Acusado de quatro homicídios na década de 1970, quando liderava a organização extremista Proletários Armados pelo Comunismo (PAC), Battisti foi condenado à revelia pela Justiça italiana à prisão perpétua e conquistou o status de refugiado no Brasil. O governo italiano trava uma batalha para obter a extradição. (leia memória).
A expectativa é que Mendes vote a favor da extradição. Mas a resposta para o impasse deverá ser dada somente na próxima quarta-feira. Ontem, o presidente do Supremo decidiu suspender a sessão depois do longo voto de Marco Aurélio Mello, que precisou deixar o tribunal para viajar. O voto dele durou quase três horas. O ministro Dias Toffoli não vai se pronunciar. Após muita polêmica, o mais novo integrante da Corte declarou-se impedido por razões de foro íntimo. A participação do ex-advogado-geral da União era questionada pelo governo italiano.
Durante quase três horas de voto, Marco Aurélio defendeu a permanência de Battisti no Brasil. Lembrou que, segundo entendimento do tribunal, a concessão de refúgio invalida o pedido de extradição. Foi o que o STF decidiu, por exemplo, no caso do padre colombiano Olivério Medina, que ganhou o status de refugiado e não foi extraditado.
O refúgio concedido em janeiro pelo Ministério da Justiça a Battisti, sustentou Marco Aurélio, nem sequer poderia entrar em discussão. ;É um fato a ser constatado;, disse. Ele acrescentou, no entanto, considerar a decisão acertada. ;A visão do ministro (da Justiça Tarso Genro) mostrou-se, acima de tudo, realista e humanitária, atendendo a noções consagradas internacionalmente.;
Protesto
Do lado de fora da Corte, manifestantes pró-Battisti promoveram um protesto na Praça dos Três Poderes. Alguns chegaram a interromper a fala do ministro Gilmar Mendes, logo no início do julgamento, gritando palavras de ordem. Foram retirados do plenário.
O advogado de Battisti, Luís Roberto Barroso, demonstrou confiança em um resultado favorável ao italiano. ;Se o presidente (do STF, Gilmar Mendes) estivesse convicto, teria votado. Ele está considerando diferentes possibilidades. Se o Supremo invalidar o refúgio, haverá uma repercussão muito negativa para o sistema internacional de direitos humanos. Não há precedentes no mundo;, declarou.
;Caso o Supremo Tribunal Federal conceda a extradição, o que poderia ocorrer seria apenas retardar a entrega de Battisti. A entrega seria obrigatória;, contrapôs Nabor Bulhões, que representa o governo italiano.
; STF pode abrir precedente
O Ministério da Justiça afirmou ontem, em nota oficial, que o Supremo Tribunal Federal (STF) vai abrir um precedente se decidir pela extradição do ex-ativista italiano Cesare Battisti. O ministério sustenta que a decisão fará com que o Brasil receba mais pedidos de extradição de outros refugiados e que isso descumprirá a regra prevista na convenção da Organização das Nações Unidas (ONU) de 1951. A convenção, ratificada pelo Brasil, impede a extradição de refugiados, ressalta a nota oficial. Segundo o Ministério da Justiça, informações do Comitê Nacional para Refugiados (Conare) indicam que representantes de diversos países já sinalizaram interesse em ;cassar refúgios;, diz em nota. De acordo com o Conare, atualmente 4.183 refugiados de 76 países vivem no Brasil. Battisti recebeu o status de refugiado em janeiro.
; Memória
Troféu para Berlusconi
A Itália trava uma verdadeira batalha para obter a extradição do ex-ativista de esquerda Cesare Battisti (foto), de 54 anos. Ele é acusado de quatro homicídios ocorridos na década de 1970, quando liderava a organização extremista Proletários Armados pelo Comunismo (PAC). À revelia, o italiano foi condenado à prisão perpétua no país de origem. O julgamento terminou em 1993, mas ele nunca cumpriu pena. Fugiu para a França, onde viveu até 2004, quando o então presidente do país, Jacques Chirac, se posicionou a favor da extradição.
Battisti fugiu de novo e veio parar no Brasil. Em março de 2007, foi preso no Rio de Janeiro e transferido para Brasília. Em janeiro deste ano, ganhou o status de refugiado do Ministério da Justiça. O ex-ativista nega a autoria dos crimes e afirma ser vítima de perseguição política. Em entrevista ao Correio, Battisti chegou a dizer que a extradição seria um ;troféu; para o governo de Silvio Berlusconi. (MD)
; Placar empatado
Como foi a votação
A favor da extradição
# Cezar Peluso
Primeiro a votar, defendeu a extradição de Battisti para a Itália. Disse que a concessão de refúgio ao italiano foi ilegal. Acrescentou que não existem provas suficientes de que o italiano sofre perseguição política em seu país. E rebateu o argumento da defesa de que os crimes já teriam sido prescritos. ;Não há nenhuma dúvida de que lhe foram assegurados todos os direitos de defesa;, disse.
# Ricardo Lewandowski
Acompanhou o relator. Argumentou que a convenção do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) e a Lei dos Estrangeiros têm cláusula que permite a extradição quando o crime é comum e não político ; o que, para ele, seria o caso de Battisti. Afirmou que os crimes foram cometidos com premeditação e ;mero sentimento de vingança;. Também refutou o argumento de que Battisti não teve amplo direito de defesa.
# Carlos Ayres Britto
Disse que o relator mostrou haver justificativas suficientes para a extradição. Entendeu que não há fundamento para o temor de que Battisti será perseguido na Itália. ;Quando a lei diz que será reconhecido como refugiado todo indivíduo que tenha fundados temores de perseguição, são temores demonstrados e não subjetivamente colocados. Procurei reler a decisão do ministro da Justiça e encontrei algo que contradiz o princípio de temor de perseguição. É algo mais do que duvidoso;, disse.
# Ellen Gracie
Também votou pela extradição de Battisti. Reforçou que é competência do STF decidir se o crime cometido é comum ou político: ;O estatuto do estrangeiro esclarece que caberá exclusivamente ao Supremo a apreciação do caráter de extradição;.
Contra a extradição
# Eros Grau
O ministro apenas declarou que votaria pelo arquivamento do processo de extradição, já que o réu havia recebido a condição de refugiado político. Na avaliação do ministro, não houve irregularidade na decisão do ministro da Justiça, Tarso Genro, de conceder refúgio a Battisti. Ele antecipou o voto e deixou o plenário antes do término do julgamento.
# Cármen Lúcia
A ministra acompanhou a divergência e disse que não cabe ao STF rever a legalidade da decisão do ministro da Justiça. ;Revisar este ato não é de competência do STF;, disse. Como a lei brasileira prevê que refugiados não sejam extraditados, ela votou pelo arquivamento. ;Não vejo elemento que pudesse viciar
o processo de concessão de refúgio;, concluiu.
# Joaquim Barbosa
Disse que a concessão de refúgio é um ato político e, por isso, não cabe ao STF julgar se a decisão do Executivo está correta ou não. Acrescentou que o presidente da República não pode entregar um extraditando sem autorização do tribunal, mas lembrou que, após a autorização, o chefe do Executivo pode decidir pela não-extradição. ;Concessão de refúgio é assunto político.; Também opinou pela libertação imediata de Battisti.
# Marco Aurélio Mello
Único a votar ontem, falou durante quase três horas para votar contra a entrega de Battisti. A decisão do Ministério da Justiça, sustentou, sequer poderia entrar em discussão. ;Não cabe ao Supremo Tribunal Federal perquirir o acerto ou desacerto do ato do Executivo, que reconhece o refúgio. É um fato a ser constatado;, disse. ;A visão do ministro da Justiça mostrou-se, acima de tudo, realista e humanitária, atendendo a noções consagradas internacionalmente;, completou.