituto de Polícia Judiciária e Ciências Criminais de Portugal. No país europeu, a situação é parecida com a de Minas: um grande acervo de imagens e objetos sacros e muitos casos de furtos, o que levou ao fechamento de templos.
A proposta está sendo debatida pela Promotoria Estadual de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico de Minas Gerais e representantes das arquidioceses de Mariana e de Belo Horizonte, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha), do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (Crea), das secretarias estaduais de Cultura e de Defesa Social e do Corpo de Bombeiros.
De acordo com o coordenador da Promotoria de Defesa do Patrimônio, Marcos Paulo de Souza Miranda, a interação entre os grupos é fundamental: ;É uma engrenagem cuja participação de todos é decisiva para o funcionamento do sistema. E o estado não pode assumir sozinho. É preciso a integração entre poder público, igrejas e sociedade;, diz. Ele destacou a necessidade de a Igreja assumir seu papel de corresponsável pela proteção do patrimônio cultural sob sua guarda, adotando uma posição mais ativa.
O próximo passo do trabalho é o diagnóstico detalhado da situação das igrejas escolhidas. Nele, constará informações sobre a estrutura das construções e equipamentos. A partir desse estudo, será traçado um cronograma de ações. O promotor pedirá, ainda nesta semana, o diagnóstico aos técnicos do Ministério Público e aos bombeiros. O documento deve ser concluído em 30 dias.
Além do sistema de segurança (câmeras e alarmes), serão instalados nas igrejas aparelhos de combate e prevenção a incêndio (os bombeiros ensinarão a comunidade a usá-los) e feito o inventário com fotos e informações das dimensões de todas as peças para facilitar a recuperação e a identificação da origem em caso de furto.
Marcos Paulo de Souza acredita nos primeiros resultados ; instalação de equipamentos e sensibilização e mobilização dos moradores ; em até um ano e meio. ;O programa não resolve o problema dos bens. Pretendemos mostrar o caminho e ressaltar que, quando os atores estão comprometidos, há solução. Queremos ainda criar rotinas de trabalho que sirvam de exemplo a outras comunidades que passam por situação semelhante;, afirma.
Os dados do MP mostram um número preocupante: Minas já perdeu 60% de seu patrimônio sacro. Atualmente, 666 peças estão desaparecidas e, dessas, há fotos de aproximadamente 300, o que diminui as chances de recuperação.
A gerente de Ação Preventiva do Iepha, Alessandra Deotti, está otimista com a parceria. ;Um órgão sozinho não resolve tudo. É preciso uma soma de esforços para melhorar o quadro. Historicamente, o Iepha e o Iphan sempre investiram na preservação, enquanto as igrejas e as comunidades ficavam à margem dos trabalhos;, relata.
O arquiteto Rafael Arrelaro, do Iphan, acredita que, a médio prazo, a medida poderá ser estendida a outros estados: ;A partir dos resultados obtidos será possível observar o que deve ser revisto e aprimorado e, provavelmente, eles serão foco de uma discussão nacional. Novas ações e um trabalho preventivo são muito importantes. Qualquer intervenção no bem se reflete na integridade dele. Por outro lado, é preciso cuidar do patrimônio das igrejas e correr atrás do que foi desviado;, afirma.
O assessor jurídico da Arquidiocese de Mariana, Geraldo Alex Miranda Bailão, diz que a Cúria tem se empenhado na preservação dos bens, com restaurações, reformas e instalação de aparelhos de combate a incêndio. ;Praticamente, todas as nossas igrejas têm proteção e sistema de alarme, dentro das possibilidade financeiras da comunidade. É preciso criar um diálogo com a participação de todas as entidades, porque patrimônio é de todo mundo quando está bem e é bastante visitado, mas do contrário, apenas a Arquidiocese é dona;, diz.
Ele ressalta que a Cúria da cidade histórica tem 70% dos bens tombados em Minas e cobra parcerias e recursos, inclusive do poder público municipal. O advogado aposta nos resultados positivos do programa: ;Dará bons frutos porque não depende de grandes aportes financeiros, mas da sensibilização de quem vive no entorno e de quem cuida das igrejas. O envolvimento da comunidade é o centro do projeto, que deve reconhecer o bem como dela.;