postado em 09/08/2009 09:38
Duas linhas de produção. Uma era regular e tinha autorização de funcionamento. A outra atuava na clandestinidade. A estratégia, usada no passado, ajudava a mascarar os negócios da família e garantir a distância dos fiscais da vigilância sanitária. A suspeita é que o mesmo esteja acontecendo novamente.
[SAIBAMAIS]A Equimed só obteve autorização para funcionamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em dezembro de 2000, enquanto a Titanium e a Techymed conseguiram em 2005. Antes disso, eram clandestinas, apesar de comercializarem centenas de produtos para hospitais de todo o país. ;A intenção não poderia ser outra: obtenção do lucro fácil à custa de pacientes desinformados e desprotegidos, alheios ao processo de compra e venda de produtos de saúde que neles seriam implantados;, aponta denúncia do Ministério Público Estadual. A Titanium e a Techymed funcionavam como distribuidoras, para que o grupo pudesse comercializar os produtos sem registro e produzidos pela Equimed.
Os empresários queriam afastar a possibilidade de a principal empresa ser interditada ou punida. O raciocínio foi o mesmo na hora em que Alberto Fernandes Silva destacou laranjas - a mulher e o cunhado - no quadro social das duas empresas sem registro.
Alberto é considerado por pessoas próximas um homem esperto e com uma lábia capaz de convencer qualquer pessoa ;a comprar uma geladeira no Polo Norte.; Começou como propagandista de remédios e prosperou rápido. Em menos de uma década, se transformou em um poderoso e milionário empresário. Ostenta alguns luxos, como carros e barcos. Os três filhos, que desde o início acompanharam os negócios do pai na área médica, alegaram que não participavam das decisões da empresa. Deives, Douglas e Diego tinham a tarefa de gerenciar legal e comercialmente as empresas.
Entretanto, o esquema não prosperaria sem a conivência de médicos: 134 profissionais foram denunciados no Rio Grande do Sul. Alberto sabia como agradá-los. Fazia churrascos, pagava viagens, entre outros mimos. Na lista de empresas da família, consta também uma agência de turismo.
O elo entre os negócios e o mundo dos hospitais coube ao médico Ernani Abreu Vianna. Sócio da Equimed e da Titanium, ele ajudou a incluir os produtos das empresas na lista de compras dos principais hospitais do estado e era responsável pelo ;lobby; com os colegas. Ressaltava a qualidade e a eficiência das próteses, além dos lucros que poderiam ser obtidos.
Frequentador das altas rodas da sociedade gaúcha, o médico mora em apartamento de luxo no bairro Moinho de Ventos. Hoje tem em seu nome a Abreu e Simões Médicos Associados e a Fisioforma Clínica Fisioterápica. A mulher dele figura como dona desta última, além da Andraz Serviços e Alimentação e a Emporio Carlos Gomes Serviços e Alimentação.
Metalose
A estratégia desenvolvida pelo grupo de Alberto de criar duas linhas de produção em muito se assemelha à investigada pela Polícia Federal na Operação Metalose, em julho de 2007, voltada para identificar fraudes na produção de próteses ortopédicas. Cinco pessoas acabaram presas sob a acusação de envolvimento no esquema. Foram cumpridos na época mandados de busca e apreensão em 12 cidades de São Paulo, Paraná, Pernambuco e Maranhão.
A repercussão do caso teve como consequência a decretação de segredo de Justiça. Advogados de grandes empresários, entre eles Ruy Salvari Baumer, com assento na poderosa Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), requereram a medida e foram atendidos pelo Judiciário. Devido à extensão da rede de envolvidos com a fraude da prótese, a PF adotou também um procedimento que tornou mais difícil o acompanhamento do escândalo.
As investigações, antes concentradas em Marília (SP), com o delegado José Navas Jr., foram fracionadas. Ou seja, ficou a cargo das superintendências estaduais da PF a conclusão dos inquéritos referentes aos suspeitos que moravam fora de São Paulo. Além disso, em alguns casos, o Judiciário entendeu também que a competência era da Justiça estadual e os casos foram repassados às promotorias locais. Uma dispersão que praticamente inviabiliza o acompanhamento dos processos desencadeados a partir da Metalose, e que também beneficia os suspeitos, em razão da burocracia na remessa dos autos.
Defesa
Em resposta, por e-mail, ao Correio, Diego Schmitz informou que as empresas EBS (antiga Equimed), Titanium e Equimed ingressaram com uma ação judicial. A sentença ainda não foi dada. A nota diz ainda que a matéria-prima utilizada era compatível com uso humano e importada dos EUA e que a fábrica possuía registros de vários itens. As ações das vítimas estão sendo contestadas caso a caso, na medida, segundo a nota, em que fatores deixaram de ser considerados.
O Correio deixou recados no consultório do médico Ernani Abreu, que não retornou as ligações. A empresa VC Medical não foi localizada no endereço que constava na Asa Norte e nenhum dos dois empresários de Brasília foi localizado para comentar a relação com as empresas denunciadas pelo MPE.