O empresário Wilson Guimarães, de 71 anos, sente prazer em recordar do fim da década de 1990, quando seus 10 caminhões serviam a uma grande empresa de laticínios de Minduri, no Sul de Minas, a 286 quilômetros de Belo Horizonte. ;Foi um bom tempo para a economia local;, diz o homem para, em seguida, dar um longo suspiro, colocar as mãos no rosto e se lamentar: ;Pena que ela fechou as portas em 1999;. O fim da produção de queijos finos no pacato lugarejo desempregou 100 pessoas. Um ano antes, a Rede Ferroviária também havia encerrado suas atividades na cidade: 200 famílias afetadas. A queda dos postos de trabalho no município reduziu a população de lá em 4,5% na última década. O número de habitantes caiu de 3.834 pessoas, em 2000, para 3.665 em 2009. O mesmo ocorreu, em igual período, em outras 156 cidades do estado.
A redução da população em 157 municípios, que representam 18% das 853 cidades de Minas Gerais, é comprovada pela comparação entre o censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), de 2000, o último a ser realizado no país, e a estimativa populacional elaborada pelo mesmo instituto, em 2009. Minduri é um dos melhores exemplos para ilustrar as migrações no estado, pois a procura por emprego lidera as mudanças de famílias de uma cidade para outra. ;Vários motivos explicam o fenômeno e, sem dúvida, a procura por posto de trabalho é o principal deles;, endossa José Irineu Rigotti, professor do Programa de Pós-Graduação em Tratamento da Informação Espacial da PUC Minas.
Seu Wilson sabe muito bem o que significam as palavras do especialista, pois, além de demitir os 10 caminhoneiros que lhe ajudavam a ganhar o pão, um de seus dois filhos, graduado em odontologia, precisou se mudar para Belo Horizonte para conseguir emprego. ;O outro, de 30 anos, continua aqui, mas desempregado;. O empresário, por sua vez, garante que não deixará a cidade que ama: ;Nasci aqui, cresci e vou morrer aqui. Mas é uma pena que o mesmo não ocorra com muitos moradores, principalmente os mais novos, que vão chegando à fase adulta e vão embora atrás de um lugar para trabalhar ou estudar;. Aliás, o estudo é outro motivo das migrações em Minas Gerais. É em busca de um diploma do terceiro grau que as amigas Marcela Ribeiro da Silva, de 17, e Érica Carvalho, de 18, sonham em se mudar para São João del-Rei, no Campo das Vertentes. Ambas fizeram vestibular na universidade federal daquela cidade e aguardam, com expectativa, o resultado do concurso, que será divulgado em 19 de fevereiro. ;Fiz vestibular para psicologia. Se for aprovada, vou morar lá. Depois de formada, pretendo continuar em São João;, planeja a mais velha, cuja irmã já fez as malas para Caxambu, no Sul do estado, onde foi em busca de trabalho. O prefeito de Minduri, Edmir Geraldo Silva (PP), lamenta a debandada ocorrida na cidade depois que as duas grandes empresas encerraram as atividades. ;Perdemos quase 300 empregos diretos;. Para reverter o quadro, a prefeitura investiu na agropecuária, um dos carros-chefes da economia local, e no turismo, pois a cidade integra a Estrada Real. ;Para incrementar o turismo, melhoramos a infraestrutura: organizamos o hospital e a telefonia. Também estamos trabalhando para trazer empresas que gerem cerca de 50 postos de trabalho cada. Estamos negociando com um laticínio e com uma construtora de pré-moldados;. Coração Mas a migração não se deve apenas ao emprego e ao estudo. O amor também faz muita gente trocar de cidade, como dona Maria das Dores Silva, de 48, que, há três anos, se mudou para Serra da Saudade, na Região Central. Ela deixou Dores do Indaiá, no Centro-Oeste, onde a população caiu, na última década, de 14.388 pessoas para 14.366, para acompanhar o ex-marido. A mulher não mora mais com o marido, mas decidiu ficar no novo município, que lhe recebeu com os braços abertos. ;Neste quintal, crio galinhas e tenho uma pequena horta. Também posso deixar minha carne seca pernoitar no arame. Por que vou sair daqui?;. Ela mesma responde a pergunta com outra: ;Para não dar certo em outro lugar?;. Se por um lado muitas cidades perderam moradores na última década, por outro, a população cresceu em outras 696. Em apenas um município, Santa Rita de Ibitipoca, na Zona da Mata, a 240 quilômetros da capital, permaneceu com o mesmo número de habitantes entre 2000 a 2009: 3.847 pessoas. Em Belo Horizonte, a população passou de 2,23 milhões de moradores para 2,45 milhões no período. Porém, o número poderia ser bem maior não fosse a quantidade de pessoas que se mudaram para outras cidades da região metropolitana, mas que continuam estudando ou trabalhando em BH. Um dos principais destinos foi Nova Lima, onde o total de habitantes passou de 64,3 mil para 76,6 mil em 10 anos (aumento de 19%). ;Um fenômeno da migração é a perda das capitais para seu entorno;, informa Rigotti. No caso de Nova Lima, a maioria dos novos moradores é das classes média e alta. Do outro lado da moeda, Ribeirão das Neves, conhecida por ser uma cidade dormitório, recebe muitos moradores da classe social menos favorecida. Lá, a população subiu de 246 mil para 349 mil (crescimento de 41%). Mas a cidade que mais recebeu população neste intervalo foi Nova Serrana, onde o total de moradores cresceu 81,5%.