postado em 26/11/2009 08:30
O Distrito Federal foi um dos últimos lugares no país a ser invadido pelo crack. A capital resistiu até 2007. Até então, aqui era território da merla, outro produto da pasta base de cocaína, consumido por usuários de periferia. Entre os jovens de classe média, era o ecstasy que passava de bolso em bolso para embalar festas. Hoje a pedra da morte conseguiu invadir de uma só vez os dois redutos e de forma mais intensa. Enquanto os comprimidos da euforia são ingeridos ocasionalmente em baladas de fins de semana, o crack já está sendo consumido diariamente por parte da juventude endinheirada. E pela miserável também.
[SAIBAMAIS]O tráfico no Distrito Federal vem mudando de perfil. Basta olhar as estatísticas de apreensão. Enquanto a de merla vem reduzindo, a de crack aumenta. Somente no primeiro semestre de 2009 já foram recolhidas mais pedras (5.559 gramas) do que todo o ano passado. A Polícia Civil já identificou que a nova estratégia de mercado dos traficantes na capital é substituir a merla pelo crack. É mais fácil de portar, vender, conservar. Tem pedras de diversos tamanhos e preços, que vão de R$ 2 a R$ 10, dependendo da qualidade.
Mas a mesma pedra que rola em Ceilândia cai no Plano Piloto. Entre as quadras comerciais que vão da 306 Norte até a 316, margeando a W3 Norte, há um ;polígono; do crack (veja quadro acima). ;Vapor;, é assim que são chamados os vendedores de pedra; nas quadras comerciais. Os ;pizzaiolos;, geralmente menores de idade, fazem as entregas. E o ;patrão;, este é bem vestido, e nem chega perto da boca. Na Asa Norte, a área conhecida como cerradão, próximo à 710N, para entrar tem que ter o ;contato;. Primeiro o assobio que é o sinal para o ;vapor; aparecer e entregar a droga.
O tráfico do crack ;bomba; entre 21h30 e 6 horas da manhã na região. A droga provoca desconforto nos olhos se consumido durante o dia, em local aberto. Por isso, os viciados acabam virando ;zumbis; ou ;vampiros;. Trocam o dia pela noite. Vão e voltam às bocas de fumo várias vezes durante à noite para acalmar a fissura. Os ;playboyzinhos; não entram. Precisam dos ;contatos;. Estes são viciados que têm mais proximidade com o ;vapor;. Têm a senha para entrar em redutos. Trocam o acesso por parte da droga comprada e entregue. Os contatos são feitos em festas, as mesmas embaladas por ecstasy.
Ó, o leite
Na comercial da 315/316, as prostitutas passam ;rádio; para os traficantes que ficam na parte interna. Quando a polícia se aproxima é dado o aviso: ;Ó, o leite. Ó o leite;. J. 20 anos, morador da Asa Norte, era contato. Começou para ganhar dinheiro. Viciou-se e endividou-se. O traficante propôs que ele se tornasse também ;vapor; para pagar a dívida. ;Aí, bateu uma coisa muito esquisita. Me senti mal em pensar que eu iria viciar outras pessoas. Eu sei como entrar nessa é ruim;, contou. São de 5 a 10 segundos para fazer efeito, de cinco a 15 minutos de alterações físicas tão fortes, que ao acabar, quer logo outra pedra.
O lucro é fácil, porque quem experimenta o crack, logo volta, tamanha rapidez que o vício se instala. Como eles dizem: ;Na primeira já pega;. ;É muito preocupante a situação. E agora estamos nos deparando constantemente com dependentes de crack na classe média. Com merla, eu não via isso;, aponta o delegado João Emílio, chefe da Coordenação de Repressão a Drogas (Cord).
A primeira apreensão de crack no DF foi feita no primeiro semestre de 2007. A droga vem do Entorno, onde os laboratórios de merla estão sendo substituídos pelos de crack. A Vila Planalto e Ceilândia concentram distribuição. As mulheres se prostituem para conseguir uma pedra. E os homens partem para a violência, como assaltos. ;A demanda de consumo por droga é muito grande. A gente tira de circulação um traficante, e no dia seguinte já têm 10 para substituí-lo no mesmo ponto;, diz o delegado. ;Já teve mãe me ligando pedindo ajuda que traficante debaixo do bloco na Asa Sul cobrando dívida dos dois filhos;, conta o delegado.
As ações policiais intensificam para reduzir o tráfico do crack no DF, mas segundo o delegado também é preciso impedir o surgimento de novos usuários. ;Cuidem de seus filhos. Pode ser na melhor escola, na melhor boate, no melhor shopping, a droga pode estar lá;, alerta ele aos pais.
; UMA PEDRA FÁCIL DE ESPALHAR
; AÇÃO FEDERAL CONTRA O CRACK
; VÍCIO SE EXPANDE NA CLASSE MÉDIA DO DF
; OU VOCÊ FUMA OU VOCÊ MORRE