Brasil

Produtos que não têm eficácia comprovada são vendidos sem controle no país

Rodrigo Couto
postado em 03/09/2009 08:15
Com a promessa de resultados em tempo recorde, muitos produtos relacionados à estética ou que têm apelo sexual são anunciados como se fossem milagrosos. Esses itens, dos mais variados, são encontrados em anúncios de revistas, programas de televisão, panfletos e em e-mails, na forma de spams(1), entupindo caixas de correio eletrônico de milhares de brasileiros todos os dias. Das fórmulas que prometem emagrecimento rápido e a extinção de celulites aos instrumentos e técnicas que garantem melhor eficiência sexual e o aumento do órgão reprodutor masculino, esses produtos têm algo em comum: são vendidos sem o menor controle no país, não há comprovação científica de sua eficácia e podem representar perigo para quem os compra. Nem por isso deixam de atrair a atenção dos consumidores. O desejo de ser magra e ter um corpo perfeito fez Viviane (nome fictício a pedido da entrevistada) comprar inúmeros produtos e substâncias para melhorar sua aparência física desde a infância. A moradora da Asa Norte de 36 anos admite que adquiriu o primeiro item do gênero aos 9. "Na época, comprei uma cinta elétrica que prometia queimar as gorduras localizadas na barriga. Meu corpo ficava todo marcado e ainda tinha que passar uma lama que vinha de Araxá (MG). Era engraçado, pois ficava toda suja, mas resultado que é bom, nada", lembra. Ela só aposentou a cinta depois que uma amiga, filha de um médico, disse que o aparelho fazia mal ao fígado. Viviane comprou outros produtos, como um macacão de plástico para emagrecer e um aparelho para tonificar os músculos. Mas nunca obteve os resultados desejados. "Na propaganda, esse aparelho para fortalecer a musculatura era vendido como se fosse um instrumento utilizado por astronautas. Um dia, as correntes se soltaram e machuquei meu rosto", conta. A educadora física e professora de fisiologia do exercício da Universidade de Brasília (UnB) Keila Fontana diz não conhecer trabalhos científicos que comprovem o efeito de equipamentos que prometem eliminar gorduras localizadas. "É complexo definir se funcionam ou não, pois alguns associam o resultado à prática de exercícios físicos, ou seja, a mudança do corpo pode vir da prática física, e não em função do aparelho. Em outros casos, pode ser um efeito placebo. De tanto acreditar que funciona, acaba dando certo e a pessoa perde peso mesmo", afirma. "Os sedentários, que nunca praticaram esportes, até podem sentir algum efeito. Mas não existem pesquisas sobre esses instrumentos", alerta. Especialistas também advertem para o uso de substâncias que prometem acabar com as celulites. O fisiologista da UnB Guilherme Molina diz que não existe princípio ativo milagroso para combater essas gorduras. "A melhor maneira de evitar as ondulações na pele continuam sendo uma boa dieta - composta de 60% de carboidratos, entre 20% e 30% de proteínas, e o restante de gorduras, segundo a Organização Mundial da Saúde -, associada à prática de exercícios físicos", ensina. "Alguns produtos podem até apresentar resultados, mas enquanto não houver comprovação científica, não há como garantir sua eficiência", salienta. Sedução Outros produtos que não têm comprovação de sua eficácia, mas ainda assim são facilmente encontrados no mercado, são os perfumes que levam feromônios(2) na composição. Diversas marcas anunciam que os produtos podem seduzir o sexo oposto, embora especialistas duvidem da promessa. Verônica Kato, perfumista da Natura, maior empresa de cosméticos do país, garante que, em mais de 20 anos trabalhando no ramo, nunca teve notícias da inserção de feromônios em perfumes. "Troco informações com perfumarias do mundo inteiro e não existe nenhuma comprovação sobre isso", observa. Verônica explica que o odor, depois de ser registrado pelas células receptoras das narinas, segue até o cérebro, onde é processado. "É no sistema límbico que o cheiro é identificado. Quando sentimos um cheiro, o associamos a algum fato presente em nossa memória", diz. A reportagem entrou em contato com a Erótika Toys, fabricante e distribuidora da marca Feitiço. Um dos gerentes da empresa, que preferiu não se identificar, garantiu a qualidade do produto, mas não entrou em detalhes sobre como a substância age. » Dores e deformidades As mulheres costumam ser seduzidas por produtos que prometem a perda de peso e a eliminação da celulite. Já os homens buscam itens para aumentar o tamanho do pênis. Muitas vezes, acabam caindo em armadilhas. É o caso do desempregado Francisco Chagas Gomes, 28 anos, que diz ter usado uma bomba para aumentar o órgão sexual em até 5cm. "Usei o aparelho por oitos meses e não senti resultado algum. Não aumentou meu pênis nem um milímetro", lamenta, acrescentando que pagou pouco mais de R$ 100 pelo item. Apesar da experiência frustrante, ele afirma que um colega obteve sucesso. "Ele garantiu que o pênis cresceu mesmo." Uma funcionária de sex shop que pediu para não ser identificada conta que vende, em média, 15 bombas do tipo por dia. Questionada sobre o eficácia do produto, a vendedora diz que o resultado depende do organismo de cada um e que o principal objetivo da bomba é curar a ejaculação precoce. O modelo simples é vendido por R$ 65, enquanto o mais sofisticado não sai por menos de R$ 130. Archimedes Nardozza, chefe do Departamento de Andrologia da Sociedade Brasileira de Urologia, vê com preocupação a comercialização desses produtos. "Temos uma diretriz técnica sobre o assunto e já advertimos a Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina para encontrar formas de coibir a venda das bombas", diz. De acordo com o médico, não existe qualquer comprovação de que esses instrumentos aumentem o tamanho do pênis. "Já chegamos a comprar alguns e testar com voluntários, mas não se chegou a nenhuma conclusão positiva. Pelo contrário, esses aparelhos podem causar dores e até deformidades", alerta. Fiscalização A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) afirmou, em nota, possuir uma área para monitorar a propaganda que acompanha a publicidade dos produto sujeitos a inspeção da vigilância sanitária. "O foco do trabalho é verificar a adequação das propagandas de medicamentos, que devem atender as normas sanitárias, e coibir a divulgação de produtos não autorizados. Para realizar esse trabalho, a área de monitoramento conta com parcerias de universidades", diz o texto. Já o Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro) informa que não regulamenta equipamentos que prometem a queima de gordura e aumento do pênis. (RC) » Áudio: entrevista com Archimedes Nardozza, chefe do departamento de andrologia da Sociedade Brasileira de Urologia

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