Enquanto o governo federal estuda a melhor forma de liberar recursos para estados atingidos por temporais, enchentes e deslizamentos de terra, os dois programas nacionais referentes ao tema exibem execuções orçamentárias lentas e, ao mesmo tempo, reveladoras. Um deles, denominado Resposta aos Desastres e Reconstrução, pagou R$ 1,3 bilhão (72%) da dotação autorizada no ano passado, de R$ 1,9 bilhão. O outro, intitulado Prevenção e Preparação para Desastres, só executou R$ 138 milhões, que corresponde a 21% do valor total da rubrica, R$ 646 milhões. "Mostra bem um velho hábito da nossa gestão pública, que prefere remediar a prevenir", resume Evilásio Salvador, professor da Universidade de Brasília (UnB) e doutor em política social. Os dados, levantados pela organização não governamental Contas Abertas a pedido do Correio, já contabilizam os restos a pagar (dívidas de anos anteriores quitadas neste exercício). Das seis ações que compreendem o programa Resposta aos Desastres e Reconstrução, a que teve melhor execução é denominada Restabelecimento da Normalidade no Cenário de Desastres. Ou seja, são as medidas emergenciais tomadas para minimizar o caos depois de uma tragédia, mas não para saná-lo. De outro lado, na rubrica Prevenção e Preparação para Desastres, uma das ações mais importantes, chamada Apoio a Obras Preventivas de Desastres, teve 15% de execução - foram gastos R$ 99 milhões do total de R$ 632 milhões autorizados. Na avaliação do economista Gil Castello Branco, consultor do Contas Abertas e especialista em orçamento público, tais números historicamente têm sido assim. "A lógica acaba sendo a de liberar verbas apenas quando o acidente ocorreu e as vidas já foram perdidas. Todo mundo sabe que nesta época do ano temos chuvas, deslizamentos, as enchentes. Em outro período, temos as secas. Mas não se gasta em prevenção", lamenta Gil. O professor Evilásio Salvador explica que recursos como esses, para prevenir desastres naturais, entram nos chamados gastos discricionários, ou não obrigatórios. "Portanto, depende da boa vontade do governante de gastar. São discricionários pagamentos de pessoal, dos benefícios da seguridade social, educação e amortização da dívida. O recorde em superavit alcançado no ano passado mostra bem a opção do governo. Faz 10 anos que essa é a política: economiza-se onde pode para fazer superavit", critica Salvador. O especialista chama atenção também para a falta de um plano habitacional sério, que retire famílias de locais de risco para realocá-las em condições seguras. "É um erro permitir a construção dessas vilas, cidades. E aqui no DF, com a expansão de condomínios irregulares, viveremos o mesmo em breve", alerta. Ao denominar como "ilusórios" os créditos liberados por meio de medidas provisórias sempre que ocorre um desastre natural, Gil Castelo Branco explica que o repasse não é imediato. "Aposto que em mais um ou dois dias o governo federal vai anunciar algum dinheiro para Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. O que as pessoas não sabem é que esse recurso depende de projetos serem apresentados, de convênios serem firmados, de verificação mesmo dos locais para definição das providências. Não seria melhor prevenir?", questiona o economista. Colaborou Daniela Lima