Rodrigo Couto
postado em 15/07/2009 09:50
Prestes a ser aprovada pelo Senado, a nova Lei Nacional de Adoção, que tramita desde 2003 no Congresso Nacional, incentiva a prática no país e traz importantes avanços, como o amparo das adolescentes grávidas, a obrigatoriedade de o juiz justificar a permanência das crianças e adolescentes nos abrigos, a instituição de um prazo de até dois anos para a destituição familiar, regras mais rígidas para a aceitação legal como filho a estrangeiros, além de propiciar ao adotado o direito de opinar (leia quadro). A proposta também determina a preparação prévia dos postulantes à adoção e dos meninos e meninas a serem inseridos em novas famílias. Consultados pelo Correio, especialistas aprovam a legislação a ser implantada e esperam que as regras sejam cumpridas, apesar da falta de assistentes sociais e psicólogos em grande parte do território nacional.
Com a nova lei, o Cadastro Nacional de Adoção (CNA), criado em 2008, será fortalecido e integrado com as listas estaduais. Hoje, 22,5 mil postulantes e 3,4 mil crianças e adolescentes estão inscritos e aptos a participarem do processo. ;É muito importante a aprovação desta legislação, sobretudo no item em que oferece suporte às mães adolescentes, evitando que elas abandonem seus filhos em locais públicos;, afirma Francisco Neto, vice-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e integrante do comitê gestor do CNA.
Relator do projeto no Senado, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) apresentou parecer favorável, com adequações. ;Suprimi do texto original a pena de dois a quatro anos às pessoas que participam de adoção direta e não comunicam à Justiça. Agora, elas terão até 30 dias para informarem o procedimento às autoridades;, diz o parlamentar, lembrando que essa prática é responsável por pelo menos 80% das adoções em todo o país. Pai de uma filha adotiva, Mercadante afirma que a essência do projeto é priorizar a família no sentido externo, com a tentativa de manter as crianças no convívio familiar.
Aproximadamente 80 mil crianças e adolescentes vivem em abrigos federais no Brasil, sendo que 85% deles têm vínculos com a família, segundo levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). ;Isso é um fator que atrapalha a adoção. Não podemos privilegiar o vínculo biológico em detrimento do laço emocional;, pondera Bárbara Toledo, presidente da Associação Nacional dos Grupos de Apoio à Adoção (Angaad).
A preferência dos pais adotivos são por crianças do sexo feminino, brancas e com até dois anos de idade. A proposição, segundo Mercadante, visa dialogar com os postulantes que a questão física não é preponderante. ;A intenção não é obrigar os novos pais a acolherem uma criança ou adolescente, mas colocar em debate outras questões importantes, além da aparência.; O projeto pode ser aprovado hoje pelo plenário do Senado. ;Há um entendimento do governo para que a proposta seja aprovada. O próprio presidente Lula, que é pai adotivo, também é sensível à causa;, completa.
Vida espelhada
Maria da Glória de Lima, 64 anos, se espelhou na própria história para ajudar crianças e adolescentes de Taguatinga Norte. Pernambucana de Buíque e criada em Juazeiro (CE), Glorinha, como também é conhecida, perdeu a mãe aos dois anos. Adotada por um casal de idosos, Maria da Glória, ficou órfã pela segunda vez. Seu pai adotivo era herdeiro do famoso padre Cícero. Com os bens e relíquias religiosas, inclusive o oratório, inaugurou em 1988 o Lar da Criança Padre Cícero, entidade que abriga atualmente 40 crianças. Desde a fundação, mais de 2 mil já passaram pelo local. Com a venda de roupas e joias e doações, além da colaboração dos amigos, ela mantém o lar que é a única casa para muitas garotas e garotos. ;Aqui, eles recebem muito amor e carinho, mas nada substitui o convívio de uma família própria.;
Com apenas seis anos de idade, a pequena Maria* fala com desenvoltura de seus problemas. ;Só estou aqui porque minha mãe não podia ficar comigo, pois ficava pedindo dinheiro. Não quero ser adotada, quero voltar para minha casa.;
Nome fictício para preservar a identidade da entrevistada
Há um entendimento do governo para que a proposta seja aprovada. O próprio presidente Lula, que é pai adotivo, também é sensível à causa
<-- Senador Aloizio Mercadante, relator do projeto no Senado
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--> Palavra de especialista Riscos que enfrentamos <--
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--> <-- --> A busca pelo melhor interesse da criança/adolescente representa um aspecto fundamental da história moral da humanidade e o detalhamento de direitos contribui para transformar princípios éticos em realidade. Mas além do permanente desenvolvimento do sistema de direitos da infância da juventude é necessário enfrentar três riscos: 1) Não confundir reconhecimento de direitos com sua mera declaração verbal. A aprovação de leis representa apenas o primeiro passo. A lei possui uma importância simbólica fundamental, mas o verdadeiro reconhecimento de direitos requer implementação na prática. 2) A implementação das leis requer cuidados, planejamento e supervisão das práticas institucionais daqueles a quem a tarefa de operacionalizar os direitos das crianças é confiada. 3) A efetiva garantia dos direitos depende das condições dos serviços que as executam. <--
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--> <-- --> Ivânia Ghesti, doutora pela UnB, especialista em Justiça da Infância e da Juventude pela Universidade de Gênova <--
--> Os avanços da lei <--
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--> <-- --> Apresentado em 2004 pela senadora Patrícia Saboya (PDT-CE), o projeto de lei do Senado 314, que já tramitou na Câmara dos Deputados, onde recebeu substitutivo, apresenta alguns avanços. Veja abaixo os mais importantes: