A dois meses da Conferência das Partes da Convenção do Clima (COP 15) na Dinamarca, organizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil corre o risco de chegar ao encontro sem propostas concretas. Parte do gargalo está concentrado no Congresso (1), onde se encontra, desde o ano passado, o projeto do Executivo para o Plano Nacional de Mudanças Climáticas, com o objetivo de regulamentar medidas que o país quer colocar em prática (ver quadro).
Apesar da ameaça, os parlamentares acusam o próprio governo pela falta de articulação para apreciação do tema em tempo hábil. ;Temos dois desafios a superar, que são a falta de tempo e a concorrência de outras matérias de interesse da base governista, como o projeto do pré-sal, por exemplo;, afirma o deputado Rodrigo Loures (PMDB;PR). ;Chega a ser uma ironia do destino disputar justamente com o petróleo, que é um combustível fóssil e poluente;, ressalta o parlamentar. Ele também questionou o conteúdo da proposta brasileira para uma boa discussão na Dinamarca. ;É um projeto bem intencionado, mas vago, superficial e sem compromisso com algumas metas. Em alguns pontos, apenas menciona que vai adotar medidas para a redução do desmatamento, mas não especifica como isso será custeado, qual a área medida e em que circunstâncias;, completa.
Polêmica
O texto foi encaminhado, no ano passado, pelo Executivo e ainda aguarda a instalação de uma comissão especial para ser apreciado na Câmara. Na avaliação do líder do PV na Câmara, deputado Sarney Filho (MA), o assunto é polêmico e não tem consenso nem entre a base aliada do governo. ;Não há acordo porque são temas que envolvem o uso do solo, a pecuária e o desmatamento. E, sobre esses assuntos, o governo não sabe nem o que quer, porque fica entre tentar agradar à comunidade internacional e, por outro lado, relaxar as exigências do código florestal aos ruralistas, o que é um absurdo.;
Segundo Sarney Filho, o governo também está muito comprometido com alguns parcerios internacionais, como Índia e China, e evita criar uma saia-justa ao assumir uma meta objetiva de redução de emissões de gases poluentes. Além do Plano Nacional de Mudanças Climáticas, o governo quer ver aprovada uma lei que cria pelo menos mil cargos para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e para o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) atuarem no monitoramento, controle e recuperação de áreas degradadas.
1 - Reunião técnica
Fora do Congresso, o governo está se desdobrando para fechar uma proposta mais detalhada até o fim deste mês. A última reunião técnica entre membros do Ministério do Meio Ambiente e do Ministério da Ciência e Tecnologia ocorre ainda esta semana, antes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva bater o martelo para a proposta oficial. A promessa da equipe de Lula é que haja acordo entre os pontos polêmicos até o fim de outubro.
Confira entrevistas:
Deputado Rodrigo Loures (PMDB-PR):
Líder do PV na Câmara, deputado Sarney Filho:
Gerente-geral do Ícone, Rodrigo Lima:
Desafio ambiental
O governo promete:
- Reduzir em 80% o desmatamento da Amazônia até 2020;
- Distribuir benefícios e recursos dos mecanismos de REDD (Redução de Emissões para o Desmatamento e Degradação (REDD) entre os estados da Região Amazônica responsáveis pela recuperação e proteção da floresta;
- Manter as taxas de emissão de poluentes iguais às de 2005, equivalente a 2,1 bilhões de toneladas.
O que falta para a promessa se concretizar:
- Aprovar o Plano Nacional de Mudanças Climáticas no Congresso;
- Criar mil cargos para o Ibama e para o Instituto Chico Mendes; Atuar com mais independência financeira em relação aos países desenvolvidos;
- Apresentar uma política objetiva para garantir ajuda internacional.
Difícil vai ser conseguir recursos
A postura do governo brasileiro em torno da questão ambiental e da falta de propostas concretas para serem apresentadas na Dinamarca em dezembro também desagrada aos especialistas. O gerente-geral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Ícone), Rodrigo Lima, foi categórico ao defender uma posição mais racional no que diz respeito à captação de recursos para viabilizar o plano brasileiro de enfrentamento às mudanças climáticas. ;Temos ideias em reduzir o desmatamento e outras ações para fazer cumprir essa regra, mas de onde vai sair o dinheiro? Estamos muito focados na contribuição internacional, mas sem uma política de verdade não veremos a cor do dinheiro;, prevê.
Lima esteve no encontro preparatório para a convenção de Copenhague, realizado em setembro, em Bangcoc, que mostrou evidências ; segundo ele ; da indisposição dos países desenvolvidos em financiar projetos ambientais de economias em desenvolvimento sem uma política estruturada para o setor.
Emissões
Outra preocupação é quanto ao número divulgado amplamente pelo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, para a redução de emissões de poluentes em até 40% até 2020. Os dados ; produzidos pelo Ministério da Ciência e Tecnologia ; não passam de uma estimativa, pois a última atualização do inventário de emissão de gases consta de 1994. ;Está mais que na hora de o presidente Lula bater na mesa e exigir algo concreto para que se tenha uma base mais oficial do que o Brasil pode fazer ou não;, afirma Lima.
Assim como Rodrigo Lima, Marco Fujihara, coordenador do Grupo de Mudanças Climáticas da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) também aposta em uma ;independêcia financeira; do Brasil para conseguir atingir os índices de desmatamento desejados até 2020. ;Teremos uma discussão inócua em dezembro se o Brasil não fizer um esforço drástico com as próprias pernas para reduzir o desmatamento, nossa maior causa da emissão de poluentes.;
COMISSÃO APROVA 36 REQUERIMENTOS
Deputados ruralistas e ambientalistas que compõem a Comissão Especial de Meio Ambiente da Câmara aprovaram ontem os 36 requerimentos dos parlamentares apresentando sugestões de nomes de participantes para audiências públicas futuras e os locais a serem realizadas essas reuniões. Os requerimentos acatados ontem serão a base para o desenvolvimento dos trabalhos. A comissão, criada pelo presidente da Casa, Michel Temer (PMDB-SP), tem como objetivo debater as ;dezenas; de projetos que envolvem o Código Florestal. A partir de 11 de dezembro, os produtores que estiverem em desconformidade com a legislação vigente serão passíveis de punição.