Brasil

Pesquisadora: usuários de crack usam estratégias contra exclusão social

postado em 22/07/2009 15:54
Alguns usuários de crack desenvolveram estratégias para lidar com o vício e, ao mesmo tempo, não ficar excluídos em guetos como a Cracolândia, em São Paulo, apontam as pesquisas da psicofarmacóloga da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Solange Nappo, que estuda a droga desde 1992. A pesquisadora acredita que as associações do crack com outras drogas lícitas e ilícitas feitas por essas pessoas amenizam os principais efeitos colaterais: a psicose e a fissura ( desejo compulsivo de consumir a substância). [SAIBAMAIS]"Quando o crack surgiu, eles não misturavam com nada para não perder o efeito. Hoje em dia, eles abrem mão de parte desse efeito prazeroso para não sentir o outro efeito que é tão lastimável", disse Solange. Apesar dos efeitos ainda incertos sobre a saúde com a mistura de outros elementos ao crack, essas pessoas conseguem trabalhar e conviver com a família, afirma a pesquisadora. "Alguns têm obtido sucesso, não se sabe a que preço. Mas têm obtido sucesso porque estão vivos e inseridos na sociedade". De acordo com a pesquisadora, essas estratégias podem ser estudadas para que seja desenvolvido um modelo de redução de danos. Ela explicou que o combate as drogas ocorre em três etapas: prevenção, o tratamento e redução de danos para os dependentes em estágio avançado. "Ele (o viciado em estágio avançado) vai usar (a droga) de qualquer forma. Então, vamos tentar reduzir os danos desse uso para que ele não seja banido da sociedade, para que não se exponha a riscos e não morra%u201D, assinalou Solange. A abordagem da redução de danos pode, segundo a pesquisadora, incentivar o usuário a abandonar a droga aos poucos. Na Cracolândia, a Organização Não Governamental (ONG) É de Lei realiza um trabalho para evitar a transmissão de doenças como HIV e hepatite por meio do uso de crack. O cachimbo de madeira foi o primeiro insumo distribuído para usuários de crack com o objetivo de incentivar o não compartilhamento do instrumento. Normalmente, os viciados constroem modelos artesanais de metal, que queimam a boca, causando feridas, e podem transmitir doenças quando compartilhado com outras pessoas. "O cachimbo serviu como um cartão de visitas", disse o coordenador do projeto de redução da ONG É de Lei, Thiago Calil, sobre o início da sua atuação na Cracolândia. Segundo Calil, a redução de danos é uma proposta de "fomentar o autocuidado" entre os usuários de droga, sem tentar necessariamente impedir o uso da substância. "Se você usa crack, é bom saber que é uma prática que pode deixá-lo vulnerável e que é importante você aprender a se cuidar", diz o panfleto distribuído nas ruas do centro de São Paulo pela ONG. Calil destacou que essa linha de atuação é reconhecida internacionalmente e também pelo Ministério da Saúde. A redução de danos, enfatizou, é uma estratégia mal compreendida e pouco aceita por muitos setores da sociedade. Ele lembrou que foi diversas vezes abordado e até revistado por policiais enquanto realizava o trabalho nas ruas do centro. Por causa das reclamações dos próprios usuários, ONG parou de distribuir os cachimbos de madeira. Eles se queixavam que a madeira dificultava a rapagem da "borra", resíduo da droga que fica nas paredes do cachimbo. Atualmente são fornecidas piteiras de silicone, panfletos e protetor labial a base de manteiga de cacau. A ONG É de Lei também costuma ouvir os usuários para definir a sua atução. Os panfletos e o restante do material distribuído pelo ONG, por exemplo, foram elaborados com base em sugestões dos dependentes de crack.

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