postado em 02/01/2010 08:10
Karla Mendes
Diego Amotrim
Álvaro Fraga
Pedro Rocha Franco
Flávia Ayer
Parecia perfeito passar a noite de réveillon em uma luxuosa pousada em Ilha Grande, no município de Angra dos Reis (RJ). Não é à toa que o local é conhecido como paraíso tropical, e os preços das diárias chegam a quase R$ 500 na alta temporada. Ao pé de montanhas com vegetação rica e abundante, na beira da Praia do Bananal, a Pousada Sankay parecia um refúgio intocável, até que em menos de 10 segundos, na madrugada de ontem, um deslizamento de terra e lama de uma altura de 50 metros destruiu o império construído em 1994 pelos mineiros Sônia Faraci Imanishi e Geraldo Faraci, matando 19 pessoas - no estado, o número de mortes já chega a 50 (leia mais na página 8).
Até às 22h de ontem, a lista com o nome das vítimas ainda não havia sido divulgada, mas a Defesa Civil de Angra dos Reis confirmou a morte da estudante Yumi Imanishi Faraci, de 18 anos, filha dos proprietários da Pousada Sankay. Segundo amigos da família, o casal Faraci teria passado a noite na casa de serviços anexa à pousada, enquanto a jovem estaria dormindo num dos quartos de hóspede com amigos de faculdade depois de comemorar a virada de ano. A Secretaria de Turismo de Angra dos Reis e a Defesa Civil da cidade confirmaram que, além de Yumi, estariam no quarto Paulo Sarmiento, de 27 anos, e Isabella Godinho Rocha, de 20 anos, convidados da jovem para passar o réveillon na Ilha Grande.
Quatro outros colegas de Yumi conseguiram escapar e foram levados durante o dia para Ubatuba (SP), de onde seriam transferidos para Belo Horizonte com os pais. Sônia e Geraldo nada sofreram. A estimativa da Defesa Civil de Angra dos Reis é de que cerca de 50 pessoas estavam hospedadas na Pousada Sankay - o deslizamento atingiu uma área do imóvel onde não havia tantas pessoas.
Ao todo, chega a 30 o número de mortos nos deslizamentos em Angra(1) dos Reis. As informações são do Coronel Pedro Machado, Comandante do Corpo de Bombeiros. De acordo com ele, outros oito foram retirados no Morro do Carioca, no centro da cidade. Também no Morro do Carioca, três corpos foram localizados em uma área de difícil acesso e só poderão ser removidos na manhã de hoje. Em outras áreas do Morro e do município, as buscas continuaram durante a noite. Mais de 120 homens trabalham nas buscas na praia do Bananal e no Morro do Carioca.
Até às 22h de ontem ainda não havia informação sobre quantas pessoas continuavam soterradas. Como as casas e a pousada estão debaixo de toneladas de lama, o resgate é mais difícil, porque não é possível utilizar equipamentos pesados para não correr o risco de o terreno ceder. Por isso, os bombeiros fazem um trabalho manual com pás e picaretas. "Entendemos que as pessoas queiram saber notícias, mas ninguém deve vir à Ilha Grande neste momento para não atrapalhar as buscas", pediu o secretário de estado de Saúde e Defesa Civil, Sérgio Côrtes.
Os corpos que foram identificados pelos moradores das localidades estão sendo levados para o Instituto Médico-Legal (IML) de Angra dos Reis. Os que ainda necessitam de identificação seguem para o IML do Rio. Segundo Cortes, 10 sobreviventes foram levados para hospitais de Angra, Rio e São Paulo. O vice-governador e secretário de Obras, Luiz Fernando Pezão, que acompanha pessoalmente os trabalhos com Côrtes, informou que um estaleiro da região vai mandar equipamento para a Praia do Bananal para auxiliar na retirada dos escombros. "É um cenário muito triste. Moradores nos disseram que as casas da praia estavam alugadas para turistas", disse Pezão. A Prefeitura de Angra dos Reis está recebendo donativos para os desabrigados.
1 - Luto oficial
O prefeito de Angra dos Reis, Tuca Jordão, decretou luto oficial de três dias na cidade e cancelou todas as festas programadas para esta semana, devido às mortes provocadas pela chuva na madrugada desta sexta. Duas das principais festas de Angra, a procissão marítima que tradicionalmente ocorre no primeiro dia de cada ano e o aniversário da cidade, no dia 6, estão, portanto, canceladas.
Memória
Desastre náutico na virada do ano
A tragédia que provocou a morte de turistas em uma pousada luxuosa de Angra dos Reis no primeiro dia do ano lembra um dos maiores desastres ocorridos durante as comemorações de ano novo, envolvendo pessoas de classe alta. Em 31 de dezembro de 1988, a embarcação Bateau Mouche naufragou no Rio de Janeiro, provocando a morte de 55 pessoas. A bordo estavam 153 passageiros que assistiriam à queima de fogos no bairro de Copacabana, na zona Sul do estado, mas o barco afundou faltando 10 minutos para o show pirotécnico.
Entre os mortos famosos estava a atriz da Rede Globo Yara Amaral. Os laudos apontaram para superlotação da embarcação. Segundo a perícia, havia problemas também com a laje, que deslocou o centro de gravidade do barco e contribuiu para o naufrágio. O barco também não tinha a capacidade declarada pela Marinha e apresentava buracos no casco. Vinte e dois anos depois, ninguém foi condenado pelo episódio. Das cerca de 30 ações que tramitam nas Justiças Estadual e Federal do Rio de Janeiro em busca de indenizações, em apenas um processo houve pagamento de indenização, em janeiro de 2008, mas o dinheiro saiu dos cofres da União.