Brasil

Guerra ao crack mobiliza prefeitura, ONGs e líderes comunitários no Rio

postado em 01/11/2009 13:15
Rio de Janeiro - Um plano de ação para o combate ao uso de crack e à exploração sexual de crianças e adolescentes está sendo preparado pela Prefeitura do Rio de Janeiro e será divulgado na próxima terça-feira. [SAIBAMAIS]Para discutir e definir as ações do plano, a Secretaria municipal de Assistência Social coordenou o 1º Fórum Municipal de Enfrentamento ao Uso Abusivo de Crack e de Outras Substâncias Psicoativas, que contou com a participação de representantes do governo e da sociedade civil. O subsecretário de Proteção Especial da Secretaria de Assistência Social, Carlos Augusto de Araújo Jorge, que acompanhou os debates ocorridos durante o fórum, destacou a importância das discussões. "Pela primeira vez estamos abordando a cultura de lidar com o problema. Não é a assistência social, nem a polícia, nem os médicos tratando isoladamente da questão, mas sim todos em discussão também com os representantes das comunidades mais carentes", disse. Nos últimos dois meses, como preparação para o fórum, foram promovidas várias reuniões nas comunidades; em seguida, houve novas reuniões nas sedes das dez áreas em que a secretaria dividiu a cidade e, finalmente, chegou-se ao fórum onde as conclusões de cada etapa foram expostas e debatidas. "O uso de crack está associado à exploração sexual de crianças de muitas maneiras, algumas assustadoras", disse Carlos Augusto. "Já vimos o caso de um menino de 9 anos prostituído pelos traficantes, que andava travestido e é soropositivo. E de uma menina resgatada que tinha uma infecção vaginal em estado avançado". A situação de vida dos menores envolvidos no tráfico e no consumo do crack é muito diferente daquela dos meninos e meninas que cheiravam cola e thinner nas ruas, alertou o subsecretário. "O crack é devastador, como bem definiu o secretário municipal de Assistência Social, Fernando William". Há meses, Fernando denunciou o crack como o grande inimigo da sociedade. "No censo municipal de abandono, do ano passado, registramos 410 crianças e adolescentes abandonados nas ruas da cidade. São menores e jovens que usavam thinner e cola de sapateiro e agora usam crack, mais barato e muito mais prejudicial", explicou o secretário. A rotina do seu pessoal revela que crianças a partir dos oito anos de idade compram pequenas pedras da droga por 50 centavos e se viciam imediatamente. "O viciado não quer saber de nada, só do crack. Mas a droga é tão violenta que as próprias crianças preveem a morte. Ficam até seis dias sem comer, perdem as forças, a morte é a consequência natural para elas", disse. Fernando William lembrou também a dicotomia existente entre o combate ao vício e o Estatuto da Criança e do Adolescente, no qual são impostas restrições ao emprego de força. Ainda segundo o secretário, o universo de usuários de crack no Rio de Janeiro e nas regiões periféricas pode atingir mais de três mil crianças, adolescentes e jovens. A rápida disseminação da droga, seu baixo custo e a constatação do usuário de que está num beco sem saída. A disseminação da droga, as relações complexas dos viciados com os traficantes e a reação das milícias que dominam centenas de comunidades pobres na cidade foram outros aspectos destacados nos debates. Uma líder comunitária de Santa Cruz, conhecida como Gaúcha, contou de um garoto de 11 anos barbaramente espancado a pauladas e chutes por milicianos que o surpreenderam se drogando na favela, mesmo diante dos gritos desesperados do pai para que parassem. "Não existem mais estatísticas oficiais", apontou Gaúcha, aplaudida ao final: %u201CA gente só ouve 'seis mortos no Alemão', 'quatro corpos encontrados no mato', e por aí vai. E as vítimas têm entre 12 e 29 anos de idade". De acordo com as autoridades municipais, a maioria dos menores nas ruas estudou até a quinta série; quer dizer, os professores tem que agir desde cedo. Uma representante do magistério enfatizou a quase impossibilidade de se resgatar a criança que já está nas ruas, em contraste com o ambiente escolar propício. A major Sílvia, representante da Polícia Militar nos debates, reforçou a necessidade de a sociedade confiar na polícia, para as ações contra a violência alimentada pelo uso do crack. "Faço parte dos 138 novos oficiais da PM, todos com nível superior, alguns com pós-graduação. Eu mesma estou fazendo mestrado. Nasci no ano em que acabou a ditadura, cresci num país democrático e acredito na força da sociedade para mudar a realidade". A oficial da PM falou do programa específico da instituição de aproximação das famílias com problemas como o tráfico, o consumo de drogas e outros delitos, para orientação e esclarecimento. Mas advertiu, como os demais participantes do encontro, que nenhuma instituição ou instância de governo pode vencer a luta sem o engajamento da sociedade.

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