Brasil

Sete dias de violência provocam reflexões entre conhecedores e estudiosos das favelas cariocas

postado em 22/10/2009 12:08
Na véspera de completar uma semana sem trégua, a violência nas favelas cariocas, sobretudo na zona norte da cidade, provoca reflexões variadas entre acadêmicos dedicados ao tema e pessoas diretamente ligadas à parcela mais pobre da sociedade local, espremida entre traficantes de drogas em guerra e a ação policial nos morros e no asfalto.

;Há uma grande bomba atômica no Rio de Janeiro que tentam esconder, mas que dá sinais de que está pronta para explodir, como agora;, garante sem meias palavras a radialista Verônica Costa, três vezes vereadora eleita por jovens da periferia.

;Você vê meninas de 13 anos ; uns bebês ; grávidas, com outros bebês na barriga, vê garotos de 15 anos que dizem abertamente ;morrer, para mim, é lucro;. Não têm autoestima, nenhuma perspectiva de futuro, e ninguém faz nada, nem escola, nem governo, ninguém está preocupado com eles;, queixa-se.

Baseado no mesmo estrato social que a ex-vereadora, mas com objetivos diferentes, MC Leonardo, presidente da Associação dos Profissionais e Amigos do Funk, aponta uma solução tão simples quanto polêmica:

[SAIBAMAIS];Tem que legalizar as drogas. O que você não consegue conter tem que regulamentar. É como o aborto, não adianta proibir. Se liberar as drogas, daqui a 50 anos meus netos vão dizer ;cara, naquele tempo tinha fuzil na favela, tinha criança armada;. O problema é que a legalização vai contra interesses mais fortes, o comércio de armas;, analisa.

Ao mesmo tempo em que se confessa abismado, MC Leonardo atribui o cenário dos últimos dias ao que considera erro estratégico ;de tanta política de ;caveirão; e de blindado subindo as favelas;.

;A polícia deixa um rastro de insegurança e de prejuízo na comunidade, comércio fechado, escolas sem aulas, população com medo;, resume. ;E pior é que esta não é uma situação do Rio de Janeiro, é nacional, é internacional. Os maiores consumidores de drogas são os Estados Unidos, que são contra a legalização porque interessa alimentar a guerra do tráfico, as armas de um lado e de outro;.

Verônica Costa concorda e joga mais lenha na fogueira da discussão: ;Eu acho isso tudo um escândalo internacional. Há pouco tempo um atirador de elite da polícia acertou a cabeça de um sequestrador ali mesmo em Vila Isabel e a população aplaudiu. Agora derrubaram um helicóptero e a polícia promete vingança. E no meio dessa escalada, as pessoas estão preocupadas com Copa do Mundo e Olimpíadas no Rio;.

Coordenador do Programa de Controle de Armas da organização não governamental Viva Rio, o sociólogo Rangel Bandeira, considera imprescindível rever o modelo do combate à violência, a partir das Forças Armadas e das polícias, ;dois setores da sociedade que não foram democratizados depois da ditadura;.

;O que está por trás desta crise que já dura 25 anos é a escalada armamentista, resultado da facilidade com que as armas pesadas chegam ao narcotráfico. A Baía de Guanabara é um shopping noturno, lanchas levam todo tipo de contrabando para as favelas. Onde está a Polícia Federal? Não trabalha à noite. E a Capitania dos Portos da Marinha? Jogando vôlei;.

Rangel lembra que em 2005 a CPI das Armas da Câmara dos Deputados apurou que 68% das armas pesadas apreendidas com bandidos tinham origem em oito lojas, mas nada foi feito. ;O responsável pelo comércio de armas no país é o Departamento de Fiscalização de Produtos Controlados, do Exército, que não fiscaliza nada porque não tem condições, mas não deixa ninguém fiscalizar. Por que?;.

Em depoimento à CPI, em 2005, um traficante de drogas preso admitiu que as armas estrangeiras ;passeiam tranquilamente pelas estradas;, segundo o sociólogo. ;Não tem polícia nem federal, nem rodoviária, nem Forças Armadas, nada. O que vemos é a compra de mais armamento e munição pelas polícias, mais desvio para os bandidos, mais corrupção. Enfim, mais do mesmo. E assim não se chegará a nenhuma solução;.

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